No caso mais grave dos últimos quatro anos no Paraná, uma rebelião de presos causou a morte de ao menos quatro pessoas e fez agentes reféns na Penitenciária Estadual de Cascavel. O motim começou na madrugada de domingo e não havia sido encerrado até o fechamento desta edição. Com a energia elétrica e o fornecimento de água cortados, as negociações foram suspensas no início da noite de ontem e a previsão era de que as conversas seriam retomadas às 7 horas desta segunda-feira.
O motim ficou marcado pela extrema violência: ao menos cinco presos foram jogados do telhado, de uma altura de 15 metros, e permaneceram sem atendimento médico por cerca de três horas, até que as equipes de resgate do Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar conseguiram entrar no pátio em segurança. Dois presos foram decapitados e os corpos foram usados para torturar os reféns. O número de feridos não foi confirmado.
Os motivos que levaram ao início da rebelião ainda não foram esclarecidos. Os presidiários fizeram reivindicações, pedindo o fim de abusos (veja quadro abaixo). Contudo, no telhado da penitenciária foram colocadas faixas fazendo referência ao Primeiro Comando da Capital (PCC) facção criminosa que domina presídios de vários estados. Informações não oficiais dão conta de que a rebelião foi planejada e é uma disputa de grupos rivais. A penitenciária não está superlotada: tinha 1.040 presos e capacidade para 1.116.
A estimativa é de que 800 detentos participam da revolta. Dois agentes penitenciários foram feitos reféns e continuam nas mãos dos presos. Outros detentos também estão como reféns na penitenciária. A assessoria de imprensa informou que a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju) vai se pronunciar somente hoje. A secretária Maria Tereza Uille Gomes viajou para Cascavel e participou das negociações.
O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Cascavel, Amarildo Horvath, teve acesso ao local e contou à reportagem que, das 24 galerias da penitenciária, 20 foram danificadas. No final da tarde de domingo, 77 presos foram transferidos para a Penitenciária Industrial de Cascavel, que fica no mesmo complexo que a Penitenciária Estadual. Os detentos estariam sendo ameaçados pelos rebelados. A secretaria estuda fazer outras transferências de presos.
Os detentos se reuniram no telhado da penitenciária e também queimaram colchões. Os rebelados usavam capuz para esconder o rosto e estenderam faixas sobre o presídio cobrando respostas e fazendo reivindicações. Várias pessoas foram espancadas pelos detentos e mostradas para quem acompanhava a rebelião do lado de fora.
Famílias rezam pelos detentos
O clima durante todo o dia, em frente à Penitenciária Estadual de Cascavel, foi de muita preocupação para os familiares de presos em busca de notícias. Desesperados, muitos familiares choravam e imploravam por informações. No período da tarde, eles fizeram uma roda de oração e, com bíblias nas mãos, pediram o fim da rebelião. O pai de um dos detentos afirmou que a situação pode se transformar em um novo Carandiru, em uma alusão aos 111 presos mortos em 1992 no antigo presídio paulista durante uma rebelião. "Eu sei que os agentes não respeitam os presos", afirmou.
Uma mulher, que também não se identificou, disse que o marido está dentro do presídio e que ela já lutou por melhorias, enviando cartas à direção e procurando o juiz corregedor, mas nunca obteve resposta. "Eles estão sendo oprimidos lá dentro, não têm nem chuveiro. Eles não querem regalia, mas o mínimo de estabilidade", afirmou.
Um rapaz disse que já esteve preso no local e afirmou que os agentes são extremamente agressivos. "Cansei de levar tapa na cara", contou. Segundo ele, um dia foi agredido e colocado isolado apenas por ter pedido um remédio quando estava doente.
O entra e sai de policiais no local deixou o local perigoso devido ao número de pessoas que se aglomeraram próximo ao acesso do presídio. Uma criança ficou ferida após um carro de cor prata, dirigido por um policial, passar sobre seu pé.
A última
Há quatro anos e meio o Paraná não enfrentava uma rebelião em presídios estaduais em que houvesse mortes. A última ocorreu em janeiro de 2010. Cinco presos foram assassinados pelos detentos rebelados na Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Na época, o motim de 1,5 mil presos durou 18 horas e terminou com 90% das celas destruídas.
Exemplo
Em janeiro, a secretária da Justiça do Paraná, Maria Tereza Uille Gomes, participou de uma visita técnica ao Maranhão para auxiliar o estado nordestino no controle da crise carcerária. O Paraná apresentou o Business Intelligence, um software de gestão prisional desenvolvido aqui e que disponibiliza dados atualizados sobre o sistema penitenciário, com o perfil de cada detento. Em dois anos, com o auxílio do BI, o Paraná reduziu em 2,5 mil o número de detentos em presídios.