Como Hemingway, Norman Mailer sempre se preocupou em mostrar que a literatura pode ser um respeitável ofício de macho. Numa cultura de desbravadores e empreendedores o escritor precisa se cuidar para não ser confundido com mulheres românticas ou franceses afetados. E, acima de tudo, para não ser irrelevante. Mailer perseguiu a relevância, e escreveu como ninguém sobre o que foi mais relevante na América do seu tempo. Sobre o poder e a fama, e os delírios, as guerras, os pós-guerras e os remorsos da república. E sobre si mesmo, engajado em todas as frentes como nenhum outro intelectual americano da sua geração. De Hemingway ele herdou a idéia da testosterona como credencial literário mas veio do John dos Passos a compulsão de ser testemunha ativa de uma época, e adotar o clima e o ritmo da época no seu estilo. Mailer participou de todos os combates. Até quando enfiou uma faca na mulher estava interpretando, talvez com excesso de realismo, a loucura vigente.
Mas construindo seu próprio mito pessoal mais até do que o também truculento Hemingway, Mailer acabou se expondo a uma comparação que lhe doeria, se pudesse ler seus obituários esta semana. Com Truman Capote, o outro exemplo extremo do escritor americano como celebridade. A auto-imagem do Capote era tudo que a auto-imagem do Mailer fazia questão de não ser, quase uma caricatura de alma sensível num corpo assexuado, mas os dois tinham coisas em comum além da notoriedade bem cultivada. Principalmente dois livros de não-ficção com temas parecidos, escritos com a mesma atípica sobriedade: o "A sangue frio" do Capote e o "A canção do carrasco" do Mailer, sobre condenados à morte esperando a execução. Na opinião de muita gente, os dois nunca fizeram nada melhor.
Mailer não foi o melhor escritor americano da sua geração. Na linguagem do boxe que tanto invocava, ele não duraria muito num ringue com o peso-pesado Saul Bellows e talvez perdesse por pontos para um John Updike ou um Philip Roth. Mas, enquanto estivesse de pé, daria um show. Poucos intelectuais da sua época merecem, como Mailer, o epitáfio "Este esteve nas barricadas." E ninguém jamais dirá que ele foi irrelevante.