Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos é responsável pela Comissão de Anistia| Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil
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A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, afirmou no fim do ano passado que esperava zerar a fila das análises de requerimentos de anistia por motivos políticos no Brasil até o final de 2020. A pandemia do coronavírus mexeu com o planejamento de todo o governo, e a meta de zerar as análises pendentes até o fim do ano se tornou mais difícil. Mas a Comissão de Anistia, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), não deixou as análises de lado.

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Nas últimas semanas, aliás, Damares vem publicando diversas portarias com indeferimentos em bloco de pedidos de anistia de pessoas que alegam ter sido vítimas da ditadura militar (1964-1985).

No dia 22, 170 pedidos foram negados. Um dia depois, mais 114 pedidos. Também em junho o MMFDH anunciou que 295 anistias concedidas indevidamente a ex-cabos da Aeronáutica foram anuladas.

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Essa anulação ocorreu depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o Executivo a reavaliar 2.643 anistias concedidas a ex-cabos. Segundo o MMFDH, o cancelamento das anistias indevidas representará uma economia de quase R$ 3,5 milhões por mês aos cofres públicos.

Desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu, é a pasta de Damares que cuida da avaliação desses pedidos, por meio da Comissão de Anistia – responsável pela política de indenização às vítimas da ditadura.

Desde 2001, quando começaram os trabalhos, 78,6 mil requerimentos de reparação foram protocolados. Desses, 68,5 mil já foram arquivados. Até o dia 2 de julho, segundo o MMFDH, havia 974 requerimentos pendentes de análise pelo ministério e 6,4 mil requerimentos pendentes de análise pelo Conselho dessa comissão.

No começo do governo, Damares defendeu a importância de dar uma resposta ágil aos requerimentos. “Nós temos que dar ou sim ou não. Se eu der uma resposta ‘não’, se o ministério decidir que ele não tem direito, ele ainda pode recorrer judicialmente. O que não podemos é não dar respostas. O meu papel é dar resposta a todos os requerimentos que foram protocolados”, disse a ministra.

Meta não é acabar com a Comissão de Anistia, mas agilizar processo, diz ministério

O processo de análise dos requerimentos funciona da seguinte forma: o Conselho da Comissão de Anistia, que tem um colegiado formado hoje por 11 membros, analisa os pedidos e emite um parecer. A equipe do MMFDH pode acatar ou não a decisão desse colegiado, e a ministra Damares Alves assina portarias deferindo ou indeferindo os pedidos de anistia. Os requerentes de pedidos indeferidos podem recorrer à Justiça.

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Por causa de algumas análises realizadas em bloco, opositores do governo têm afirmado que o MMFDH pretende acabar com a Comissão de Anistia acelerando o indeferimento de pedidos. Mas o presidente do Conselho da Comissão de Anistia, João Henrique Nascimento de Freitas, explica que a intenção não é acabar com o órgão, mas zerar a fila de análises pelo próprio bem dos requerentes.

“Quando nosso colegiado assumiu, a gente verificou que tinha processo de 2002 que não tinha sido apreciado ainda. É realmente um desrespeito com a pessoa que formula o requerimento e aguarda esses anos todos para ter uma resposta. A gente está conseguindo apreciar mais requerimentos do que aqueles que estão entrando”, diz.

Segundo Freitas, uma meta da Comissão para dar agilidade aos trabalhos é passar a fazer as análises de requerimento de forma remota, por sessões virtuais. Mas ainda há alguns entraves para isso. “A gente tem que permitir que as sessões sejam publicizadas. As sessões não podem ser reservadas. E a gente precisa garantir que as partes e os advogados façam uso da palavra se assim quiserem”, explica.

Além de permitir mais agilidade, as sessões remotas representariam um corte de gastos para o governo. “O fluxo de trabalho seria melhor, porque não teria o deslocamento dos conselheiros, e seria muito mais econômico para a administração, porque não teria o custo com viagem, com passagem aérea”, diz.

Despolitizar análises é objetivo, afirma presidente de conselho

Uma das principais críticas da atual gestão sobre a atuação de gestões anteriores é em relação à ordem dos processos analisados, que, segundo os atuais gestores, denota motivações políticas na análise dos requerimentos. Segundo Freitas, o Conselho da Comissão de Anistia tem usado, desde 2019, o critério cronológico para a avaliação dos pedidos.

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“Os requerimentos são avaliados com um critério bastante técnico. Não existe aquela questão de dizer 'sim' ou 'não' a um requerimento com base na simpatia pelo requerente, pela amizade ou pela importância política daquela pessoa. Todos os processos são tratados de maneira igual, para nenhum ter privilégio. E nós seguimos rigorosamente, na pauta, o critério cronológico”, diz.

A ideia do governo, segundo ele, é a de que a Comissão “deixe de ser uma comissão de política de governo, como já foi no passado, e passe a ser uma comissão de política de Estado”. “Os presidentes vão e vêm, os ministros vão e vêm. Não são eternos nas suas funções. A Comissão tem que funcionar de acordo com o sistema jurídico vigente, independente das pessoas”, afirma.

Além da cronologia, para agilizar as análises, o Conselho também trabalha com blocos temáticos, para apreciar casos semelhantes em conjunto. “Temos um bloco que fala sobre vereadores, outro bloco que fala sobre os ex-cabos da FAB, tem o bloco da guerrilha do Araguaia… A equipe faz uma triagem e viabiliza a nossa apreciação por blocos. Se algum conselheiro entender que um processo não se aplica ao bloco, esse processo é destacado e apreciado em separado”, explica Freitas.

Processo da ex-presidente Dilma deve ser analisado em breve

Um dos processos pendentes de análise pelo Conselho da Comissão de Anistia, seguindo o critério cronológico, é o requerimento da ex-presidente Dilma Rousseff, que pede uma indenização de R$ 10,7 mil mensais. O processo foi pautado no ano passado, mas a análise foi adiada.

“A pedido da própria advogada da ex-presidente, ele foi retirado de pauta. A advogada é de São Paulo e estava impossibilitada de comparecer à sessão. A então relatora do processo acolheu o pedido da advogada. Ele seria retomado agora, no começo do ano. Só que, por questão da pandemia, a gente acabou não pautando nenhum processo”, explica.

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Segundo o presidente do Conselho, os membros do colegiado seguem “rigorosamente os princípios da Constituição Federal, entre eles o da impessoalidade”. “O processo da ex-presidente Dilma não vai ter um tratamento diferente por ela ser uma ex-presidente. Ele vai ser pautado de acordo com a cronologia. A orientação é da imparcialidade, da impessoalidade da aplicação da lei”, assegura ele.

As sessões do Conselho de Comissão de Anistia costumam ocorrer na última semana de cada mês. A próxima sessão de análise de requerimentos poderá ocorrer no fim de julho. Mas, por causa da pandemia do coronavírus, isso ainda não está confirmado.