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Eu certamente seria outro com um hífen no primeiro nome. Ajudaria, claro, ter uma cara de conde, mas na falta desta só o nome com hífen já me asseguraria deferências inéditas, a começar pelo xequin em hotéis

O que eu mais admiro na Catherine Zeta-Jones é o hífen. No fundo é inveja, vontade de ter um hífen no nome também. Nada dá mais classe a um nome do que um hífen bem colocado. Não há nomes com hífen em português. É coisa de inglês. No caso da esplêndida Catherine, galês. Francês também usa hífens, mas mais em primeiros nomes: Jean-Paul, Jean-Luc, Marie-Ange. Já me serviria: Luis-Fernando. Ou Louis-Ferdinand. Hein? Hein? Eu certamente seria outro com um hífen no primeiro nome. Mas o que mudaria mesmo a minha vida seria um sobrenome hifenizado. Bartley-Simms. Hargrove-Midcalf. Destaigne-Plouchard! Ajudaria, claro, ter uma cara de conde, mas na falta desta só o nome com hífen já me asseguraria deferências inéditas, a começar pelo xequin em hotéis. Um Destaigne-Plouchard vai para a suíte presidencial sem nem precisar pedir. A distinção não é para ele, é para o hífen. E a um hífen não se pede credenciais, caução, depósito ou avalista. O hífen é a sua própria referência. E mais: num hipotético encontro seu com a Catherine Zeta-Jones, vocês já têm sobre o que conversar. Você pede para ela lhe falar do seu hífen e você fala do seu. E por que não continuar a conversa na suíte presidencial?

Nome pode ser destino, às vezes ironicamente. Walter Benjamin gostava de inventar nomes. Mesmo antes de ser forçado a escrever com outro nome durante a ascensão do nazismo, usou pseudônimos como Agesilaus Santander. Seu último livro publicado em vida, na Suíça, saiu com o nome "Detlev Holz", que era como ele assinava seus artigos clandestinos na Alemanha. Benjamin também amava alegorias. Seu fim é conhecido. Suicidou-se em Port Bou, na fronteira entre a Espanha e a França ocupada pelos alemães, desesperado – é o que se imagina – pela possibilidade de ver barrada a sua fuga. Não ficou vestígio dele em Port Bou. Depois se soube que as autoridades locais tinham alugado um nicho no cemitério da cidade, por cinco anos, para o corpo de um certo Benjamin Walter, alemão, presumivelmente católico como todos lá enterrados. No fim dos cinco anos os restos de Benjamin Walter foram transferidos para uma vala comum, onde até seu pseudônimo final desapareceu. Depois da guerra era tanta gente procurando o túmulo de Walter Benjamin em Port Bou que o cemitério improvisou um, para não frustrar os turistas. Hoje, além do falso túmulo, existe um monumento à memória do escritor numa encosta de montanha. Dizem que é muito bonito. O corpo do "saturnino" (como o chamou Susan Sontag) Benjamin segue misturado com o de outros anônimos, numa alegoria perfeita para quem vivia escondendo o nome.

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