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Fala-se muito (bem e mal) das pesquisas na internet, do aces­­­so a bancos de dados pa­­­­ra extrair informações ou mesmo artigos completos. A geração que hoje está na escola se vale da internet como uma espécie de me­­­mória coletiva, reproduzindo tex­­­tos segundo o processo pedagógico do copiar-e-colar. Assim, não é mais o caso de aprender algo, mas de fazer as informações circularem.

Os puristas de plantão gritam:

– Com isso, perdeu-se a criatividade. É um absurdo. Não há mais nenhum esforço numa geração acomodada ao saque.

Não defendo essa pirataria textual, mas também não luto contra ela. Estamos em uma época em que a noção de originalidade é algo cada vez mais démodé (aliás, nada mais démodé do que a palavra démodé; os jovens diriam que ser original é palha). O conhecimento se massificou, como tudo em nossa sociedade. Os sujeitos são produzidos em série nesta era da comunicação múltipla e contínua, e em breve não existirá mais escola; todos serão autodidatas.

Falei isso para minha filha e os olhos dela brilharam:

– Será que pego essas mu­­­danças?

– Provavelmente não – respondi.

Mas ela não se abalou, estava vendo um programa na tevê, acessando o Orkut no laptop e ouvindo música no iPod, tudo ao mesmo tempo, e de vez em quando lia trechos de O leitor, romance do alemão Bernhard Schlink, do qual está gostando muito.

Não sabemos aonde isso vai nos levar, e não podemos conter essa avalanche tecnológica que padroniza vozes, comportamentos, rostos e desejos. Então, a grande luta é mesmo colocar internet em todos os lares, para que os periféricos também participem do butim do conhecimento e da festa das futilidades.

Li em um texto de ficção científica, mas estou propenso a crer que já deve estar em teste em algum laboratório das empresas de tecnologia, que acessaremos a rede por meio de neurotransmissores, instalados diretamente em nosso cérebro.

Se descontarmos o exagero dessa inovação, ela pode ao menos indicar em que caminho anda a tecnologia: eliminar o computador, fazendo com que pessoas se comuniquem diretamente.

Confesso que me encanta a ideia de poder transmitir alguns pensamentos, imagens de minha infância e outras coisas que minha mente guardou para pessoas que eu amo. Não precisaríamos mais descrever experiências nem justificar nossos pontos de vista. Eu permitiria um download da minha memória pessoal, claro que deletando antes algumas passagens comprometedoras.

Tais questões me levam a imaginar que, ao fazer isso, estaríamos criando comunidades em que as pessoas teriam as mesmas recordações. Eu poderia me lembrar de cenas, por exemplo, da vida de minha mulher, e isso me ajudaria a compreendê-la melhor.

As possibilidades são fascinantes e denunciam a inocência de nossos alunos (e de alguns pesquisadores) que usam o copiar-e-colar para dar conta de suas tarefas.

Você me dirá que isso está longe de acontecer, e talvez esteja mesmo, mas eu já tiro um modesto proveito dessa nova era. Uso a internet para comprar livros antigos, esgotadíssimos, perdidos em sebos remotos, aos quais antes eu não tinha acesso.

E ler um livro já é baixar arquivos diretamente em nosso sistema nervoso.

* A colunista Marleth Silva está de férias e retorna no dia 5 de fevereiro

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