Curitiba busca uma solução para a enrascada em que está metida: arrecada bem menos do que gasta com a gestão do lixo e o contrato com o aterro de Fazenda Rio Grande vence em outubro sem chance de renovação. Para tentar uma saída, e ainda voltar à vanguarda na área ambiental, a prefeitura firmou acordo com um braço do Banco Mundial, a International Finance Corporation (IFC), que apresentará proposta para remodelar o sistema de gestão de resíduos.
Cobrança
Há chances de a taxa de lixo passar a ser cobrada na fatura da Sanepar, como já acontece em 85 cidades do Paraná. É que o fato de a cobrança estar vinculada ao carnê do IPTU traz problemas para a prefeitura. A inadimplência sobre o IP|TU é de 10% e na conta de água está em 1%. Além disso, a taxa de lixo poderia passar a ser cobrada de contribuintes hoje isentos de IPTU. A transferência da cobrança para a conta de água abre uma brecha para que seja reajustada a taxa de lixo. Hoje há limitadores, como a legislação que não permite que o valor seja maior do que o cobrado de IPTU. As mudanças precisariam de aprovação de leis específicas.
Entenda o caso
Já se arrasta desde 2007 o processo burocrático que vai definir os rumos da destinação de lixo para Curitiba e região metropolitana. Como a proposta foi considerada tecnologicamente e legalmente ultrapassada, uma série de recursos judiciais impediu que a empresa vencedora da licitação, em 2009, assumisse o serviço.
Enquanto a questão era discutida morosamente na Justiça, o consórcio metropolitano decidiu suspender e depois cancelar a licitação realizada, criando a condição jurídica necessária para iniciar um novo projeto. Como nada estava resolvido – e para não deixar as cidades que formam o consórcio sem ter para onde mandar o lixo coletado –, um contrato emergencial foi firmado, destinando cerca de 90% dos resíduos produzidos pelos municípios do consórcio para um aterro localizado em Fazenda Rio Grande. Contudo, o acordo vence em outubro de 2015 e não pode ser prorrogado.
A contratação foi há um mês, ao custo de US$ 1,94 milhão (R$ 5,2 milhões na cotação de dezembro). A prefeitura pagará 25% e o restante será custeado por uma ou mais empresas escolhidas para prestar o serviço. A contratação da IFC foi feita sem licitação, por notória competência. A instituição já elaborou projetos de infraestrutura para vários países. Na área de lixo, atuou na Índia, na Faixa de Gaza e na capital sérvia Belgrado, mas com projetos menos complexos do que este a ser desenvolvido em Curitiba.
Secretário municipal de Meio Ambiente, Renato Lima diz que o projeto encomendado à IFC precisa ser sustentável tanto do ponto de vista ambiental como financeiro. O sistema deve se pagar. Hoje a cidade arrecada R$ 88,79 milhões com a taxa de lixo e gasta R$ 198 milhões com o serviço. Encontrar formas de equalizar a conta é uma missão do projeto. Lima diz não estar em busca apenas de uma solução viável economicamente. Ele espera que o novo modelo recoloque Curitiba na posição de referência ambiental.
Como hoje a gestão do lixo é feita de forma consorciada por 23 municípios da região metropolitana, as soluções da IFC devem levar em conta o sistema integrado. Um dos objetivos é reduzir o volume de lixo que vai para aterro, de 2,5 mil toneladas por dia para 500 toneladas. Primeiro, porque ao menos 30% do que é enterrado é reciclável e poderia ser aproveitado. Segundo, porque aterrar lixo é caro e o serviço é pago por tonelada. Assim, quanto menos, melhor. Há em estudo outras alternativas, como incineração e compostagem. Enterrar não é a melhor alternativa e queimar deve ser a última.
O projeto será desenvolvido em 16 meses e prevê a cada etapa apresentação de resultados das propostas, para que a prefeitura não receba um modelo sem possibilidades de alterações. O estudo deve prever o sistema de coleta de lixo convencional e reciclável, a limpeza urbana, o transporte e as opções de destinação. Uma das premissas deve ser a descentralização, evitando que combustível seja inutilmente queimado em distâncias enormes percorridas por caminhões lotados de lixo.
IFC promete modelo inovador e adaptado
Foi a International Finance Corporation (IFC) que procurou a prefeitura de Curitiba para propor um acordo e buscar uma solução para a gestão do lixo. De acordo com Mahomed Bashir, especialista de Projetos de Parceria Público-Privada (PPP) da IFC no Brasil, a capital paranaense foi escolhida porque seria uma oportunidade de desenvolver uma proposta numa cidade-modelo que depois poderia ser reproduzida em outros lugares do mundo.
Bashir comenta que o trabalho está em fase de diagnóstico. Ao total, oito pessoas trabalham diretamente com o projeto e que consultores e especialistas também foram contratados. O representante da IFC destaca que a intenção, desde o início, é desenvolver estudos que permitam a introdução do setor privado na gestão, seja no modelo de concessão, seja numa PPP. Bashir assegura que a solução apresentada em Curitiba será inovadora, eficiente e ao mesmo tempo adaptada à realidade local. A equipe estará em Curitiba durante esta semana, para visitas de campo. (KB)
Processo de escolha do novo aterro tem início neste mês. Contrato atual vence em outubro
O Consórcio Intermunicipal para Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos (Conresol), formado pelos 23 municípios que administram o lixo na Região Metropolitana de Curitiba, vai abrir em junho a fase de credenciamento para a escolha do aterro que receberá os rejeitos gerados pelos 3 milhões de moradores da região. É que o contrato com o aterro de Fazenda Rio Grande vence em outubro e não poderá ser mais renovado. Durante cinco anos, a área foi usada como saída paliativa depois do fechamento da Caximba e enquanto não se resolvia a disputa judicial sobre a licitação anterior.
O secretário municipal de Meio Ambiente, Renato Lima, alega que não foi possível chegar a uma solução antes do vencimento do contrato com o aterro de Fazenda Rio Grande. Ele afirma que a discussão na Justiça – que se arrastava desde 2007 para definir se a licitação feita deveria valer ou não – impedia que fossem tomadas medidas definitivas. Só a anulação de todo o processo, no ano passado, teria permitido o estudo de novas saídas. (KB)
Reaproveitamento real dos resíduos é uma das saídas
Há soluções possíveis e melhores, mas não há milagre para os problemas do lixo. Quem faz o alerta é o diretor-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva Filho. Ele afirma que conhece a experiência da IFC e que crê que possa sugerir uma contribuição muito positiva. Contudo, reforça que não há no mundo nenhuma cidade que tenha conseguido fazer a gestão de lixo ser completamente autossustentável.
Silva Filho também destaca a importância de adaptar os modelos estrangeiros para o cenário brasileiro. “Não adianta tentar importar soluções. Não vai funcionar”, diz. O executivo da Abrelpe concorda que a capital paranaense é a cidade ideal para testar novas saídas. “Para Curitiba, não é difícil avançar, porque já há uma situação prévia, uma boa base. Mas a verdade é que está parada no tempo há uma década”, afirma. O primeiro passo seria, na opinião de Silva Filho, efetivar um sistema de coleta separada entre lixo orgânico e seco, com real aproveitamento dos resíduos. “Há processamentos que geram energia. Ou seja, produzem algo”, comenta. (KB)
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