A cada três dias uma criança ou adolescente morreu violentamente em Curitiba e região metropolitana no primeiro semestre de 2010. Ao todo, foram 60 vítimas de agressões, tiros ou facadas, segundo levantamento com base nos boletins do Instituto Médico-Legal (IML) o número representa 6% do total de homicídios no período (979 mortes). A vulnerabilidade de jovens que convivem com a criminalidade e o risco a que eles estão expostos motivaram a criação do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte no Paraná, uma espécie de "bolha de proteção".
Segundo a Secretaria de Estado da Criança e da Juventude (SECJ), que coordena o programa, o acolhimento de jovens em risco deve começar efetivamente em 60 dias. Por enquanto, profissionais de áreas ligadas à psicologia, serviço social e direito estão em processo de capacitação. O treinamento é focado na análise de casos para identificar quais as situações de ameaça que devem ser acolhidas pelo projeto, além de preparar os profissionais para atuar de forma rápida e eficaz.
Nos próximos dois meses também será articulada uma rede de serviços e locais que estarão disponíveis aos protegidos. "Precisamos passar por esse período de capacitação, envolvimento e articulação para que o programa não comece de uma maneira ingênua e passe a atender pessoas que não precisam de proteção", explica o coordenador de socioeducação da SECJ, Roberto Bassan Peixoto. "Muitas vezes é violação de direitos e não ameaça", complementa.
Em princípio, haverá vagas para até 40 crianças e adolescentes ameaçados de morte. Eles serão encaminhados ao programa por juízes ou promotores da Infância e da Juventude. Familiares dos ameaçados também poderão receber proteção. As medidas a serem adotadas variam de acordo com cada caso, podendo chegar à troca de identidade e à mudança de localidade. Por outro lado, os jovens também assumem responsabilidades. O projeto tem conexão com um programa nacional semelhante criado pelo governo federal, em vigor desde 2007. A iniciativa já se estendeu a São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Distrito Federal, Pará, Pernambuco e Alagoas.
A psicóloga Fernanda Lavarello, coordenadora da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), considera importante a iniciativa, mas diz que ela deve ser usada em situações extremas. "O programa pode dar errado se começar a acolher casos que não são de proteção à vida e é preciso ter uma rede de serviços, sobretudo públicos, que possam atender as demandas desses jovens", afirma.
Vulnerabilidade
A proximidade de crianças e adolescentes com a criminalidade faz com que estejam vulneráveis a ameaças de morte. O envolvimento com drogas seja por tráfico ou consumo é a situação mais preocupante. "Os ameaçados ou são testemunhas de crime ou são jovens que, de uma maneira ou de outra, se envolveram com grupos criminosos e não conseguem se desvencilhar disso. Se não forem protegidos pelo poder público, acabam mortos", afirma o promotor Murillo José Digiácomo, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Criança e do Adolescente do Estado do Paraná.
Fernanda aponta que a desigualdade social também é um fator que torna vulneráveis a infância e a juventude do país, mas diz que o maior problema é o ambiente hostil. "Não é a pobreza. É a grande violência a que os jovens estão expostos. O que tem aumentado não é o envolvimento do jovem com a criminalidade. É a vulnerabilidade deles. Os jovens são mais vítimas de crimes do que autores."
Para Digiácomo, a implantação de um programa de proteção trata-se de uma necessidade. Contudo, alerta ele, é mais importante que sejam adotadas políticas públicas que afastem crianças e adolescentes da violência. "Os municípios também devem estar preocupados com políticas preventivas para evitar que os jovens cheguem nesse ponto", conclui.
Interatividade
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