Esta é minha primeira crônica escrita num laptop. Laptop ou notebook. E já enfrentei a primeira dificuldade, de ordem nominativa: definir como devo chamar o computador portátil. Sem decidir por nenhuma das duas palavras, esbarrei na segunda dificuldade onde fica o ponto de interrogação. Estou escrevendo sem eles porque ainda não achei a maneira de acionar a tecla, que fica junto ao W. Tenham, portanto, paciência. Eu estou tendo. Faço um esforço danado para me acostumar a esta nova máquina. Nova para mim, é claro. Justamente para quem nunca foi prodígio em nada. Só aprendi a andar de bicicleta aos 12 anos, quando todos já eram exímios com as magrelas.
Tudo que fiz foi sempre com esforço e com atraso. E guardo sonhos não realizados na infância, como um dia conseguir nadar.
E agora esta dedicação à escrita no vá lá laptop.
Alguém pode pensar que estou me metidando com o novo brinquedinho. E estará totalmente equivocado. O computador não é meu, tomei emprestado para fazer um test drive. Estamos na fase de reconhecimento. Se eu me acostumar, pretendo comprar, comprar não, esta é uma palavra pobre, pretendo na verdade adquirir um laptop para mim.
Este plano surgiu quando fui informado por um amigo da área da informática que em breve não teremos mais os PCs fixos, só os portáteis. Fiquei abalado. Acho tão assustador o apocalipse tecnológico. Em breve não teremos mais CD nem DVD isso é até suportável, pois pequeno tem sido meu convívio com tais invenções. Mas em breve não teremos mais internet a cabo este computador mesmo vem com internet sem fio, pode identificar e usar sinais de outras pessoas, e não precisaremos pagar pela conexão. Infelizmente, nenhum vizinho meu aderiu a esse sistema de sinal.
Em breve, avisam-nos, sumirá a televisão, receberemos tudo provavelmente no celular. Esse sim é um aparelho em franca expansão. Hoje invade tudo. Meses atrás, no banheiro do aeroporto, ouvi um senhor sentado no vaso falando alto no celular, animado com os negócios. Tive então uma iluminação. Por que todo mundo que fala ao telefone anda desesperadamente de um lado para outro. Porque estão apurados. O celular deve produzir algum desarranjo intestinal. Uma tese para o pessoal da área médica investigar. Já proponho um alerta O Ministério da Saúde adverte: falar ao celular pode dar dor de barriga.
Tudo vai acabar em breve no nosso mundo informatizado. Nós mesmos nos acabaremos em breve, e isso é o mais dramático. Enquanto tal coisa não acontece, vamos aderindo às novas tecnologias, como esses senhores de cabelo pintado que saem com acompanhantes belíssimas.
Confesso.
Estou tentando me acostumar com o laptop porque tenho medo do computador tradicional desaparecer de um dia para outro.
Quando der um problema no meu PC, vou chamar um técnico e ele vai dizer que não conhece esse modelo, que já não existe mais, nem viu essa linguagem na época da faculdade. Antes que isso aconteça, vou tentando me familiarizar com o portátil.
Uma dificuldade é que a bateria dura pouco e tenho que ficar procurando tomadas. Tento escrever com ele no colo e tudo é instável ou são minhas pernas que tremem. É difícil chegar ao teclado, que fica numa posição ruim. O peso. São pesados demais para a gente carregar.
O mouse é horrível, de difícil manuseio. Já me aconselharam acoplar um mouse tradicional, mas é muita mão de obra.
Três mil e tantos toques depois, posso dizer que escrever num laptop é algo incômodo. Erro muito mais, por causa do formato do teclado e da mudança da posição de algumas teclas. E me cansei, eu que me jacto de escrever com rapidez, embaraçando-me com coisas óbvias.
Agora as vantagens. Posso escrever no jardim, ao som dos passarinhos. Não precisarei ficar só em casa, poderei produzir meus crimes literários em viagem meus amigos que se preparem, vou escrever com mais assiduidade.
De uma novidade já estou desfrutando. Não escrevo esta crônica no meu bunker, isolado do mundo e da família. Escrevo depois de um dia intenso de trabalho na universidade, no meu quarto, sentado numa poltrona macia, enquanto minha mulher lê um romance de John Fante e minha filha ouve música no iPod. Escrevo com a interferência da rotina familiar, e acho que em breve poderei fazer isso até na cozinha, durante o preparo do almoço. Talvez eu até escreva sentado no vaso do banheiro de algum aeroporto. O laptop, por tanto, vai me ressocializar. Quem diria.
E agora uma razão complementar para esta mudança. Serei pai aos 42 anos. Com o laptop poderei escrever enquanto ajudo a trocar de fralda, enquanto faço momices para meu filho dormir, enquanto esquento a mamadeira à noite.
Mas temo que quando meu rebento nascer já não existam tantas coisas essenciais para nós nesta hoje que, para ele, será uma pré-história tecnológica.
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