Fiquei maravilhado com uma história que ouvi outro dia, sobre como um cometa teria definido a sorte de uma civilização. Mais exatamente a de Atenas, na última batalha da Guerra do Peloponeso, em 404 a.C.. Consta que atenienses e espartanos estavam no mar, prestes a iniciar um combate de esquadras, quando um cometa surgiu. Cometas não são como meteoritos, que cortam o céu freneticamente para cair alhures; eles ficam lá, riscando por dias o firmamento com seu dedo de luz para mostrar sabe-se lá que desígnio divino. E foi exatamente por isso que os navios não se mexeram.
O fim da Guerra do Peloponeso marcou, também, o fim do poder geopolítico de Atenas
O tempo ia passando e ninguém, aparentemente, estava a fim de assumir o risco da ira cometária. Consta, porém, que os atenienses viram o fenômeno como um sinal aziago (eles já andavam meio mal das pernas), enquanto os espartanos o tomaram como um indicativo de vitória. Sabedores do terror de seus oponentes, os lacedemônios fingiram estar apavorados e mandaram uma nau com um emissário que pedia alguns dias de trégua. Para consultar o oráculo, sacrificar alguns bois e esperar o céu voltar à configuração original.
Aliviados, os atenienses aceitaram rapidamente a proposta e foram reforçar as próprias grelhas de sacrifício. Na medida em que os adversários faziam o mesmo, baixaram um pouco a guarda. Foi quando os espartanos reuniram seus navios e, no meio da madrugada, rasgaram a esquadra ateniense pelo meio, destroçando os cascos negros com seus esporões de bronze e provocando uma derrota absoluta.
O fim da Guerra do Peloponeso marcou, também, o fim do poder geopolítico de Atenas: nas décadas seguintes, a cidade se reergueu, venceu Esparta e até aliou-se a ela contra a hegemonia tebana, para cair em seguida sob o poder dos macedônios e, mais tarde, dos romanos.
No fim das contas, e essa é a beleza terrível da história, os atenienses estavam certos sobre o sinal do cometa. Mais certos, porém, estavam os espartanos ou, pelo menos, aquele almirante lacônio que provavelmente percebeu uma chance escondida no vácuo de razão deixado pelo medo – o mesmo que poderia ter contaminado seus próprios guerreiros. E o cometa, protagonista inconsciente de toda a história, voltou para o baú dos deuses ou, como quer a ciência, saiu de cena aqui para deitar sua trilha de gelo e poeira cósmica por outras bandas do sistema solar.
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