Acabando de lavrar o flagrante de dois presos por tráfico de drogas, sendo que um deles tem um filho de 6 anos, o qual, ao tomar conhecimento da prisão do pai, caiu em prantos e me perguntava constantemente “tio, quem vai me levar para a escola?”, “tio, quando meu pai vai poder morar comigo para sempre de novo?”. Ouvindo essas indagações, mesmo após alguns anos como delegado e mesmo sabendo que todo o sofrimento enfrentado por aquela criança tinha como culpado o pai dela, meu coração ficou apertado.
Confesso que nunca senti tanta pena de alguém como senti hoje. O doce L. me fez prometer (inclusive tocando os dedos mindinhos) que ninguém faria mal para o seu pai e me pediu, chorando, para falar com o pai antes que ele fosse levado preso.
Cumpri a promessa que fiz ao L., deixei-o trocar algumas palavras com seu pai, e era visível todo o amor que aquela criança sentia.
Crianças como o L. não merecem passar por esse sofrimento. Nenhuma criança merece
Fiz um tour com L. por toda a delegacia, meu objetivo era acalmar aquela pobre criança... definitivamente crianças como o L. não merecem passar por esse sofrimento. Nenhuma criança merece.
Hoje vou dormir com a sensação de dever cumprido, de ter tirado das ruas um cidadão que, com a venda de entorpecentes, com certeza destruiu diversas famílias. No entanto, vou dormir triste também pois sei que nesse momento L. possivelmente está chorando a ausência do pai e ele não tem culpa desse sofrimento.
Como falei para ele, “um policial sempre cumpre sua promessa”. Se o pai dele vai cumprir alguma das que fez ao filho, isso eu não sei.
No Facebook do veterinário
Esta semana foi parada por causa das festas de fim de ano. Mas não é que, na última hora, o ano de 2016 ainda me deu o que pensar? Agora há pouco saiu do consultório um casal de aposentados que trouxe a cachorrinha para eu examinar. Era uma vira-lata muito velha, com muitos problemas. Veio nos braços da mulher, que me entregou a cachorrinha na recepção. Entrei no consultório e, quando a coloquei na maca, notei que estava morrendo. Fiz o que devia ser feito, mas não teve jeito. O casal não tinha entrado, ficou esperando ser chamado. Quando fui atrás deles, encontrei primeiro a esposa. Ela me pediu para dar a notícia ao marido, que era muito apegado à cachorrinha. Tá bom – pensei –, nada de mais. Então vi o homem parado em frente ao bebedouro, enxugando as lágrimas. Já estava chorando e nem sabia que a cachorrinha tinha morrido! Respirei fundo. Olhei de novo para a esposa, na esperança de que ela decidisse assumir a tarefa. Só vi angústia nos olhos dela. Fui lá e dei a notícia. Trocamos algumas palavras. A esposa se aproximou, pegou no braço do marido e foi levando-o para fora. Fiquei olhando os dois. No estacionamento, ele entregou a chave do carro para ela, que saiu dirigindo.
Sabem o que me comoveu? Não foi a morte da cachorrinha, coisa normal para mim, ainda mais sabendo que ela já era muito idosa. Não foi o sofrimento do dono, que é até bem comum porque os animais são grandes amigos mesmo. Foi aquela esposa ali, cuidando do marido com tanto carinho em um momento de fragilidade dele, respeitando a dor dele e sofrendo por vê-lo sofrer.
Vi o amor ali, na minha frente, em carne em osso.
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