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No trava-línguas que as crianças tentam repetir, o tempo quer saber quanto tempo tem. Tem para quê? Para existir, talvez. O tempo não para para responder a esse auto-questionário imaginário, mas é sempre ele que dá todas as respostas. Enquanto elas não ficam claras, para nós restam as perguntas.Quanto tempo o tempo tem para esfriar um amor? Quanto tempo o tempo tem para apagar mágoas? Quanto tempo o tempo tem para nos trazer algo muito bom, que quebre a rotina ocupada por tarefas terrivelmente urgentes, mas imensamente desimportantes?

Quanto tempo o tempo tem para nos ensinar que a rotina esconde dezenas de coisas muito boas e bonitas, que, de tão rotineiras, a gente deixa de perceber?

Porque o tempo do tempo é o tempo que o tempo tem.

Não adianta apressar nem segurar. Não adianta se angustiar nem ficar eufórico. O tempo do tempo é o tempo que o tempo tem.

Kant, Leibniz, Hume e Descartes pensaram, pensaram e pensaram e – como bons filósofos – tentaram primeiro definir o que é o tempo. Mas não chegaram a uma conclusão única. Nem eles nem os físicos quânticos nem os matemáticos. Não que isso seja um problema. Sim, seria mais fácil se houvesse uma resposta pronta, daquelas que a gente pode decorar e repetir, como decoramos e repetimos "três pratos de trigo para três tigres tristes". Mas seria falso, muito falso. Assim como é falso falar em pratos de trigo para tigres. (Quem será que teve essa ideia infame?)

Por isso, não pergunte a Kant, Leibniz, Hume ou Descartes quanto tempo o tempo tem. A resposta vai ser muito complicada. Entendê-la vai tomar muito tempo.

Gosto da definição de Hegel, que fala no tempo como "uma sucessão de momentos da consciência humana". Parece mais realista. O único tempo que consigo apreender é aquele que cabe na minha consciência. E na minha consciência só cabem momentos. Aliás, a maioria dos momentos eu vivo sem me dar conta e, por isso, desperdiço-os. Mas a sucessão de momentos que eu percebo me faz ver que o tempo passa. E quanto tempo o tempo ainda tem?

Coisas boas resistem muito tempo. Parecem ter sucumbido a alguma tristeza, a alguma grande distância, ao próprio tempo. Mas, quando menos se espera, elas provam que estão lá. Algumas amizades, alguns amores, alguns laços familiares. Quando tudo parecia ter virado pó, vem o sinal de vida.

Depois de algum tempo, aquele que perguntou quanto tempo tem não quer mais nenhuma resposta. Está muito ocupado desfrutando cada "momento de consciência". Foi por isso que o tempo respondeu pro tempo que não tem tempo de dizer pro tempo que o tempo do tempo é o tempo que o tempo tem.

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