O poder público, regra quase universal, é pródigo em fazer asneiras. Algumas vezes, elas esbarram no estético, na tentativa de arte ou graça, com resultados constrangedores. Em certos casos, a bizarrice é tão grande que acaba virando folclore. O exemplo mais à mão é o de uma estátua em homenagem à araucária, construída em 2004 em Ponta Grossa, que, por sua aparência inusual, ganhou o truanesco apelido de “cocozão”. A ideia, pelo que pude entender, era homenagear a árvore e os arenitos locais em uma sofisticada fusão imagética cujos resultados, no papel, pareciam promissores. E as pessoas, incrédulas, olharam e se perguntaram: “Meu Deus, por quê?”

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A trajetória da obra, que virou motivo de crítica por seu preço e de piada por sua aparência, foi igualmente trágica: em 2009, após a tentativa de retirada de um vespeiro que havia se instalado em sua copa estilizada, pegou fogo e não foi reconstruída. Até seu fim, enfim, foi espetacular.

Neste exato instante, em algum lugar, há um prefeito construindo uma estátua de cinco metros de altura em homenagem ao feijão

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O caso mais recente vem do Egito, onde as autoridades da cidade de Samalut resolveram homenagear a rainha Nefertiti, esposa do faraó Akhnaton, com uma estátua em uma praça pública. Nefertiti, cujo nome significa algo como “a bela que chegou”, ficou conhecida do público em 1912, quando arqueólogos alemães descobriram um pequeno busto seu em calcário. A obra, magnífica a ponto de estremecer as relações entre o Egito e a Alemanha (os germânicos, que a levaram para seu país em 1920, não cogitam devolvê-la), retrata uma mulher incrivelmente bela.

Pois bem: na estátua de Samalut, a rainha ficou parecidíssima com uma daquelas carrancas dos barcos do Rio São Francisco que, em minha época de menino, eram copiadas e vendidas nas feiras de artesanato. A beleza imortal trocada por uma cara alongada pintada de amarelo, olhos minúsculos e orelhas deformadas – coisa horrível. Exemplo monumental do “escorregão estético” a que nos referimos na abertura desta crônica.

A reação foi instantânea. O povo achincalhou tanto que, em questão de dias, a prefeitura deu sumiço na obra, que foi trocada por uma providencial estátua da pomba da paz. E, assim, a “Feia que Chegou” (trocadilho péssimo) saiu da praça para entrar na história da infâmia artística.

Que não restem, porém, preocupações quanto ao abatimento do poder público diante da vigilância azeda das redes sociais: neste exato instante, em algum lugar do planeta, há um prefeito pintando uma unidade de saúde de púrpura ou construindo uma estátua de cinco metros de altura em homenagem ao feijão. Para a ira e a alegria geral da nação.

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