Ao invés de vender o terreno para uma construtora, os proprietários de áreas verdes em Curitiba conquistaram mais benefícios para manter o local preservado. A aprovação de mudanças na lei das Reservas Particulares do Patrimônio Natural Municipais (RPPNMs) aumentou as vantagens para os donos de terrenos com nascentes ou mata nativa: agora é possível conseguir um valor bem mais próximo do preço real da área, com a negociação por potencial construtivo – direito de comercializar obras maiores em espaços com restrições.
Uma decisão pelo bem coletivo
Das 15 reservas particulares de Curitiba, seis pertencem ao empresário Marcelo Santana. Elas estão todas umas ao lado das outras, no Campo Comprido, região com alto valor de venda de terrenos. Os 48,5 mil metros quadrados foram comprados há muitos anos e estavam destinados para um empreendimento imobiliário. “Mas quando fomos avaliar de perto a área, descobrimos duas nascentes e percebemos que qualquer movimentação no terreno ia influenciar nos cursos d’água”, conta.
Para manter as florestas urbanas e a permeabilidade do solo, Santana começou a buscar alternativas para conservar a área do jeito que estava. Santana comenta que é necessário cercar a área e ter cuidados constantes, com funcionários monitorando o terreno, principalmente para evitar invasões. “Ter um mato é uma coisa, ter uma área de mata nativa cuidada é outra”, resume.
Santana prefere não falar em valores, mas assegura que o negócio tem muitas vantagens. A decisão de pensar além dos lucros financeiros veio depois de uma guinada na vida de Santana. Carioca, ele morava em São Paulo e trabalhava como corretor de câmbio até descobrir um tumor na cabeça. Veio a Curitiba para ser operado, mas tinha como prognóstico apenas seis meses de vida. Isso foi há 13 anos. “As pessoas precisam pensar em ganhar um pouco menos agora para poderem viver uma vida saudável no futuro”, pondera.
Até o início do ano, o benefício do potencial era concedido ao proprietário apenas uma vez, na aprovação da reserva. Agora a vantagem pode ser renovada a cada 15 anos. Outros detalhes técnicos foram alterados com a intenção de atrair os donos de mais de mil áreas que poderiam se transformar em reservas particulares. Atualmente, a cidade tem 15 RPPNMs (totalizando 118 mil metros quadrados), mas o secretário municipal de Meio Ambiente, Renato Lima, avalia que seria viável chegar a mais de 100. Ao menos outros 15 proprietários buscaram a prefeitura interessados em iniciar o processos para criar reservas.
Para Lima, a mudança na lei, aumentando a possibilidade de retorno financeiro é uma compensação justa para quem está abrindo mão de direitos individuais em favor dos interesses coletivos.
Para Marcelo Santana, empresário do mercado imobiliário e conselheiro da Associação dos Proprietários de Áreas Verdes de Curitiba (Apave), o novo cenário torna a compensação mais próxima do valor do mercado dos terrenos. Ele conta que fez sozinho o processo que encaminhou à prefeitura para a criação da própria reserva, contratando somente os projetos técnicos, como o topográfico. Na área que mantém, pretende instalar uma clínica de terapia para a terceira idade. “Esse conceito já foi adotado em São Paulo, mas sem floresta”, diz.
Betina Bruel, consultora da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental, conta que a ONG busca contato desde 2008 com proprietários de áreas verdes para convencê-los a transformá-las em RPPNMs. Ao menos 400 seriam ótimas candidatas. “Precisa ter uma cobertura vegetal mínima. Não dá para ser um gramado embaixo de um bosque”, explica. Para ela, o projeto curitibano é inovador e pioneiro. No Paraná, somente São José dos Pinhais também tem leis sobre reservas particulares municipais, mas não que compense os proprietários com potencial construtivo.
Betina explica que tomar a decisão de criar a reserva é algo difícil, porque não tem volta. Além disso, os donos continuam responsáveis pela área. Para complicar, a pressão por parte das construtoras é grande, já que alguns donos recebem propostas milionárias.
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