• Carregando...

Cristopher Hitchens e Alexander Cockburn eram os dois principais colunistas do semanário "The Nation", a mais antiga publicação "de esquerda" dos Estados Unidos. Alternavam-se no mesmo espaço e tinham em comum o estilo brilhante e o fato de serem ambos imigrantes, Hitchens da Inglaterra e Cockburn da Irlanda, o que nunca os impediu de baterem forte na política e nos costumes da sua terra adotada. Mas Hitchens surpreendeu todo o mundo, seus colegas e empregadores da "Nation" não menos do que seus leitores, apoiando a invasão americana do Iraque e justificando a política externa de Bush e seus belicosos neo-conservadores – uma posição que defende até hoje, como sabem os que o viram e ouviram na Flip do ano passado. Suas opiniões contrastavam tanto com a linha da revista e as expectativas do seu público que ele acabou saindo – não sei se por iniciativa própria ou por sugestão irrecusável. Ficou Cockburn como o principal batedor da "Nation".

E agora Cockburn deu uma de Hitchens. Também para a surpresa geral, tem atacado na sua coluna o que chama de catastrofistas do aquecimento global, refutando suas teses sobre o efeito do dióxido de carbono produzido pelo homem no clima e comparando o medo sem fundamento que eles espalham com o terror que precedeu o fim do primeiro milênio da era cristã. Naquela época quem lucrou com o apocalipse anunciado foi a Igreja Católica, vendendo indulgência divina adoidada aos assustados. Hoje, segundo Cockburn, quem ganha com o medo é a indústria nuclear, com sua promessa de energia não-poluente – descontado, claro, o risco da contaminação permanente por escapamento radioativo. A "Nation" tem dedicado grandes espaços à ameaça do aquecimento global e sido uma crítica feroz de Bush e dos interesses petroleiros que apóiam seu desdém pela questão ambiental. Não deve estar gostando de ser chamada, nas suas páginas, de conivente com uma farsa que favorece as nucleares. Mas, que se saiba, Cockburn não pretende sair.

Hitchens ainda não se arrependeu, mas a imprensa americana está reexaminando seu papel na grande mentira que levou ao desastre no Iraque. O caso de cumplicidade mais notório foi da repórter Judith Miller, que durante meses repetiu, nas páginas do "New York Times", informações falsas, para justificar a invasão, do escroque Ahmed Chalabi. Mas toda a imprensa, com exceção de "The Nation" e similares, colaborou com a guerra dos neocons, acreditando demais ou discutindo de menos. Agora que a maioria do povo americano está contra Bush e a guerra, estão se autocriticando. Antes tarde, etc. No Brasil, talvez um dia a imprensa examine seu papel e suas cumplicidades na guerra em que também se engajou, nem sempre no lado da verdade. Talvez um dia.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]