Parado para cuidar do coração
Há quase quatro anos aposentado, o músico e animador do baile da Terceira Idade que ocorre todas as quartas-feiras no salão do Centro de Convivência do Idoso de Foz do Iguaçu, Armando Rech, 63 anos, teve de se afastar das festas por quase dois anos, período em que precisou cuidar da saúde. "Não conseguia mais trabalhar, precisei parar por causa de problemas cardíacos", conta.
Foz do Iguaçu - O aumento no número de benefícios concedidos pela Previdência Social está diretamente ligado à baixa qualidade de vida do brasileiro e ao aumento dos casos de doenças cardíacas, diabete e câncer. O diagnóstico preocupante apresentado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chama a atenção para um fenômeno que em outros países tende a diminuir, enquanto que no Brasil as perspectivas mostram o contrário.
Baseada na análise do perfil dos aposentados por invalidez e dos que recebem auxílio-doença, a pesquisa "Qualidade de vida seus determinantes e sua influência sobre a seguridade social" revela que os problemas de saúde são os principais responsáveis pelo desequilíbrio financeiro do sistema previdenciário. Muito antes de somarem o mínimo exigido para a aposentadoria integral por tempo de serviço 420 meses (35 anos) de contribuição para homens e 360 meses (30 anos) para mulheres acabam tendo que recorrer à ajuda do governo.
Os hábitos da vida moderna e as condições de trabalho ruins estariam inflando os pedidos à Previdência Social. De 1992 a 2007, o número de auxílios-doença concedidos para pessoas com idade entre 55 e 65 anos praticamente dobrou. No mesmo período, o tempo de concessão da aposentadoria por invalidez aumentou de 12 para 16 anos, com a média de idade dos beneficiários mantendo-se em torno dos 52 anos. "Isso significa que o Estado vai gastar mais e por mais tempo", observa o economista do Ipea Milko Matijascic.
Efeito do processo de industrialização, do urbanismo, do desenvolvimento econômico, das mudanças na dieta alimentar, do aumento do consumo de tabaco e do sedentarismo, as doenças crônicas somam a cada ano mais vítimas. Em 2005, dos 35 milhões de mortos em decorrência de diabete, câncer, problemas cardiovasculares ou respiratórios, entre outros, metade eram mulheres com menos de 70 anos. Com os avanços da medicina, cresce também a sobrevida desses doentes. Porém, nem sempre mais esperança de vida significa melhor qualidade.
Alerta
O estudo leva a uma conclusão preocupante: quanto maior o registro de Doenças Relacionadas ao Trabalho (DRT), maior o número de trabalhadores incapacitados para o trabalho, maior o pagamento de benefícios ocupacionais para compensação salarial temporária, como o auxílio-doença. Quanto maior o número de auxílios-doença que migram para a aposentadoria por invalidez ou por morte, maior o peso nas contas da previdência. "Portanto, o cidadão tem baixa qualidade de vida, vive mal e a Previdência Social paga por isso", aponta a pesquisa.
A solução dependeria de um outro olhar sobre a gestão previdenciária e de uma equação que leve em conta como principal fator de mudança o estabelecimento de políticas públicas para a promoção da saúde e prevenção de doenças. Como reforça o estudo, está ocorrendo uma mudança no perfil das doenças ocupacionais. Enquanto em países como a Alemanha, Portugal e Argentina a projeção para 2030 é de queda nos índices, no Brasil a tendência é aumentar.
Matijascic concorda que há problemas gerenciais na matemática e nos mecanismos de avaliação dos benefícios concedidos pela Previdência Social. No entanto, alerta, redefinir de tempos em tempos a idade mínima para a aposentadoria não é a alternativa que trará melhores resultados. "O beneficio padrão no Brasil é a pensão por morte, com de 24,4% da conta, contra apenas 15% dos pagamentos relativos às aposentadorias por tempo de serviço." Em média, um em cada três homens não chega aos 65 anos. Entre as mulheres, é uma em cada cinco.
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