O homem está apático. Não se mexe, não sabe o que fazer. Não dá mais. Acabou. O homem era Ronaldo e as frases são da Copa do Mundo de 2002. Que o Brasil ganhou, em grande parte, graças às poucas mas decisivas vezes em que Ronaldo fez o que sabe fazer: gols. No jogo de anteontem Ronaldo só chegou perto de marcar um gol uma vez. Aquele chute por cima do travessão. No resto do tempo foi apático, etc. Nossa esperança é que Ronaldo repita 2002 exatamente. Jogando mal ele já está. Faltam os gols.
O diabo é que aquela é uma posição paradoxal, para não dizer desgraçada. O cara está lá para fazer gols e tem de jogar de costas para o seu objetivo na vida. É um finalizador, tem uma das funções básicas de um time de futebol, e geralmente toca menos na bola do que um gandula. Vive cercado de inimigos cuja única preocupação é evitar que ele pratique o seu ofício e cumpra seu destino. Ou ele é um touro sem sentimentos ou acaba com problemas emocionais e físicos. Ronaldo não é um touro sem sentimentos.
Mas aproveitando a analogia um centroavante também tem a mesma oportunidade que tem um toureiro de se redimir num segundo. Um toureiro pode fazer uma "faena" medíocre, tropeçar na capa, receber vaias e almofadas na cabeça e ser gozado pelo próprio touro, mas se sua estocada final for perfeita, direto no coração do animal, ele sairá da arena consagrado. A tourada não passa de um processo para evitar que, na hora da estocada, o touro levante a cabeça. É um dramático ritual de luzes e sangue com um único, prosaico, objetivo: cansar os músculos do pescoço do touro. Um jogo de futebol também é apenas um processo ritualizado, cujo fim é o gol. É a bola lá no fundo. A estocada no coração. Se aquele chute por cima do travessão tivesse entrado no gol, ninguém estaria falando mal do Ronaldo e da sua "faena". Ele teria saído de campo sob vivas e dormido com a Rita Hayworth.
Touros, toureiros... Quem diria que o verdadeiro Brasil estrearia na Copa ontem, disfarçado de Espanha?
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