Conforme iniciei no domingo que passou, vou continuar contando a história do acervo de fotografias antigas e históricas que possuo e como ele foi formado. Comecei com o encontro da caixa de negativos do extinto Foto Kabza, na Rua XV de Novembro, e fui direto ao primeiro material doado perto de duzentas chapas em vidro , fotografias feitas por Annibal Requião.
Em 1970 colaborei com um projeto do Aryon Cornelsen coordenado por Humberto Lavalle, que publicaram meia dúzia de revistas promocionais do Coritiba Foot Ball Club, que levou o nome de "Cori 70". Foi a primeira vez que publiquei imagens do meu acervo, ainda em seu início de constituição.
Em conversa com Caio Pimentel, já falecido, ele me contou possuir em sua casa um álbum de fotos antigas que pertenceu ao Dr. Victor do Amaral, avô de sua esposa, dona Dulcita, também de saudosa memória. De imediato, fui ao álbum. Na primeira página, a recomendação feita para que fosse entregue por seu marido, Frederico Petrich, e pelo filho Julinho, ao Dr. Victor.
Tal desejo era da professora Julia Wanderley, expressado pouco antes de sua morte em 1918. Algum tempo depois, Alfredo Gottardi, o famoso goleiro Caju, lembrou-me de que o filho da professora era o Julio Wanderley Petrich, que trabalhara na Secretaria de Saúde, onde eu tinha sido mensageiro em 1949-50. Afirmou-me o Caju que ele, Julio, possuía uma quantidade enorme de postais antigos.
A mestra Julia Wanderley havia montado, durante anos, quatorze álbuns contendo mais de 3 mil fotografias históricas importantíssimas sobre a história de Curitiba e do Paraná, desde 1870 até pouco antes de falecer. Tais álbuns os tive, sob empréstimo, para reproduzir as imagens e delas poder difundir suas cópias em publicações culturais. Há poucos anos, a viúva do Julio doou alguns desses álbuns para o Instituto Histórico e Geográfico, quando estava na presidência o general Luiz Carlos Tourinho, sendo que este repassou, para reproduções, os postais ali contidos ao serviço de memória da prefeitura municipal.
A mestra Julia Augusta de Souza Wanderley nasceu em Ponta Grossa. Com apenas 3 anos de idade veio com a família para Curitiba, onde fez seus primeiros estudos. Em setembro de 1890, requereu ao presidente do estado para prestar exames no Curso Normal, então destinado somente ao sexo masculino. Foi, portanto, a primeira aluna a ser matriculada na então Escola Normal. Julia Wanderley foi professora e diretora da Escola Tiradentes até pouco antes de sua morte.
Casou, a mestra, em outubro de 1895 com Frederico Petrich, de profissão entalhador e que depois teria uma loja de molduras. Apesar de ser um casamento dedicado, o casal não possuía filho, por uma questão de saúde de dona Julia. Para preencher esta lacuna, sua irmã Minervina doou o seu terceiro filho, Julinho, nascido em 1901, a quem o casal Wanderley Petrich registrou como filho legítimo.
Em agosto de 1917, licenciou-se da direção da Escola Tiradentes por ter sido diagnosticado um fibroma em seu útero, tido como benigno e o que não sucedeu. A mestra Julia Wanderley teve seu atestado de óbito expedido no dia 5 de abril de 1918. Morreu jovem, aos 43 anos, entretanto deixou uma herança cultural admirável, assim como um exemplo de vida inequívoco, por tudo que lutou e conseguiu realizar.
As imagens mostradas nesta página foram copiadas, em 1972, de postais contidos na coleção de dona Julia. São fotos subscritas com sua letra miúda e corrida, contando o que estava registrado na fotografia. A caleça passa célere pelo meio do que seria a Praça Osório, conduzindo Vicente Machado (segurando a cartola), que iria tomar posse como presidente do estado no dia 25 de fevereiro de 1904. Juntos vão o capitão Joaquim Ignácio e o Dr. Otavio (?).
Foto onde aparece dona Julia junto com suas alunas, em préstito na chegada de Vicente Machado da Europa, onde foi operado. Está anotado: Rua XV de Novembro, dia 19 de novembro de 1905, às cinco e meia da tarde.
Dona Julia tinha como hobby montar selos de correio com retratos de figuras ilustres, como o que aparece na foto montada em dezembro de 1908. Outra foto mostra um préstito cívico em honra ao conselheiro Barradas, advogado do Paraná na questão do Contestado. Em meio ao desfile, destaca-se a Escola Tiradentes dirigida por Julia Wanderley a foto, feita na Rua XV, é de 1904.
O Largo da Ordem aparece em fotografia feita em 1905, onde vemos a assinatura do fotógrafo: Annibal. A imagem está assinalada com informações históricas, bem ao gosto da mestra. Em outra foto, vemos a inauguração do busto de Julia Wanderley na Praça Santos Andrade, obra de João Turin. Lembro que existe outro busto da mestra, feito por Erbo Stenzel, em granito, colocado em frente da escola que leva seu nome, na Avenida Vicente Machado. Tal obra foi mutilada por vândalos há alguns anos.