Curitibano teme viver "novo Rio"
Em novembro, uma pesquisa exclusiva realizada pelo instituto Paraná Pesquisas para a Gazeta do Povo mostrou que o curitibano teme chegar ao estágio de violência do Rio de Janeiro, onde os traficantes têm poder bélico para derrubar helicópteros policiais.
Programas se estendem a outras cidades
Separar a fronteira de Curitiba com algumas das cidades da região metropolitana, como Colombo e Araucária, é missão impossível. Com o passar do tempo, a conurbação entre os municípios foi se construindo até chegar ao estágio atual. Por esse motivo, a questão da violência na capital não pode se dissociar do grande crescimento dos municípios vizinhos.
Ideias
Confira alguns dos projetos em vigor da Secretaria Municipal Antidrogas:
Bola Cheia
> O programa, que funciona em nove escolas de Curitiba, reúne a comunidade para incentivar a prática de esportes. A principal atividade é o futsal, seguido por vôlei e basquete. Também é possível participar de jogos de mesa, como xadrez, damas, ludo e futebol de botão. De acordo com a Secretaria Antidrogas, cerca de 1,2 mil jovens frequentam o Bola Cheia.
Rede de Colaboração Curitibana e Metropolitana
> A partir da realização de encontros com líderes comunitários, a secretaria espera criar um grupo de agentes atuantes na prevenção ao uso de entorpecentes e na disseminação da informação correta. A colaboração da comunidade também se estende por meio de denúncias e sugestões de projetos ou melhorias dos atuais programas.
Cão Amigo
> As cadelas farejadoras Shakira e Coca realizam demonstrações socioeducativas e interativas em escolas. Esses mesmos animais são usados nas operações especiais das festas rave e de outros eventos.
A Secretaria Municipal Antidrogas de Curitiba recebeu a maior elevação de orçamento da cidade para 2010: saltou de R$ 4,5 milhões para R$ 6,3 milhões aumento de 40%. Enquanto isso, seis das 16 pastas municipais tiveram cortes de gastos, entre elas estão secretarias relevantes para o município como a do Trabalho e a de Finanças. Criada em 2008, a Antidrogas já havia saído de apenas R$ 1,25 milhão de orçamento, em 2008, para os atuais R$ 4,5 milhões. Conforme o secretário municipal Antidrogas, Fernando Francischini, o orçamento maior se deve à influência das drogas na questão da violência de Curitiba e região metropolitana e à implantação da Rede de Comunidades Terapêuticas em 2010.
O novo projeto será o carro-chefe da secretaria, com previsão de gastos estimada em R$ 1 milhão. "Trata-se da primeira política pública para pagamento dos internamentos de dependentes químicos, em parceria com as igrejas, focando no tratamento do crack em crianças, adolescentes e moradores de rua", explica Francischini. Levantamento da prefeitura constatou que, das 49 comunidades terapêuticas da região da capital, apenas quatro estão de acordo com as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Quase a totalidade das instituições apresentam deficiências relacionadas à documentação, estrutura ou pessoal.
Segundo Francischini, a prefeitura conheceu projetos de outras capitais e os adaptou à realidade curitibana. A intenção é criar uma espécie de consultoria para ajudar na regularização das comunidades e na realização de obras necessárias. As reformas devem criar dez vagas em cada uma das nove regionais da capital, abrindo novas possibilidades de internamentos. "Essas comunidades estavam sucateadas, faltava metodologia de trabalho. Esses meninos que estão na rua hoje e não têm como pagar tratamento terão para onde ser levados em breve", diz o secretário. Além disso, a Antidrogas deve seguir investindo nos projetos já existentes de prevenção ao uso de drogas, como o Bola Cheia, o Papo Legal e o Cão Amigo.
A coordenadora do Núcleo de Prática Jurídica da Pontifícia Universidade Católica (PUCPR) e mestre em Gestão Urbana na área da Juventude, Jimena Aranda Oliva, considera louvável o aumento de verba voltada às políticas públicas para jovens. "Apesar de a lei determinar que a criança e o adolescente sejam prioridade absoluta, isso não é visto na maior parte dos orçamentos", diz. No ano passado, Jimena estudou, em sua dissertação, a gestão financeira de 19 capitais brasileiras. "Curitiba é uma das cidades que mais investem na juventude. Em geral, as drogas ainda não aparecem nos orçamentos municipais, apesar da dimensão do problema", avalia.
Somente o investimento, porém, não determina a eficácia das medidas. É preciso saber direcioná-las. "Em geral, criam-se políticas para crianças e adolescentes, mas falta dar atenção às famílias. Mesmo que os familiares não estejam envolvidos com drogas, eles também estão doentes", explica.
Avaliação
Desprezadas pela maior parte da sociedade muitas vezes, as iniciativas inclusivas e preventivas são consideradas o meio ideal para diminuir a violência e combater o tráfico de drogas. "O caminho é esse. Na medida em que se investe em prevenção e em comunidades terapêuticas, os resultados são satisfatórios, rompendo a ideia de que apenas a repressão funciona", analisa o coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Pedro Bodê. Apesar do avanço, o conceito repressivo segue dominante, pois responde por 80% das verbas destinadas a esse fim. "Apenas 20% ficam para pesquisa e prevenção", diz.
Mestre em Sociologia, o professor da Universidade Positivo Daniel Cardoso esclarece que, quando o Estado passa a investir em políticas públicas de prevenção e de tratamento, é porque está encarando o problema de forma coerente. "Não se deve deixar de dar atenção e suporte à polícia, mas vejo com muito otimismo essa destinação de recursos", diz. "A eficiência da medida depende, obviamente, da execução do projeto", acrescenta. Cardoso ressalta, contudo, que a questão requer maior participação da sociedade. "É preciso não apenas controlar esses gastos, mas participar. Quanto maior o envolvimento, mais sucesso terão as iniciativas."
Na prática, o que se vê é intensa participação da comunidade nos projetos que envolvem diálogo e compreensão. "O jovem tende a abraçar essas causas, na medida em que é observado como um agente de mudança, e não como um ser vitimizado ou um agente da violência", afirma a coordenadora técnica do Projeto Não-Violência, Adriana Cristina de Araújo Bini. "Mais do que criar uma cultura contrária à violência e às drogas, iniciativas desse gênero reforçam o trabalho da família e da escola, criando relações familiares mais produtivas e a referência de autoridade", afirma.
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