O estudante Patrick Alax Pereira Franco, 16 anos, levou a brincadeira de polícia e ladrão a outro patamar no Campo de Santana, periferia de Curitiba. Há quase dois anos, ele circula pelo bairro com uma bicicleta que simula a moto da Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas (Rocam) da Polícia Militar. A roupa também é igual à farda nos mínimos detalhes.
“A primeira vez que saí assim os policiais me chamaram para tirar foto. Agora sempre que passa uma viatura eles querem tirar foto comigo”, orgulha-se Patrick, que em fevereiro recebeu visita da equipe da Rocam, que se sensibilizou com a história do menino que sonha em ser PM. “Eles disseram para eu estudar que um dia eu viro policial como eles. E brincaram que comigo vestido desse jeito não precisam mais fazer patrulha na minha rua ”, recorda.
Há três meses, Patrick compartilha com um novo amigo a brincadeira. Logo que se mudou com a família para o Campo de Santana, Douglas Fernando Martins, 14 anos, estava entregando panfletos de mercado pela vizinhança quando viu Patrick e sua “viatura”. Como também sonha em ser policial, perguntou se poderia entrar na brincadeira. “Meu avô era PM e meu pai sempre fala que ele era um bom policial. Quero ser como ele”, afirma Douglas, filho de um vigilante.
Antes de pedalar a bicicleta personalizada e vestir a “farda”, Douglas teve de passar por um teste criado por Patrick, que consiste na simulação de uma fuga. Só entra no time dos meninos PMs do Campo de Santana quem alcançar de bicicleta o “meliante” em menos de três minutos. “Cinco já passaram e três foram reprovados. Fora os desistentes, porque em dia de sol forte é difícil perseguir de farda”, relata o coronel Patrick, como se autointitula. “O Douglas ainda é soldado. Acabou de deixar de ser recruta”, explica sobre a patente do parceiro.
PMs mirins
Na brincadeira de polícia e ladrão no bairro Campo de Santana, os adolescentes Patrick Franco e Douglas Martins levam a coisa a sério: se vestem de PM sonhando um dia entrar na corporação.
+ VÍDEOSO irmão de Douglas, Matheus, de 10 anos, será o próximo a entrar no batalhão mirim do Campo de Santana. Para isso, a bicicleta de Douglas está sendo paramentada por Patrick. “Enquanto não tem farda, o Matheus é da P2”, brinca Patrick, referindo-se ao serviço de inteligência da PM, cujos policiais atuam à paisana.
Projeto
A brincadeira começou com a amizade do pai de Patrick com PMs que costumam passar na casa da família para beber água durante as rondas. Nessas visitas, o menino foi se interessando pela profissão. A ponto de tentar reproduzir uma viatura. “Na verdade eu queria fazer um carro, juntando duas bicicletas. Como não deu certo, fiz a moto”, explica.
Para reproduzir os detalhes da moto da Rocam, Patrick passou uma semana estudando imagens da internet. Desenhou em um caderno como deveria ser cada parte. O primeiro modelo foi de papelão, mas não durou muito. Decidiu então usar forro de PVC para reproduzir a lataria. Uma caixa de ferramentas virou o baú da moto, enquanto que um copo pintado de vermelho virou o giroflex. Os faróis de alerta da parte da frente foram feitos com embalagens de iogurte. Já o som da sirene vem do celular. A primeira bicicleta levou três semanas para ficar pronta. A segunda, uma semana.
“Ele passa o dia criando coisas para essas bicicletas. Vai para a escola de noite, volta, fica até tarde desenhando e de dia ele põe as ideias em prática”, explica o pai do menino, o pedreiro Josué Franco, 37 anos.
Para as fardas, são usadas duas calças compradas no brechó que eram de fato de policiais. As camisas Patrick tingiu com tinta marrom, no tom do uniforme da PM. Os coletes, caneleiras, joelheiras e braçadeiras são de papelão. Um dos capacetes Patrick achou na rua, o outro, ganhou de um amigo do pai. Os distintivos foram desenhados no papelão. “Muita gente acha que somos PM de verdade. Dia desses um cara entrou na rua empinando a moto, viu a gente e levou um susto”, relata Patrick.
O equipamento é formado ainda por três pistolas feitas por Patrick: uma de madeira, outra de papelão e uma terceira de argila. As três têm até número de inscrição, como as de verdade. Para se comunicar, a dupla usa dois walkie talkies de alcance de 500 metros.
Além do sonho de ser PM, Patrick e Douglas têm outra coisa em comum que os difere da maioria dos adolescentes de hoje. Nenhum dos dois gosta de videogame e nem passa o dia com a cara no computador ou celular. “A gente gosta mesmo é de brincar na rua”, enfatiza Patrick.
Segurança
Mesmo sendo só uma brincadeira, Patrick e Douglas sabem que não podem ir muito longe quando saem de casa com as roupas que reproduzem a farda da PM. Tanto a equipe da Rocam que homenageou Patrick em fevereiro, como os policiais que circulam pelo bairro sempre o orientam a só brincar com as bicicletas e as roupas perto de casa.
O temor é de que os meninos sejam realmente confundidos com policiais e acabem se ferindo. “Vou ficar muito orgulhoso se ele virar mesmo PM. Mas por enquanto, já avisei que a brincadeira é só aqui perto de casa, onde todo mundo conhece a gente”, reforça o pai de Patrick, Josué Franco.
Os meninos PMs já são conhecido pelos moradores, que gostam da brincadeira. Mas alguns levam a coisa a sério e até xingam a dupla. “Tem umas pessoas que xingam a gente, não porque não gostam de mim ou do Douglas, mas porque não gostam da polícia. A maioria é noia [usuário de drogas]”, afirma Patrick.