Tenho muita vontade de fazer de conta que sou outra pessoa. Queria interpretar. Inventar outra forma de andar, dizer frases que eu jamais diria aqui na minha vida curitibana. Quando tive a oportunidade de fazer isso, meio de brincadeira nos tempos de escola, me senti ótima na pele de atriz.
É verdade que, embora pequena, minha passagem pelos palcos teve lances cômicos. Como aquela vez que nos juntamos para montar uma peça. Um grupo de meninas, minhas irmãs e eu e as vizinhas, que brincavam juntas nos quintais de Imbituva. A peça foi redigida em conjunto e muitas vezes ensaiada. Não lembro da história, mas sim do drama central: um personagem chamado Victor ficava cego. Eu era mãe do Victor e quando outra “atriz” vinha me comunicar a desgraça, eu reagia dramaticamente dizendo: “Victor, cego!” Era o auge da minha atuação, quando eu devia transmitir todo o sofrimento de quem descobre uma agressão brutal a uma pessoa amada. O problema é que as minhas amiguinhas acompanhavam tudo com tamanha atenção e se envolviam tanto com a história que acabaram compartilhando a minha fala. Quando eu dizia “Victor, cego!”, todas as atrizes no palco me acompanhavam, inclusive aquela que havia acabado de me dar a notícia e a outra, que estava em um canto, interpretando o próprio Victor. O que era para ser a fala de uma grande atriz se transformava em um coro grego.
Embora pequena, minha passagem pelos palcos teve lances cômicos
Talvez a plateia não tenha entendido nada. Ou entendeu e se divertiu, sei lá. Nossa proposta de representar um drama não vingou. As pessoas que assistiam à peça (mães, tias e professoras) riam bastante, o que não era a reação que prevíamos. Acho que foi culpa do excesso de ensaios.
Mais tarde, na escola, em Curitiba, participei de outra montagem. Não recordo qual era o texto, mas lembro da bola fora que dei. Novamente eu estava em um papel dramático, ou quis torná-lo dramático (que falta faz um diretor!). Como lá no quintal de Imbituva, eu tinha uma fala forte que em seguida seria respondida pela colega com quem contracenava. Mas eu, focada em meu próprio desempenho, ansiosa, terminei de falar e virei as costas. Marchei para fora do palco e deixei a colega ali parada, sem saber se dizia sua fala para o vazio ou se desistia.
Na coxia (o largo corredor do Colégio Estadual Rio Branco), a menina me chamou para a realidade. “Você saiu antes de eu falar a minha parte!”, queixou-se. Eu estava lá, mergulhada na autoadmiração, quando caí das nuvens.
Tudo isso me desviou um pouco da carreira de atriz. Mas acho que ainda mereço uma segunda chance.
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