Wesley e o pai adotivo, Sebastião: sem condições de arcar com custos do tratamento| Foto: Daniel Derevecki/Gazeta do Povo

Na justiça: 243 ações em todo o Brasil

Cerca de 1,8 mil pessoas recebem remédios por meio de ordem judicial no Paraná, conforme a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). Para obter esse direito, as disputas, em geral, chegaram às instâncias superiores da Justiça, o Superior Tribunal de Justiça ou o Supremo Tribunal Federal. No caso de Wesley, foi necessário mais de um ano até a Justiça obrigar o estado a distribuir o medicamento. Delegada nacional da Associação de Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves (Afag), Regina Próspero relata a existência de 243 ações, por iniciativa da entidade ou de órgãos como os Ministérios Públicos federal e estadual, solicitando medicamentos excepcionais para as mais diversas doenças em todo o Brasil. "No início, a Afag foi montada apenas para dar apoio moral. Com o tempo e a falta de medicamentos, nosso rumo foi para o assistencialismo e a orientação jurídica", explica Regina. "Quando não conseguimos, vamos ajudando ou indicando pessoas que costumam atuar nesse sentido", acrescenta.

CARREGANDO :)

Wesley de Oliveira Xavier, 9 anos, ganhou na Justiça o direito de receber o tratamento para sua grave doença, a mucopolissacaridose tipo VI – uma enfermidade rara e progressiva. Além de superar com a família adotiva os desafios impostos pela enfermidade, Wesley enfrenta há 45 dias um problema que foge de seu controle: a falta da enzima necessária para melhorar suas condições de vida, chamada de Naglazyme (Gausofase), que deveria ser distribuída pelo governo do estado. O valor do medicamento varia conforme o peso de cada paciente (crianças, na maior parte das vezes) e, nesse caso específico, pode custar em torno de R$ 25 mil ao mês.

Adotado pelo aposentado Sebastião Duelis e sua esposa há cerca de três anos, Wesley leva, dentro de suas possibilidades, uma vida normal. Frequenta a escola com bom desempenho, acompanha as atividades de voluntariado de seu pai e costuma ser artilheiro nas peladas em que disputa. "Nós o adotamos por ser uma criança especial. Ele é muito inteligente. Ele preenche o nosso tempo e damos toda nossa atenção para ele", conta Sebastião. A visível paixão pelo menino, no entanto, desaparece ao comentar a falta do medicamento. "Não dá para explicar o descaso. Mas os políticos temem a pressão do povo, ainda mais em ano eleitoral", diz.

Publicidade

Após um ano e dois meses com o remédio, Wesley cresceu alguns centímetros e engordou, além de diminuir sintomas típicos, como a apneia do sono. Com a falta do remédio, os problemas do sono voltaram e, caso o medicamento deixe de ser usado, o garoto pode precisar de tubo de oxigênio e acompanhamento nas noites, dependendo da evolução do quadro. "A obstrução das vias aéreas já voltou. E ele também corre o risco de perder a visão, a audição e o movimento das articulações se ficar sem o remédio por muito tempo", esclarece Mara Lucia Santos, neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe. É impossível, porém, conceituar o "muito tempo", porque cada paciente apresenta reação distinta, segundo a médica.

Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) informou que o medicamento, por se tratar de uma demanda judicial, não entra na rotina de compra do órgão. A Sesa, no entanto, já notificou a Secretaria da Fazenda, que viabiliza a compra do remédio. Não existe prazo, contudo, para a normalização da distribuição.

Doença

Causada pela ausência ou insufi­ciência das enzimas responsáveis por degradar mucopolissacarídeos – substâncias parecidas com o gel, presentes nas células –, a mucopolissacaridose VI (MPSVI) é conhecida como "doença de acúmulo". Como o organismo não faz a quebra da substância, ela se acumula no cérebro, coração, olhos, fígado e nas articulações. "Mas as crianças têm inteligência normal", ressalta Mara Lucia. Outra característica comum aos portadores do tipo VI é a dificuldade para o desenvolvimento das articulações, com seu tamanho variando entre 70 centímetros a 1,40 metro.

Em geral, as crianças portadores da MPSVI moderada, caso de Wesley, vivem até os 13 ou 14 anos. "O fígado e o baço crescem muito em função do acúmulo da substância, causando, na maior parte dos casos, in­­su­­fi­ciência respiratória ou car­día­ca", explica Mara Lucia. Há, contudo, uma forma mais leve da enfermidade, permitindo vida mais longa.

Publicidade