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As ocupações se tornaram um problema socioambiental que não diz respeito apenas a quem vive nelas. A maioria está em Áreas de Preservação Permanente | Jonathan Campos/Gazeta do Povo
As ocupações se tornaram um problema socioambiental que não diz respeito apenas a quem vive nelas. A maioria está em Áreas de Preservação Permanente| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Calçada virou a última esperança dos resistentes

As lideranças falavam em 1,5 mil famílias durante a ocupação no Fazendinha, mas o despejo obrigou a maioria a voltar para o aluguel ou casas de parentes. Cerca de 200 famílias persistiram e, menos de 24 horas após a operação da Polícia Militar, em 23 de outubro, já montavam barracas nas calçadas em frente do terreno, onde se organizam como podem. Uma secretaria, uma cozinha comunitária – para café-da-manhã, almoço e jantar – e até uma comissão de atendimento à imprensa foram criadas no acampamento improvisado.

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Um em cada 10 curitibanos vive em áreas degradantes

Um em cada dez habitantes de Curitiba vive em condições subumanas nas invasões da periferia, principalmente em Áreas de Preservação Permanente (APPs). São 240 mil pessoas, 13% da população da capital, comprimidas em ocupações irregulares sobre 12,3 milhões de metros quadrados, ou 2,85% da área total do município. Segundo diagnóstico da Companhia de Habitação Popular de Curitiba (Cohab), 38% dessas áreas ficam em locais sujeitos a inundação, 14% sob linhas de alta tensão e 2% em faixas de domínio de ferrovias. Trata-se de um problema socioambiental que não diz respeito apenas a quem vive atolado nesses banhados.

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Uma onda de ocupações de áreas públicas e privadas em Curitiba levou a Câmara Municipal a criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no início do ano passado. Seis meses, 15 sessões e 17 depoimentos depois, apontou a existência de interesses políticos e econômicos por trás das invasões. A ocupação de 16 de fevereiro de 2007, no bairro Santa Quitéria, ponto de partida da investigação, revelou bagrinhos e tubarões da especulação imobiliária. Destaque da CPI, o assessor especial do governo do estado e presidente municipal do PMDB, Doático Santos, resistiu a três convocações, mas compareceu para negar o papel de promotor de invasões.

Líder do movimento, Maria de Fátima Freitas o acusou de ter instigado a ocupação, além de ter apoiado os sem-teto da Ferrovila, em 1991. Segundo ela, Doático foi à sua casa para convocá-la a invadir a área. Disse ter ido com ele num Fusca guiado por um sujeito chamado Paulo. Ele teria prometido ajudar com alimentos e garantido que a Polícia Militar não apareceria, mas dias depois houve o despejo. Doático disse desconhecê-la, embora ela tenha fotos ao lado dele. "Não a conheço. Não sei onde mora e não tenho relação (com ela)", disse à CPI. Como homem público, diz ser fotografado ao lado de várias pessoas em eventos públicos.

A mulher se disse amiga de Doático e ligou para ele da invasão. "Ter o número do meu celular não é nenhum privilégio. É do conhecimento dos meus amigos e da torcida do Atlético", ironizou. Ele alega não haver "receituário para saber qual invasão é certa ou errada". Sobre sua popularidade entre os invasores, disse ter "orgulho de estar ao lado dos pobres que não têm onde morar". E concluiu: "Sou conhecido na causa das moradias. Quando a polícia chega a uma invasão, já dizem que são amigos do Doático. Fazer o quê?". Ele admitiu ter apoiado a ocupação da Ferrovila, mas alega ser falso o panfleto com o nome dele e do PMDB incentivando ocupações.

Doático não foi o único integrante do governo citado na CPI. O pastor Carlos Lima, assessor do governador Roberto Requião, chegou a impedir a Polícia Militar de cumprir a reintegração de posse de um terreno da Triunfaz Construções e Incorporações Ltda., no Campo Comprido. Aos policiais, disse ter um interdito proibitório ao despejo. Alegou ter ido ao local ao receber ligações de pessoas sentindo-se em perigo e devido ao abuso de poder dos policiais. Lima disse não ter participação nas invasões, só acompanha os movimentos sociais.

Especulação

Outro citado pela CPI, Gilberto Tangleika, confirmou que no meio dos necessitados da invasão no Santa Quitéria estavam infiltrados aqueles que queriam apenas especular em caso de futura regularização da área. Tangleika disse que tem casa própria e só foi na área para ajudar os invasores. Segundo o relatório da CPI, a maioria das invasões acontece em terrenos impróprios, principalmente por causa da vegetação. Ou seja, as áreas têm mata nativa ou córregos, o que impediria a ocupação. Porém, o desmatamento e o assoreamento dos córregos facilita a construção de barracos e aumenta o valor dos imóveis.

Na conclusão da CPI, a especulação pode ocorrer em ambos os lados: entre os pequenos (comercialização de lotes) e entre os grandes (organização da invasão para aumentar o preço de venda ou negociação de uma área).

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