Em 2013, o analista de sistemas C.R., 48 anos, financiou um apartamento na planta. A previsão de entrega era de dois anos. Na hora de retirar as chaves, ele foi informado de que a obra estava atrasada e de que o contrato assinado previa atraso de até seis meses. Insatisfeito, C.R. decidiu rescindir o contrato. Nova surpresa: soube que só reaveria 20% do que tinha pago. Agora pensa em levar o caso à Justiça.
O que é
Como o nome sugere, cláusulas abusivas são aquelas que impõem desvantagens exageradas ao consumidor nos contratos de consumo. São consideradas “desvantagens exageradas” aquelas que se mostram excessivamente onerosas para o consumidor e são incompatíveis com a boa-fé ou equidade. Quem se deparar com uma dessas cláusulas pode recorrer ao Procon ou à Justiça para solicitar a nulidade e livrar-se da obrigação prevista.
Abusos comuns
O advogado Cristiano Schmitt, da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB gaúcha, elencou os abusos mais comuns que podem surpreender o consumidor desavisado. Confira:
No banco
Cobrança de encargos extorsivos ou taxas vedadas pelo Banco Central e pelos tribunais, como a Taxa de Emissão de Carnê (TEC) ou a Taxa de Abertura de Crédito (TAC).
No plano de saúde
Negativas de cobertura de próteses e órteses vinculadas a procedimentos cirúrgicos; limitação anual de prazo de internação; índices de reajustes excessivos.
No seguro
Negativa de concessão de indenização sob o argumento não demonstrado de fraude do segurado ou diante da falta de pagamento de pequena parte do prêmio.
Na telefonia
Quando o consumidor, para acessar um produto ou serviço é obrigado a contratar outro produto ou serviço (venda casada) ou quando é obrigado a adquirir um produto que poderia ser comprado de outro fornecedor qualquer com a empresa provedora. Saiba mais aqui sobre o que pode e o que não pode ser cobrado nesse tipo de contrato.
Situações como essa são resultado de contratos que, por meio de cláusulas abusivas, deixam o consumidor desprotegido e em desvantagem na relação de consumo. “Isso acontece porque um dos contratantes não tem a mesma experiência que o outro e não se dá conta que está sendo lesado. Ou o consumidor, precisando muito de um produto ou serviço, aceita o desequilíbrio”, diz o professor da PUCRS, Cristiano Schmitt.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) define dois tipos de cláusulas abusivas: as formais, que têm a ver com a forma como a informação é escrita e repassada ao consumidor (vale para cláusulas ambíguas ou escritas de maneira confusa e para informações que só chegam ao consumidor depois que o contrato foi assinado); e as materiais, que têm a ver com o conteúdo, com o direito que violam.
Embora o CDC estabeleça que o consumidor não fica vinculado a condições contratuais sobre as quais não teve ciência prévia, de acordo com a advogada Andressa Jarletti, presidente da Comissão de Direito do Consumidor da OAB Paraná, muitas empresas não disponibilizam o contrato na hora em que o negócio está sendo firmado – pesquisas apontam que apenas 30% dos clientes recebem cópia do contrato ao qual aderiram.
Procons podem decidir se cláusulas são abusivas
Leia a matéria completa“É comum em contratos bancários. O cliente conversa com o gerente, combina as condições e assina um termo de adesão. Ao assinar, está concordando com todas as condições do contrato padrão que ainda não recebeu. O documento pode ter muitas diferenças em relação ao que foi verbalizado. Mas a Justiça pode reconhecer que ele não está vinculado a esse contrato porque não estava ciente das cláusulas”, diz Andressa.
Já as cláusulas abusivas materiais são aquelas que implicam a violação de um direito e consequente prejuízo ao consumidor. As mais recorrentes aparecem de modo a restringir ou limitar um direito do consumidor ou transferir uma obrigação do fornecedor inerente ao serviço prestado para o cliente e aparecem com frequência em contratos bancários, de planos de saúde, de seguros e de telefonia.
“Mas o consumidor tem que saber que nem toda cláusula é válida. Ao se sentir prejudicado, tem que buscar orientação”, destaca Andressa.
Fique de olho
O artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor prevê 16 cláusulas contratuais abusivas – mas vale lembrar que existem também aquelas estabelecidas em Portarias do Ministério da Justiça. De acordo com o CDC, são abusivas cláusulas que:
1. Impossibilitam, exoneram ou atenuam a responsabilização do fornecedor por vícios de produtos e serviços;
2. Implicam renúncia de direito do consumidor;
3. Subtraem do consumidor o direito de reembolso da quantia paga nas hipóteses já previstas no CDC;
4. Transferem responsabilidades do fornecedor para terceiros;
5. Estabelecem a inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor (ou seja, obrigam o consumidor a comprovar o que alega, e não mais o fornecedor a provar o contrário);
6. Determinam a utilização obrigatória de arbitragem;
7. Exigem representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;
8. Deixam ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, quando o consumidor é obrigado a concluir;
9. Permitem ao fornecedor variar o preço de maneira unilateral; (e no caso de contratos imobiliários?)
10. Autorizam o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que o consumidor possa fazer o mesmo;
11. Obrigam o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, mas não obrigam o fornecedor ao mesmo;
12. Autorizam o fornecedor a modificar o conteúdo ou a qualidade do contrato após assinatura sem consultar o consumidor;
13. Infringem ou possibilitam a violação de normas ambientais;
14. Possibilitam a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias.
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