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Marleth Silva

Setembro

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Estava procurando uma palavra no dicionário Aurélio quando me deparei com boedrômias: "na antiga Atenas, festas celebradas no mês de boedrômion, em comemoração à vitória de Teseu sobre as amazonas". Estudássemos grego, como nossos antepassados, e eu já saberia faz tempo que o nosso setembro corresponde ao mês boedrômion dos gregos antigos. Adeus, mês do cachorro louco, que – ouvi de vários amigos – foi um período muito difícil. Bem-vindo, boedrômion.

Paulo Rónai, em texto de 1949 republicado no imperdível livrinho Como Aprendi o Português e Outras Aventuras, conta que, mal começava o ano letivo, os jornais da época eram tomados pela polêmica sobre ensinar ou não latim nas escolas brasileiras. Cheguei tarde para este debate, não conheço os argumentos a favor e contra. Mas imagino que eles também se aplicariam ao ensino do grego clássico. Houve tempo em que os pouquíssimos brasileiros que frequentavam os bancos escolares por mais de três ou quatro anos estudavam latim e grego. Eles não ficariam surpresos com a minha informação de que hoje estamos começando o mês de boedrômion. Para que servia estudar latim e grego? Provavelmente ajudava a entender o nosso próprio idioma e ampliava o vocabulário.

Rónai era a favor do ensino do latim e culpava a falta de habilidade e imaginação dos professores pelo insucesso dos alunos. As aulas eram tediosas demais, estruturadas demais, vetustas demais. A chatice da gramática escondia o prazer "quente e humano" das histórias do poeta grego ("a amiga do poeta Catulo tinha um pardalzinho que adoeceu"). Não conheço os versos, mas deduzo que Catulo deve ter contado com muita graça o drama do pardalzinho doente. A graça dele, de Ovídio, de Tito Lívio justificava, para Rónai, o estudo do latim.

É verdade que Paulo Rónai era suspeito; gostava tanto de estudar idiomas que lamentava não ter aprendido sogdiano. Sim, sogdiano, que, segundo ele, era uma língua sagrada dos persas. Nos meses que passou em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial, teve um companheiro de infortúnio, especialista em línguas orientais, que carregava no bolso um texto em sogdiano, o qual poderia ser usado como cartilha para ensinar Rónai, que não se interessou. Na verdade, ambos buscavam ocupações que os ajudassem a manter a sanidade mental e algum resquício de vida intelectual enquanto eram prisioneiros dos nazistas.

O sogdiano Rónai não aprendeu, mas dominou vários outros idiomas, além do húngaro, sua língua natal, e do português, em que escreveu seus textos deliciosos. Havia uma fantasia, uma poesia permanente nesta busca pelo idioma desconhecido. As respostas que ele buscava (que todos buscamos) podiam estar em um texto em sânscrito, em grego ou em hebraico. Veja que beleza a forma como ele nos conta sobre essa fantasia: "Num livro islandês teria talvez encontrado respostas às minhas dúvidas: o poeta que melhor exprimiu as minhas angústias talvez o tivesse feito em haicais japoneses. Mas não nos encontraremos nunca, como se eles não existissem ou eu mesmo não existisse".

E me despeço por aqui.

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