O documento é assinado por Fernando Pigatto, presidente do CNS, e foi homologado pela ministra da Saúde, Nísia Trindade.| Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
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Uma resolução do CNS (Conselho Nacional de Saúde) e endossada pelo Ministério da Saúde prevê a legalização do aborto e da maconha. O documento também defende que adolescentes de 14 anos de idade possam passar por tratamento hormonal para mudança de sexo.

resolução 715, aprovada por unanimidade em 20 de julho, traz “orientações estratégicas” para o Plano Plurianual e o Plano Nacional de Saúde no período de 2024 a 2027. Os dois documentos estão sendo elaborados pelo Ministério da Saúde e ainda dependem do aval do Congresso. Eles são importantes porque vão guiar as políticas públicas na área de saúde pública pelo período de quatro anos.

A aprovação do documento traz à tona o uso político de conselhos como o CNS. Embora não tenha poder legal por si só, a resolução pode servir de argumento para políticas públicas implementadas pelo Executivo ou impostas pelo Judiciário.

O documento é assinado por Fernando Zasso Pigatto, presidente do Conselho Nacional de Saúde, e foi homologado pela ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima.

Dentre os objetivos delineados na resolução, estão o de “garantir a intersetorialidade nas ações de saúde para o combate às desigualdades estruturais e históricas, com a ampliação de políticas sociais e de transferência de renda, com a legalização do aborto e a legalização da maconha no Brasil.”

O documento também defende a redução da idade mínima para transição de gênero com uso de hormônios. Hoje, por norma do Conselho Federal de Medicina, é preciso ter 16 anos para começar esse processo. A resolução do CNS pede “garantia de acesso e acompanhamento da hormonioterapia em populações de pessoas travestis e transgêneras, pesquisas, atualização dos protocolos e redução da idade de início de hormonização para 14 anos.”

O texto também fala em “garantir os direitos sexuais e os direitos reprodutivos das mulheres, meninas e pessoas que podem gestar.” Não fica claro o que o texto quer dizer quando se refere a aos direitos sexuais e reprodutivos das “meninas.” Já “pessoas que podem gestar” é o termo politicamente correto para “mulheres”, já que, nessa perspectiva ideológica, um homem (trans) pode engravidar.

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Outro ponto questionável da resolução é o que pede que terreiros de umbanda sejam considerados como equipamentos “complementares” do SUS. O documento traça como objetivo “(re)conhecer as manifestações da cultura popular dos povos tradicionais de matriz africana e as Unidades Territoriais Tradicionais de Matriz Africana (terreiros, terreiras, barracões, casas de religião, etc.) como equipamentos promotores de saúde e cura complementares do SUS.”

O tom político também aparece em comentários sobre o governo anterior, descrito como “ultraneoliberal” — em uma passagem especialmente confusa da resolução: “A lógica ultraneoliberal derrotada nas eleições de 2022, que legou freios, tanto à política macroeconômica, quanto aos instrumentos de Estado que induzem o desenvolvimento e a garantia de direitos, o Direito à Saúde, principal dever do Estado inscrito na Constituição, deve ser um dos principais instrumentos para garantir a retomada do papel e fortalecimento do Estado.”

Segundo o próprio Conselho Nacional de Saúde, o Ministério da Saúde aplaudiu a aprovação da resolução. “Vemos uma facilidade enorme desse documento incidir sobre os planos”, disse Valcler Rangel, assessor especial da ministra Nísia Trindade.

Desvio de missão 

O Conselho Nacional de Saúde nasceu praticamente junto com o Sistema Único de Saúde. O colegiado foi criado, em seu formato atual, pela lei 8.142, de 1990. Segundo a norma, o CNS “atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo.”

O CNS tem 48 membros. Metade é oriunda de entidades que (em teoria) representam usuários do SUS, enquanto 25% representam trabalhadores do setor de saúde e 25% são prestadores de serviço e gestores (inclusive empresários do ramo).

O conselho tem eleições a cada três anos. A última delas aconteceu em 2021. Na eleição, podem votar os profissionais de saúde e representantes de entidades do setor. Por sua capacidade de mobilização, sindicatos e partidos de esquerda costumam obter a maioria dos assentos.

Ainda na sua primeira gestão, o governo Lula ampliou a atuação de conselhos como o CNS e fomentou a criação de outros órgãos semelhantes na burocracia estatal.

Na última eleição, a lista de eleitores incluiu entidades que não têm qualquer relação direta com a área. Por exemplo: a União da Juventude Socialista é o braço jovem do PCdoB, mas conseguiu se cadastrar como organização eleitora na categoria "Entidades e movimentos nacionais de usuários do SUS". O mesmo vale para a Central de Movimentos Populares, a CUT (Centra Única dos Trabalhadores) e a Força Sindical.

Gazeta do Povo perguntou ao Ministério da Saúde se a pasta corrobora o conteúdo da resolução aprovada pelo CNS e recebeu resposta após a publicação desta reportagem. De acordo com o comunicado, o Ministério da Saúde “cumpre a legislação e a Constituição sobre os temas citados” e “não tem projetos de alteração das normas em vigor.”

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