A Justiça Federal vai cobrar R$ 10 milhões do ex-deputado Antônio Celso Garcia, o Tony Garcia, para pagar parte dos prejuízos dos clientes do falido Consórcio Nacional Garibaldi, que fechou as portas há 11 anos. Segundo documentos a que a reportagem da Gazeta do Povo teve acesso, o deputado foi sócio de fato da empresa, usou "laranjas" (sócios de fachada) para não aparecer no negócio e desviou parte do dinheiro dos clientes para contas de uma empresa da sua família. O golpe lesou milhares de consorciados em todo o país na década de 90.
Cerca de 4 mil consorciados estão na Justiça, na fila com outros credores (como funcionários e fisco) há cerca de 11 anos, aguardando para receber R$ 40.102.925,41 oriundos de diversas fraudes, segundo cálculos do Banco Central. Além dos que recorreram à Justiça, o número de vítimas não é revelado pelo síndico da massa falida, o advogado Odilon Queiroz.
Tony Garcia também foi condenado a seis anos de reclusão pela Justiça Federal por crime contra o sistema financeiro (gestão fraudulenta). A pena será cumprida em regime aberto, com prestação de serviços comunitários. A indenização estipulada pela Justiça R$ 10 milhões será rateada entre as vítimas da falência do Garibaldi. O valor faz parte de um acordo judicial que, se não for cumprido, implica a perda dos benefícios obtidos pelo ex-deputado por colaborar com a investigação do caso. Assim, Garcia poderia cumprir o restante da pena na Colônia Penal Agrícola, em regime semi-aberto. Em tese, ainda cabe recurso da sentença.
Multa
A decisão judicial estabelece ainda outras sanções: uma multa de 10 mil salários mínimos do valor vigente à época da falência da empresa, em 1995. Devidamente corrigidos, somam hoje cerca de R$ 3 milhões, que fazem parte do montante de R$ 10 milhões. Na prática, o valor da multa é simbólico. Ela só será paga se houver saldo do dinheiro da indenização dos consorciados.
A sentença determina ainda a perda de dois imóveis que pertenciam ao consórcio, cujo dinheiro também será usado para indenizar os clientes. Eles foram transferidos para a empresa Compton Participações, da qual é sócio um dos advogados que trabalharam na falência.
Consórcio
O Garibaldi alimentou o sonho de consumo de brasileiros de Norte a Sul do país, vendendo móveis, eletrodomésticos, motos, carros e caminhões, entre outros bens. A sua falência foi decretada no ano de 1995, restando à época apenas dívidas, móveis velhos, alguns veículos e telefones, além de "laranjas" no controle dos negócios.
Nos últimos anos, apesar de não conseguir recuperar o dinheiro das vítimas, a Justiça alcançou os sócios e dirigentes da empresa, exceto o sócio apontado como de fato: o ex-deputado Tony Garcia, em razão das suas prerrogativas parlamentares de foro privilegiado, enquanto ele estava na Assembléia Legislativa. Isso terminou quando ele perdeu a eleição para o Senado, em 2002. Segundo a sentença que o condenou, exarada pelo juiz federal Sérgio Moro, titular da Vara de Lavagem de Dinheiro de Curitiba, há provas da gestão fraudulenta no Garibaldi: Tony Garcia tinha procuração para gerir os negócios e parte do dinheiro desviado do Garibaldi foi parar na conta de empresas da sua família. A sua defesa alega que as empresas tinham emprestado dinheiro para o Garibaldi, o que não convenceu o juiz.
Acordo
O impulso para resolver o problema Garibaldi foi a prisão do político, que sempre negou qualquer envolvimento com o consórcio, mas se obrigou a fazer um acordo com a Justiça para sair da prisão. Foram 85 dias de cárcere, período que incluiu as festas de fim de ano de 2004. O acordo de colaboração com o Ministério Público, homologado pela Justiça, previa o pagamento de R$ 10 milhões para indenizar os lesados. Como garantia judicial, Garcia deu quatro conjuntos comerciais de um prédio de luxo na capital. Os imóveis pertencem à empresa da família e serão leiloados se não houver pagamento.
Segundo a decisão da Justiça Federal, Tony Garcia tem prazo de três anos para pagar os R$ 10 milhões, divididos em três parcelas: uma de R$ 5 milhões e duas de R$ 2,5 milhões, respectivamente. A primeira vence em novembro de 2007, e as demais nos anos subseqüentes. Os valores serão depositados em conta judicial.
O processo contra Tony Garcia, que resultou na indenização de R$ 10 milhões e na sua condenação por gestão fraudulenta, foi aberto a pedido do Ministério Público Federal, por suspeita de desvio de recursos arrecadados dos consorciados; desvio de recursos arrecadados dos consorciados para a empresa de parentes do político; quitações simuladas de parcelas de consórcio; contemplação irregular de consorciados; contabilidade paralela das contas bancárias; informações falsas na contabilidade; atuação como seguradora sem autorização. De acordo com a denúncia, o principal beneficiado com os golpes seria Tony Garcia, embora seu nome não apareça no contrato social do Consórcio Nacional.
O advogado Odilon Queiroz, síndico que administra a falência do Consórcio Nacional Garibaldi, não comenta o assunto. "Todas as informações estão em juízo, na 3.ª Vara da Fazenda Pública. Eu não tenho autorização para falar", disse.