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Rodrigo Wolff Apolloni

O Zen do Samba

 | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
(Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo)

Carnaval. Aproveito a quietude no “jardim luz cheio de rosa e sem pandeiro” para ouvir um CD do Jorge Ben Jor comprado por impulso há alguns dias em um sebo na região do Teatro Guaíra. Mais uma coletânea, o que, no caso de Jorge, pode ser uma boa pedida, especialmente porque ele gravou seus maiores sucessos muitas vezes, com pequenas diferenças entre as versões. É o que confirmo logo na primeira música do CD, Que Maravilha, uma joia de poesia tão requintada (composta em parceria com Toquinho em 1969) que fornece um verdadeiro refresco à alma.

Pois bem: na versão em tela, que desconfio ser a primeira por causa do arranjo que transita entre o samba, a bossa nova e a jovem guarda, Jorge canta os versos básicos: “Lá fora está chovendo / mas assim mesmo eu vou correndo / só pra ver / o meu amor. / Ela vem toda de branco / toda molhada e despenteada / que maravilha / que coisa linda / é o meu amor. / Por entre bancários, automóveis, ruas e avenidas / milhões de buzinas tocando sem cessar / ela vem chegando de branco meiga e muito tímida / com a chuva molhando seu corpo que eu vou abraçar. / E a gente no meio da rua do mundo / no meio da chuva / a girar / que maravilha / a girar...”.

Jorge Ben Jor é figura absolutamente admirável e de poesia tão sofisticada, tão cristalina, que parece simples

Escuto e fico encafifado no bom sentido. Isso porque, até onde minha memória musical alcançava – nutrida por versões mais recentes da canção –, os versos de Que maravilha incluíam palavras como “linda” (“toda molhada, linda e despenteada”), “jatomóveis” (“Por entre bancários, jatomóveis...”), “harmonia” (“milhões de buzinas tocando em harmonia sem cessar...”), “linda, pura” (“...ela vem chegando de branco meiga, pura, linda e muito tímida...”) e “lindo” (“com a chuva molhando seu corpo lindo que eu vou abraçar...”).

Ou seja: na minha versão, naquela que minha mente havia registrado, o poeta simplesmente havia incorporado uma série de palavras de reforço aos versos originais, sem, contudo, lhes deformar o sentido nem intoxicar a escuta por excessos verborrágicos. Duas versões, enfim, igualmente inspiradas da letra, que produziram tramas e formas de cantar ligeiramente diferentes.

O que parece uma bobagem, mas não é, se pensarmos, por exemplo, na dificuldade que reside na combinação letra-música e no mistério de harmonizar tudo na hora em que os holofotes se acendem. Estamos falando, porém, de Jorge Ben Jor, figura absolutamente admirável e de poesia tão sofisticada, tão cristalina, que parece simples – mas que é o próprio primor. Salve, Jorge!

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