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Crack, um plano imperfeito

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Seis meses após ter sido lançado, o Plano Nacional de Enfretamento ao Crack mobilizou até o momento apenas quatro estados, que assinaram termos de cooperação com o governo federal. O Paraná está fora da lista. Rio de Janeiro, Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Sul são os únicos que oficializaram adesão ao programa "Crack, é possível vencer".

O número de adesões representa a metade do estabelecido como meta pela União até junho deste ano. O atual plano, lançado em dezembro do ano passado, foi o segundo programa de combate à epidemia do crack lançado no país em um intervalo de dois anos. A previsão é de que sejam investidos R$ 4 bilhões até 2014, com ações estruturadas em três eixos: tratamento, prevenção e policiamento.

O plano anterior, de maio de 2010, tinha um programa baseado nos mesmos eixos, mas com uma quantia menor destinada a ações de combate à droga: R$ 400 milhões. O governo estima que a epidemia do crack atinja aproximadamente 1,5 milhão de pessoas em pelo menos 91% das cidades brasileiras.

O montante destinado aos quatro estados que já aderiram ao programa totaliza R$ 465 milhões, a ser repassado até 2014, correspondendo a 12% do valor total projetado. Para especialistas, o número é considerado aquém do necessário. "No papel, o programa é muito bom. O problema é a falta de gestão. Esse programa ainda não decolou", afirma o sociólogo Luiz Flávio Sapori, especialista em Segurança Pública e autor do livro Crack, um desafio social.

Segundo Sapori, faltam estruturas de gestão e técnica para o assunto. "O governo lançou um programa que até agora não teve resultados. Se continuar dessa forma, infelizmente será um fiasco", lamenta. Visão semelhante tem o médico psiquiatra Dagoberto Requião, diretor do Hospital Nossa Senhora da Luz, em Curitiba. Apesar do programa específico para combater o crack, ele considera que pouco se pode esperar do projeto. O fato de o governo apostar muito na cura da epidemia por meio de atendimentos em Centros de Atenção Psicossocial para atendimento 24 horas, os Caps-AD III, e em enfermarias especializadas nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS), desperta dúvidas sobre a eficácia do projeto. Segundo o governo federal, o plano prevê a criação de 3.508 novos leitos em enfermarias e 1,4 mil novas vagas em Caps-AD.

"O tratamento nesses locais [os Caps] é muito relativo. Isso é reflexo da premissa equivocada do fechamento de leitos em hospitais psiquiátricos (resultado da Lei da Reforma Psiquiátrica, de 2001). Precisaria de um espaço próprio para o internamento dos usuários", ressalta Requião.

O médico psiquiatra Flávio Falcone, especialista na área, considera que a internação não é o melhor caminho. Ele defende que ocorra a internação somente para casos de desintoxicação, em um período médio de 15 a 30 dias. "A internação por um tempo prolongado não se mostra eficiente. Temos de tratar também os outros males que a droga provoca, como os transtornos mentais. É necessário pensar em outras formas de atendimento que não seja a internação", avalia.

Falcone acredita que, apesar dos percalços, o plano poderá dar mais estrutura ao combate ao crack. "A tendência é de que com o programa tenhamos melhores condições para tratar o vício. Isso é o que a sociedade espera", diz.

Em dúvida, governo beneficia segurança pública e não a saúde

No ano passado, a área de segurança foi a mais beneficiada com recursos do plano anterior de combate ao crack – foram compradas viaturas, cartuchos de munição e armas, por exemplo, em um investimento de R$ 80 milhões. A saúde ficou com apenas R$ 78 milhões em todo o país.

Para o sociólogo Luiz Flávio Sapori, da PUC de Minas Gerais, essa inversão é um grande erro que não pode se repetir no atual plano. "Para tratar a epidemia do crack é necessário tratar em primeiro lugar a saúde. A expectativa é de que a prevenção e o tratamento sejam priorizados. A segurança não merece tanto recurso comparado com o que a saúde recebeu", ressalta.

O Ministério da Saúde informa que vai investir, até 2014, R$ 2 bilhões para implantação e ampliação dos serviços. O valor é metade do total que será investido no programa. O restante ficará à cargo da Justiça e da Educação.

De acordo com dados do governo, o Ministério da Saúde aumentou em R$ 213 milhões o teto financeiro dos 26 estados e do Distrito Federal para financiamento dos 1.793 Caps do país.

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