Flagrante de atendimento a operário no momento em que ele sofreu um acidentes de trabalho.| Foto: Lineu Filho/Tribuna do Paraná

A construção civil é o quinto setor econômico em acidentes de trabalho e o segundo mais letal do país, depois do transporte rodoviário. Apenas entre os trabalhadores formais, com registro em carteira, o país teve 5,1 milhões de acidentes entre 2007 e 2013, data da última atualização do Anuário Estatístico do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A participação da construção civil no total de acidentes fatais passou de 10% para os atuais 16%, respondendo por 450 das 2.780 mortes no trabalho em 2013.

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Série Vida & Morte no Trabalho

Confira a série especial em quatro partes da Gazeta do Povo sobre acidentes de trabalho no Paraná e no Brasil.

O Paraná destoa dessa estatística graças a um comitê criado há 14 anos para combater a informalidade na construção civil em Curitiba e região metropolitana. Formado por 16 entidades ligadas a indústrias, empresários, empregados, engenheiros e poder público, o comitê percorre as obras para orientar sobre saúde, segurança do trabalho e a exigência de um responsável técnico.

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As obras mais problemáticas quanto à informalidade e riscos de acidentes são as feitas por particulares ou profissionais liberais que decidem aplicar em imóveis, diz o presidente do Sindicato da Construção Civil no Paraná, José Eugênio Gizzi. São obras pequenas, mas são muitas. Entre 2006 e 2014, o comitê visitou 10 mil construções em Curitiba e nas cidades vizinhas. Elas tinham 73,8 mil funcionários, dos quais 38,9 mil registrados e 34,9 mil informais. Destes, 9,8 mil tiveram a carteira registrada após a visita do comitê.

Esse trabalho nos canteiros de obras teve reflexos não só no índice de informalidade como também na redução dos acidentes de trabalho. Os resultados aparecem nas estatísticas da região de abrangência do comitê. Em 2012, por exemplo, o Brasil tinha 3.175.431 empregados formais na construção civil e registrou 41.111 acidentes de trabalho no setor, taxa de 1,29%. O Paraná teve um índice maior, com 1,39 acidentes para cada 100 mil trabalhadores.

Entretanto, entre as 430 construtoras associadas ao Seconci, o braço social do Sinduscon-PR, os resultados foram bem diferentes. A taxa de acidentes por 100 mil trabalhadores foi de 0,64% (tinha sido 0,85% em 2009 e caiu para 0,61% em 2014). Portanto, nas empresas associadas ao Seconci o número de acidentes por trabalhador é 56% inferior em comparação com os dados gerais do estado.

Só no ano passado, 116 mil atendimentos foram realizados na área da saúde e 7.150 trabalhadores receberam treinamento. Em parceria com o Sistema Sesi e Senai, o Sinduscon oferece uma série de cursos de capacitação e aperfeiçoamento gratuitos para os funcionários das empresas, e muitos nos próprios canteiros de obras, para que, com qualificação, o número de acidentes seja reduzido. Outros estados estão vindo ao Paraná para conhecer a iniciativa.

Para Sinduscon, terceirização é sinônimo de especialização

O projeto de terceirização da mão de obra que tramita no Senado tem dado calafrios em sindicalistas e em grande parte da classe trabalhadora. Eles veem na medida uma ameaça aos direitos trabalhistas e um aumento dos riscos de acidentes de trabalho. Do outro lado, o empresariado fala o oposto. No caso da construção civil, os empresários argumentam que a terceirização é sinônimo de especialização, de mais segurança no trabalho e de uma consequente renda maior.

Presidente do Sindicato da Construção Civil do Paraná (Sinduscon), José Eugenio Gizzi parte de um exemplo prático. Uma empresa média, por exemplo, não teria condições de manter no seu quadro de pessoal uma equipe apenas para assentar azulejos, por exemplo. Esses trabalhadores não teriam serviço durante todo o período de uma obra, e a empresa não teria condições de mantê-los empregados sem trabalhar. O mesmo se passa com um eletricista, um encanador, ou outro profissional qualquer.

Uma alternativa seria coloca-los para fazer outros serviços na obra. Aí é que começariam os problemas, segundo Gizzi. Esse profissional não vai render tanto quanto na área em que é especialista. E ainda tem o aumento dos riscos de acidentes. Quem não é assentador de azulejo, por exemplo, sempre corre um risco maior de cortar o dedo no manuseio de uma máquina de cortar cerâmica. Da mesma forma um operário não especializado estaria mais vulnerável na hora de mexer na fiação elétrica.

Na opinião do presidente do Sinduscon, a melhor alternativa seria terceirizar os diferentes setores de uma obra, numa rápida analogia com uma linha de produção industrial. No Seconci-PR, o braço social do Sinduscon, 18% das associadas são empresas terceiras. “Não é precarização do trabalho, os benefícios de convenção de trabalho são os mesmos, o sindicato é o mesmo, as obrigações das empresas são as mesmas”, diz Gizzi. E o empregado especializado, salienta Gizzi, tem um salário maior.

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Site ajuda patrão a calcular o custo do afastamento do empregado

Um acidente de trabalho impacta não só as contas da Previdência Social, que terá de indenizar os seus segurados. Mexe também com o caixa das empresas. Dependendo da atividade e do tamanho da empresa, saber gerir esses custos pode ser a diferença entre continuar no mercado ou fechar as portas. Por isso, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) tem desenvolvido ações não só para evitar acidentes nos canteiros de obras, mas também para estimar os custos acidentários.

A CBIC disponibiliza em seu site um simulador que calcula os custos de um acidente e do afastamento do empregado, mostrando o quanto a empresa poderia ter economizado com a prevenção. O objetivo é mostrar que sai mais barato investir em prevenção do que remediar depois do acidente. Para combater a informalidade nos canteiros de obras, a CBIC tem desenvolvido uma série de ações.

No Guia Contrate Certo, por exemplo, a CBIC instrui as empresas a otimizar o processo de contratação: do planejamento e seleção do empreiteiro à análise e contratação do prestador de serviços. Tão importante quanto os aspectos operacionais de uma obra são os procedimentos legais e as questões administrativas e financeiras. Uma das finalidades do material também é garantir ao empresário da construção a segurança necessária para gerir bem o negócio.

Em setembro, a CBIC vai lançar outros dois documentos do gênero: o Guia Orientativo de Segurança e o Guia Orientativo Áreas de Vivência. Ambos focam, de modo geral, na melhoria das condições de trabalho nos canteiros de obras. A CBIC entende que orientar o empresário e o trabalhador é uma maneira eficaz de se prevenir acidentes, pois ambos têm responsabilidades quando o assunto é segurança.

E a prevenção passa também pelo combate à informalidade nos canteiros de obras. Um bom exemplo de atuação eficaz no combate a esse problema está no programa Minha Casa, Minha Vida. No início do programa, nove entre dez dessas obras eram construídas na informalidade. Com a colaboração da CBIC, o cenário mudou e hoje, segundo dados da Fundação Getúlio Vargas, 400 mil trabalhadores atuam na construção desses empreendimentos com carteira assinada.