Elas nasceram em berço de ouro, carregam na carteira de identidade um dos sobrenomes mais conhecidos do Paraná, sinônimo de empreendedorismo e de status social. Mas quis o destino que viessem dar numa página de jornal não como duas mulheres finas em uma festa badalada, cheia de gente endinheirada e bonita, como reza o manual das colunas sociais. Até poderiam, pois vez ou outra se arriscam timidamente nos salões do chamado jet set local onde vão pela causa que abraçaram, não por razões ditadas pela vaidade.
Cíntia Slaviero Simonetti (à dir.) e Cristina Slaviero Stempliuk são irmãs. Ambas casadas. Cíntia, ex-empresária e estilista, é mãe de quatro filhos, os três primeiros adolescentes e o último uma garotinha tem apenas 3 anos. Temporona do destino (sempre ele!), como se verá mais adiante. Cristina, alguns anos mais nova, tem um casal de filhos, uma menina de 8 anos e um menino de 1 ano e meio. O marido de Cíntia é empresário, o de Cristina, consultor de empresas. Já as irmãs Slaviero têm a mesma ocupação: donas de casa. Não só da própria, mas de uma casa bem maior e bem mais movimentada, ou melhor, de um Lar, com "L" maiúsculo: o Lar Antônia, nascido do sonho de ambas de "fazer alguma coisa pela sociedade em que vivemos" nas palavras de Cristina. E assim elas vêm fazendo há dois anos e sete meses, desde que passaram do sonho à realidade nua e crua. Realidade que elas fizeram questão de conhecer nos grotões da cidade, muito distantes dos ambientes glamurosos de que abriram mão, mas que as transformou em anjos da guarda de carne e osso.
Sob seus cuidados diários e de mais 22 funcionárias a maioria mães sociais e babás e até de amigos e parentes, vivem atualmente 34 bebês de zero a 2 anos de idade, saídos de ventres nutridos pelas drogas e pela miséria, mas acolhidos por almas caridosas. Todos encaminhados pelos Conselhos Tutelares e pelo SOS Criança, que direcionam os rebentos para os abrigos onde há vagas e corações disponíveis. Acolhidos temporariamente, diga-se, até que a Justiça determine o futuro de cada um. Enquanto aguardam, são tratados como pequenos príncipes e princesas, com direito a pediatra, dentista, assistente social e psicólogo. Os grandinhos frequentam escolas renomadas da cidade graças a bolsas concedidas pelos próprios colégios. Alguns entram na fila da adoção, mas outros acabam retornando para as respectivas famílias de origem, senão para os pais ou pelo menos a mãe, para algum parente que se disponha a assumi-los. "Fico muito feliz quando uma delas é adotada, mas quase morro do coração", diz Cíntia, com uma indisfarçável corujice. Cristina acrescenta: "Muitas crianças que acolhemos são filhas de pais que viveram em abrigos. Queremos que elas tenham a chance de ter uma vida diferente". Cíntia dá expediente no Lar das sete da manhã às sete da noite. Só sai para almoçar em casa e logo volta, pronta para dar colo e de mamar aos seus pequenos, aos quais chama pelo nome apenas pelo primeiro nome, o único que se sabe.
O Lar Antônia, instalado em uma ampla casa alugada num bairro central de Curitiba, é mantido pela nonagenária entidade católica Pia União de Santo Antônio Pão dos Pobres, onde Cíntia é vice-presidente e voluntária há 16 anos e da qual seu avô materno, já falecido, era voluntário e colaborador. Lá, ela trabalha com o outro extremo da vida, os idosos. Cristina dedica-se apenas às crianças, o que inclui dar conta da parte administrativa do Lar. O nome é uma homenagem à dona Antônia, voluntária mais antiga da Pia União. A FAS (Fundação de Ação Social), da Prefeitura de Curitiba, com quem elas mantêm convênio, ajuda com R$ 350,00 por criança. Mas essa grande família custa caro: R$ 30 mil por mês mais R$ 8,5 mil de encargos sociais. O que garante literalmente o leite das crianças são as doações feitas por amigos e uma ou outra campanha que resulta em fraldas descartáveis, latas de leite e outros alimentos. Um tio delas por parte de mãe, poderoso empresário da cidade, banca o aluguel da casa por meio do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Curitiba (Contiba), que autoriza a quem desejar transformar o imposto devido em doações para tais entidades. Uma espécie de Lei Rouanet da vida.
As crianças maiores vão passar o Natal na casa das funcionárias e voluntárias. Vão ganhar os presentes pedidos ao Papai Noel. Uma delas, porém, vai passar longe de Curitiba, nos Estados Unidos, com Cíntia, o marido e os outros filhos do casal. Afinal, ela é o xodó da casa. Com todo o direito.
* A quem interessar, o telefone do Lar Antônia é 3343-4517
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