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Nada melhor para discutir futebol do que a ausência do futebol. Isto é, do que aqueles períodos em que tudo é preparação e expectativa, tudo é especulação, e portanto tudo é teoria. Quando começa o futebol, as especulações passam a correr o risco de desmoralização instantânea, e nenhuma tese definitiva está livre de ser destruída por uma bola espirrada. É quando não há o perigo do desmentido pela prática que a teoria prospera. E assim como os jogadores precisam aprender a jogar sem a bola, comentaristas têm que saber comentar sem a bola. Inclusive para ter assunto quando a bola está parada.

Acho que o debate tático melhorou desde os tempos em que tudo se concentrava na figura do "cabeça-de-área", que nem se chama mais assim. Quem justificava a presença de um "cabeça de área", hoje volante de contenção (pelo menos o nome melhorou), na seleção era considerado defensivista, retranqueiro e até antibrasileiro, na medida em que queria desfigurar o nosso alegre futebol, europeizando-o. Quem desprezava o "cabeça de área" era chamado de romântico, um dos piores epítetos no vocabulário do prolongado debate. Felizmente, nenhum treinador brasileiro nos últimos 40 anos – nem "ofensivistas" notórios como o Telê Santana – prescindiu de um jogador cuja função na seleção, disfarçada ou não, era a de guarda avançada da grande área. E a pressão contra o "cabeça de área", sempre identificado como sinônimo de "cabeça de bagre", não era pouca. Ouvia-se muito de torcedores entusiasmados que bastava escalar cinco craques na frente, o "dream" ataque do momento, para que o resto da seleção se tornasse supérflua, a começar pelo "cabeça de área". Era a teoria do levamos quatro e fazemos sete.

Hoje um Émerson ainda provoca dúvidas como as que provocaram Batista e Dunga, por exemplo, e na base dessa discussão sobre usar ou não o Robinho com o sacrifício de alguém da contenção também há vestígios do velho debate. Mas a mecânica do jogo e as funções táticas mudaram, a discussão se sofisticou e, se realistas e românticos ainda não se reconciliaram completamente, pelo menos não brigam mais por uma posição só.

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