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É tanta imagem impactante, o tempo todo, na publicidade, nas mídias, que nosso cérebro se acostuma. Nos acostumamos a ver. Note, leitor, a forma visual como ouvimos música. Já há algumas décadas as canções vêm acompanhadas de imagens. Lá nos anos 70, Raul Seixas aparecia cantando no Globo de Ouro com cenários psicodélicos, acompanhado por umas dançarinas que pulavam muito (muito mais do que o rock do Maluco Beleza pedia). Depois veio a MTV e os video clips. Hoje, um vídeo da Lady Gaga, por exemplo, é uma sequência louca de imagens – algumas contam uma história e outras estão lá, intercaladas, só para tornar a edição mais ágil. Treinados por anos de imagens sacolejantes, quem consegue sentar quietinho em uma sala de concerto para ouvir uma sonata?

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Muita gente, eu sei. Mas a maioria, não. É a falta de treino. Fica mais fácil quando a música está na trilha sonora de um filme. Aí tem imagem... O cinema mantém os olhos entretidos enquanto o som nos chega aos ouvidos. Com dois sentidos ocupados nosso cérebro inquieto se concentra um pouco e mais. Anda difícil se concentrar.

Pensei nisso ao ver o filme O Quarteto, que segue em cartaz em Curitiba. Dirigido por Dustin Hoffman com atores britânicos, o filme conta a história de quatro cantores de ópera que vivem em uma casa de repouso para músicos. No dia do aniversário de Verdi, a casa promove um concerto em que vários deles se apresentam e o dinheiro dos ingressos é usado para a manutenção do lugar. É mais um filme sobre a terceira idade – eles estão se tornando um novo gênero. Em vários trechos, ouve-se música executada pelos "aposentados". É uma delícia. Um grupo de cordas me impressionou tanto que cheguei a pensar que eles eram o "quarteto" do título do filme. Mas não, era o Guarneri String Quartet, um grupo inglês que se aposentou há alguns anos, depois de mais de 40 anos de estrada. Fazem uma figuração maravilhosa.

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O aniversário de Verdi é citado no filme por uma razão. O compositor italiano fundou uma casa de repouso para velhos cantores de ópera, em Milão, nos moldes daquela que se vê no filme de Dustin Hoffman. Verdi se envolveu profundamente com o projeto, que o manteve ocupado em seus últimos anos. Em seu testamento, determinou que os direitos autorais de suas óperas fossem direcionados para o fundo que mantém a casa. Chegou a dizer que ela era a obra que mais o orgulhava.

O lugar inspirou um documentário (O Beijo de Tosca, do suíço Daniel Schmid), que foi visto pelo dramaturgo inglês Ronald Harwood, que por sua vez transportou a ideia da casa para o interior da Inglaterra em uma peça teatral. Foi esse texto que serviu de base para o filme de Dustin Hoffman.

Verdi devia estar pensando em uma forma de retribuir o que os cantores fizeram por ele, por seu Rigoletto, por sua Aída. Por isso tudo que gira em torno da existência da casa, como o filme O Quarteto, soa como celebração à boa música.

Se você for ver O Quarteto, siga o conselho que me deu meu amigo Paulo e não saia correndo da sala de cinema depois do "the end". Espere para ver a apresentação dos "aposentados" que tocam ou cantam no filme. "Tudo no mundo é uma piada"(Tutto nel mondo è burla) disse Verdi para encerrar sua ópera Falstaff. Mas a música dos velhinhos é coisa séria.

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