Em cada uma das três entradas, plantou-se, em letras de cimento, o nome da cidade – para que o viajante saiba estar passando pela legendária Peabiru, que gravou num acróstico os seus valores:

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Paz,Educação eAmor:Bens Integrantes da Razão Universal.

As letras brancas, sempre caiadas, um zelo louvável, contrastam com o verde intenso das plantações de soja. Antes a cidade era uma clareira no meio de matas exuberantes; hoje, é um capão de árvores, principalmente ornamentais, no meio de campos de soja, que se expandem para todos os lados, invadindo até as rodovias.

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Reclamei disso para um sojicultor e tive que ouvir seu argumento:

– Mas não são produtores de soja que pagam a construção e a manutenção das estradas?

De fato, a soja e, em segundo lugar, o milho sustentam a região.

Tratores transitam continuamente pela cidade. É que os agricultores não moram mais em suas propriedades; e, instalados em casas urbanas, passeiam com os veículos agrários. Estatisticamente, para 26 tratores que encontrei, vi apenas uma carroça. O homem rural se motorizou.

É no trecho que liga a Avenida Raposo Tavares e o trevo para Maringá que faço minhas caminhadas matinais. A prefeitura construiu à margem da pista uma faixa de asfalto de uns 80 centímetros, destinada aos exercícios de uma população que encontro cada vez mais ativa.

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O povo, que não perdoa nada, apelidou a pista de Rodovia da Banha. Mas os caminhantes, eu entre eles, não nos deixamos intimidar. Atenção governo do estado: por conta do tráfego pesado e intenso, a Rodovia da Banha está precisando de recapagem urgente.

Todas as manhãs, desviando dos buracos, faço o percurso, desfrutando da sombra dos poucos matos que sobreviveram à fúria da soja. Em um deles, bem colado à cidade, a surpresa de um pica-pau de cabeça vermelha, que trabalhava com sua machadinha para derrubar um galho. Ele me traz à memória os sons dos lenhadores responsáveis pelo sumiço da floresta que havia aqui.

Assim como os agricultores, os passarinhos vieram para a cidade em busca de uma vida mais saudável. O bucolismo só é possível no perímetro urbano, pois raras são árvores no imenso deserto verde que comprime a cidade.

Algumas coisas melhoraram em Peabiru, outras ficaram iguais. No domingo, na pista dupla da av. Raposo Tavares, num trecho de 200 metros, os jovens ficam dando voltas de carro, tal como na minha época. É o famoso Bobódromo, que atrai os munícipes vizinhos não tanto pelas belezas da cidade quanto pelas moçoilas desfrutáveis que se encostam nos carros estacionados e aguardam ou provocam abordagens.

Mas algumas novidades também surgiram. Como a Festa do Carneiro ao Vinho (no dia 20 de agosto – anotem aí). Dizem que é prato regional, embora eu só me lembre da carne suína em nosso cardápio. Mas vamos lá, carneiro ao vinho é mais nobre do que porco no tacho. Fiquemos com o prato anunciado como uma delícia. Voltarei para conferir.

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O que mais me encantou, no entanto, foi o ar de praia que a cidade assumiu. Por décadas, todos construíam casas com feição de igreja, janelas finas, compridas e em arco. Eu julgava ser isso um sinal da índole religiosa do povo – uma casa como um templo. Agora, as casas novas trazem janelões de vidro, alumínio, cores vivas e muitas colunas.

Para autenticar o gosto praiano, o principal bar da avenida se chama Maresia e conta com mesas externas, toldos e garçons de chinelo. Acomodado em uma das mesas, passei algumas horas agradáveis, livre do calor por conta da brisa marinha oriunda da praça da matriz.

Com o aquecimento do planeta, o degelo e o aumento do nível do mar, as orlas serão alteradas. Ainda teremos mar em Peabiru, e enfim diversificaremos nossa economia. Estou pensando em abrir aqui uma imobiliária especializada em terrenos no litoral – em nosso futuro litoral.

Contra esta onda progressista, levanta-se uma voz sábia. Um amigo de geração, o Velho, renunciou a tudo para viver o agora. Rigoroso ex-treinador de handebol, fui seu aluno até, já na primeira aula, levar uma bolada na cara e desistir para sempre do esporte, de qualquer esporte.

Desfrutei agora de uma palestra do Velho.

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Ele saía do armazém com um litro de pinga enfiado na cintura da calça, sob a camisa. Tem lá os seus pudores o homem. Evita beber em bares, local que ele julga violento, mas confessa o vício.

– Gosto mesmo da pinga. Não escondo, mas o álcool não afetou minha formação moral.

Conta que bebe na praça, na companhia dos amigos.

– Se temos ou não bebida, não pedimos na praça. A praça é só para beber e conversar.

De vez em quando a assistente-social aparece e dá ao pior deles uma passagem para Jandaia do Sul, onde funciona uma temida clínica de recuperação de dependentes químicos.

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Mas o Velho defende até o fim os amigos, não fazem mal a ninguém e ainda cuidam das pessoas.

– Passa mulher pela gente e ninguém mexe. Não estamos interessados em mulher, mas no litrão nosso de cada dia.

Nesses tempos de libido exacerbada e progresso descontrolado, ele prega a vida pacífica e meditativa, demonstrando que não é o álcool que estraga a índole do homem.

– As pessoas me perguntam como consigo beber tanto e não ficar inconveniente. E a resposta é simples: sou da paz e do amor e tenho educação.