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O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello apresentou, nesta quarta-feira (24), voto favorável à constitucionalidade do decreto do presidente Jair Bolsonaro que provocou mudanças no Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes (Conanda). A manifestação do ministro diverge da do relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 622, Luís Roberto Barroso, que votou no sentido de que alguns artigos da decisão do Executivo seriam inconstitucionais.
No julgamento, que ocorre de modo virtual, cinco ministros já se manifestaram: além de Mello e Barroso, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Carmén Lúcia também votaram e acompanharam o relator. Os demais membros da Corte devem apresentar seus votos até sexta-feira (26).
A ADPF 622, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República em setembro de 2019, alega serem inconstitucionais trechos previstos no Decreto nº 10.003/2019 que, dentre outras medidas, reduz de 28 para 18 o número de integrantes do Conanda e institui processo seletivo para o preenchimento das vagas, que eram preenchidas por eleição dos pares.
O decreto foi suspenso em caráter liminar por Barroso. Com isso, os mandatos dos antigos conselheiros tinham sido restabelecidos. Mas o Conanda informou à Gazeta do Povo que desde o final de 2020, quando foram encerrados os mandatos dos representantes das entidades não governamentais que compunham o conselho, apenas os conselheiros governamentais permanecem em atuação até que haja uma definição por parte do STF quanto ao novo processo eleitoral.
Em voto sobre Conanda, Marco Aurélio defende autonomia do governo para editar decretos
Em sua manifestação, o ministro Marco Aurélio Mello alegou que o decreto presidencial é constitucional, já que parte da prerrogativa do presidente da República é editar decretos. Em sua argumentação, Mello citou o artigo 84, inciso VI, alínea “a”, da
Constituição Federal, na redação conferida pela Emenda nº 32/2001: “Compete privativamente ao Presidente da República (…) VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos”.
Mello também explicou que a legitimidade do presidente da República para editar decretos faz parte da democracia e cumpre a vontade da maioria da população manifestada pelo voto. “Significa assegurar a formação e a captação da opinião pública, para que os rumos do Estado acompanhem as manifestações da soberania popular. É a condição da própria existência. (...) A soberania popular não é, necessariamente, autora das decisões fundamentais, e sim legitimadora do papel desempenhado pelos representantes escolhidos mediante o voto em eleições periódicas, nas quais observado o sufrágio universal em processo justo e igualitário de escolha”, afirmou.
O ministro também afirmou que compete à Administração, mediante a atuação das pastas ministeriais, decidir sobre a organização dos colegiados e que a interpretação em outro sentido implicaria a supressão ou limitação das atribuições essenciais do chefe do Executivo.
“A República assenta-se no postulado da separação dos poderes, os quais devem, considerado o relacionamento recíproco, observar a independência e harmonia, predicados cuja adequada concretização pressupõe a atuação de cada qual na área reservada pela Constituição Federal – artigo 2º. Cumpre ter presente a tríplice reserva institucional, sob pena de não se alcançar patamar civilizatório aceitável”, prosseguiu Mello, divergindo do relator e julgando o pedido improcedente.
Forte carga ideológica nos conselhos impede diversidade de pensamento, aponta governo federal
A justificativa do governo ao editar o decreto que alterou diretrizes do Conanda é que o conselho em questão, a exemplo de outros, tem uma estrutura com muito poder nas mãos de poucas pessoas que não foram escolhidas pela população e que interferem fortemente nas decisões tomadas por autoridades legalmente instituídas nas eleições.
De acordo com o entendimento do governo, há forte carga ideológica em conselhos e comissões federais, que são configurados de tal forma a não permitir a entrada de representantes da sociedade civil com ideias diferentes. Uma reportagem publicada pela Gazeta do Povo mostrou as dificuldades enfrentadas pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) para reverter o viés ideológico esquerdista de conselhos com relação às políticas para direitos humanos.
Um dos exemplos mais claros disso ocorreu em função da polêmica resolução do Conanda que autorizou visitas íntimas a menores infratores em unidades socioeducativas e permitiu que casais formados entre adolescentes nessas unidades possam permanecer “no mesmo alojamento, sendo levado em conta o direito ao exercício da sexualidade, da afetividade e da convivência”.
Faziam parte do conselho em questão, até o encerramento do mandato anterior (2019-2020), representantes de diversas entidades não governamentais a exemplo da Central Única Dos Trabalhadores (CUT), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).