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Reinaldo Bessa

Ele foi minha joia rara

Nicette Bruno diante do busto do médico Leocádio José Correia na sede do Museu Nacional do Espiritismo em Curitiba | Mauro Campos
Nicette Bruno diante do busto do médico Leocádio José Correia na sede do Museu Nacional do Espiritismo em Curitiba (Foto: Mauro Campos)

Foram 60 anos de alianças nos dedos – fora os dois de namoro e noivado. "Naquela época se namorava, ficava noivo", diz bem-humorada, mas contida, a atriz Nicette Bruno, viúva do ator Paulo Goulart, que desencarnou aos 81 anos no último dia 13 de março em São Paulo. O termo é uma homenagem ao querido casal de atores, que professa e divulga o espiritismo há décadas. Nicette recebeu a coluna na tarde da última sexta-feira no auditório da Sociedade Brasileira de Estudos Espíritas (SBEE), na Vila Tingui. Ela e a filha Beth, também atriz, vieram a Curitiba para o aniversário do presidente da entidade kardecista, o professor e médium Maury Rodrigues da Cruz, que completou 74 anos no feriado do Dia do Trabalho e com quem passaram o fim de semana em sua chácara, em Campina Grande do Sul, junto com outros amigos do Centro Espírita Dr. Leocádio Correia. Cruz é amigo de Paulo e Nicette desde o início dos anos 60, quando o casal veio morar em Curitiba.

Depois de percorrer as novas instalações da entidade, que incluem o Museu Nacional do Espiritismo, ciceroneada por Cruz e sua equipe, Nicette contou durante uma hora e meia como está encarando a rotina sem seu companheiro inseparável de palco e de vida, que morreu vítima de um câncer no mediastino diagnosticado há dois anos, durante um check-up de rotina, e que se expandiu para outros órgãos. "A dor é imensa, o vazio é enorme, a saudade será eterna, mas o espiritismo nos dá um suporte extraordinário", diz a atriz, visivelmente emocionada para emendar, em seguida, que isso não significa que a família não esteja sofrendo. No momento da partida, ela estava de mãos dadas com o marido, ao lado dos filhos e netos. Cada um falou alguma coisa para ele. Após cinco suspiros, fez-se o silêncio no quarto do hospital São José.

Para ela, o marido ainda está em processo de desligamento do corpo físico. Diz ter certeza de que ele está bem e que já teve oportunidade de falar com o "Irmão Leocádio", como é conhecido o mentor espiritual do Centro.

Pergunto se gostaria de receber uma mensagem espiritual de Paulo. "Seria maravilhoso, mas não quero forçar nada. Quando chegar o momento, tenho certeza de que virá", afirma tranquila. De família espírita, Nicette sempre conviveu com a doutrina de Alan Kardec e diz que o espiritismo nunca foi um bicho de sete cabeças para ela. Paulo converteu-se após conhecê-la. Sua ligação com a SBEE deu-se quando moravam em Curitiba e um tio dela – irmão de sua mãe, a também atriz Leonor Bruno – morreu. Uma amiga sugeriu que fosse falar com Maury Cruz, que já atuava como médium kardecista. Nicette foi convocada pelo Irmão Leocádio a desenvolver o espiritismo. A partir daí a causa espírita ganhou dois divulgadores de peso no meio artístico.

Amor à primeira vista

Paulo e Nicette se conheceram em 1952 quando ele foi fazer um teste para o papel de galã na peça Senhorita minha mãe, que estava sendo montada pela companhia dela, Nicette Bruno e seus comediantes, no Teatro de Alumínio. Logo começaram a namorar. O casamento foi na véspera do carnaval de 1954 e a lua de mel em Porto Alegre, para onde seguiram com a peça Ingenuidade. Desde então, foram mais de 60 peças e muitas novelas. Mas a carreira artística da dupla preocupava o pai de Paulo, Affonso Miessa, executivo do Banco Nacional, que viera de mudança para Curitiba. Nicette conta que o sogro chamou o filho, formado em Química Industrial, para uma conversa séria sobre seu futuro profissional. Seo Affonso foi também diretor da Copel e mais tarde gerente do Banco do Estado do Paraná na capital paulista. Mas a vinda do casal para Curitiba, em 1962, não os afastou dos palcos. Aqui, participaram de várias montagens, entre elas A Megera Domada, de Shakespeare. Um dos três filhos do casal, o caçula Paulo Goulart Filho, hoje com 49 anos, nasceu aqui. Em 69, Paulo foi chamado pelo diretor teatral Antunes Filho para substituir Armando Bogus no papel de Petrucchio em A Megera, que também era encenada na capital paulista. Nicette permaneceu em Curitiba com os filhos por causa da escola. O que era para ser temporário virou definitivo com o convite ao bonitão de voz grave feito por Walter Avancini, diretor da TV Excelsior (uma espécie de Globo da época), para fazer novelas. Logo em seguida ela e as crianças voltaram para São Paulo deixando muitos amigos aqui. "Tenho uma ligação muito forte com Curitiba, foi um período muito feliz da nossa vida e onde iniciamos o estudo da doutrina espírita", diz. Além de vice-presidente da SBEE, ela também preside a Casa da Fraternidade, núcleo da entidade curitibana fundado há 40 anos em São Paulo.

Joia Rara

Quando Paulo morreu, Nicette estava no ar na novela das 6, Joia Rara, na qual interpretava Dona Santinha. Sua personagem fez uma viagem para poder dar licença à atriz. Mas ela fez questão de voltar "da viagem" no último capítulo. Falando em viagem, Nicette diz que o marido foi na sua frente e tem certeza de que ele quer fortalecê-la. Por isso, deseja mergulhar no trabalho. Entre os planos está um monólogo escrito e dirigido por Beth a partir do livro Perdas e Ganhos, de Lia Luft, e um filme, a comédia Santas e Doidas, com direção de Paulo Thiago, que começa a ser rodado logo após a Copa do Mundo. Também já foi escalada para uma das próximas novelas da Globo. Mas sua verdadeira joia rara chama-se Paulo Affonso Miessa. Paulo Goulart, para o grande público. Aplausos.

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