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Antes de passar a madrugada desta quarta-feira (30) nas dependências da Câmara dos Deputados para evitar o cumprimento de uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o deputado federal Daniel Silveira (União-RJ) prometeu que permaneceria “morando” na casa legislativa por tempo indeterminado.
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O ministro do STF determinou, na última sexta-feira (26), a instalação de tornozeleira eletrônica no parlamentar por considerar que Silveira descumpriu ordem judicial ao comparecer a um evento em São Paulo no qual teve contato com outros investigados no chamado “inquérito das milícias digitais”.
No novo despacho, o ministro também proibiu o deputado de “se ausentar da Comarca em que reside, salvo para Brasília/DF, com a finalidade de assegurar o pleno exercício do mandato parlamentar”. Caso descumpra as ordens, Silveira poderá ser preso novamente.
Diante da cobrança por parte de Moraes, nesta terça-feira (29), para a colocação imediata da tornozeleira eletrônica, o parlamentar reagiu afirmando que permaneceria na Câmara durante o tempo que fosse necessário, uma vez que não é permitido efetuar a prisão ou aplicar medidas cautelares dentro da casa legislativa. A atitude seria não somente em protesto, mas também por “garantia fundamental”. Segundo ele, sua permanência durará até que o plenário da casa delibere sobre a imposição das medidas cautelares – conforme determina o artigo 53 da Constituição Federal, que trata da imunidade parlamentar – ou o pedido de suspensão da ação penal 1.044, que tramita no Supremo e da qual Silveira é alvo.
Na tarde desta quarta, a Polícia Federal foi à Câmara para tentar cumprir a ordem de Moraes para colocar tornozeleira eletrônica em Silveira. O superintendente da PF do Distrito Federal foi pessoalmente protocolar na presidência da Casa Legislativa o pedido para cumprir a ordem dentro da Câmara. Agora, a PF depende da autorização para cumprir a medida.
Moraes determinou a prisão do deputado carioca em fevereiro do ano passado, após Silveira divulgar um vídeo com ameaças a ministros do STF. Em novembro, o ministro revogou a prisão, mas determinou uma série de medidas cautelares, como proibição a manter contato com outros investigados no inquérito, fazer publicações nas redes sociais e conceder entrevistas à imprensa.
De acordo com juristas ouvidos pela Gazeta do Povo, algumas medidas impostas constituem censura prévia e ferem os artigos 5º, 53 e 220 da Constituição, que abordam, respectivamente, a liberdade de expressão, a imunidade parlamentar e a liberdade de informação.
Daniel Silveira diz que ministro está “atropelando” o poder legislativo
Em pronunciamento na tribuna da Câmara na noite desta terça-feira (29), o parlamentar afirmou que a decisão de Moraes é ilegal e que o ministro está “atropelando o Legislativo e todas as suas prerrogativas”.
“Eu só vou sair de dentro do Parlamento, de dentro do Congresso Nacional, quando for pautada a sustação da Ação Penal 1.044. E já há dois pedidos sobre a mesa da Presidência da Casa, nos moldes do art. 53, parágrafo 3º da Constituição, totalmente cabíveis, para que a ação seja analisada em 45 dias improrrogáveis, e também para que sejam derrubadas as medidas cautelares, que são ilegais”, afirmou.
O artigo constitucional apontado por Silveira trata da imunidade parlamentar, isto é, da inviolabilidade de deputados e senadores por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. O parágrafo citado diz que “Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o STF dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação”. O ministro, entretanto, não oficiou a Câmara para que deliberasse sobre o caso.
Em coletiva de imprensa, Silveira afirmou que a ordem emitida por Moraes vai contra a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5526, julgada pelo STF em 2020 e que teve o próprio ministro Moraes como redator do acórdão. A decisão conferiu interpretação conforme a Constituição aos artigos 312 e 319 do Código de Processo Penal (CPP), estabelecendo que a aplicação das medidas cautelares impostas a parlamentares deve ser submetida à deliberação da respectiva casa legislativa em 24 horas, da mesma forma que ocorre em casos de prisão em flagrante de deputados e senadores.
“Essa ADI, a 5526, diz que o artigo 312 do CPP, que trata de prisão preventiva, não se aplica em hipótese alguma a parlamentares. E quanto ao artigo 319, que trata de medidas cautelares diversas da prisão, [diz que] se atrapalhar direta ou indiretamente, um pouquinho que seja, o livre exercício do mandato parlamentar, tem que passar pelo crivo da casa em 24 horas. Como que ele faz um ofício dizendo que não precisa notificar a casa? O que ele está fazendo com o legislativo?”, declarou o deputado.
Lira defende inviolabilidade da Câmara e pede agilidade do STF em julgamento
Pressionado por parlamentares para colocar o tema em pauta, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), divulgou uma nota à imprensa na tarde desta quarta-feira. No texto, defendeu a inviolabilidade da casa legislativa e pediu que o Supremo avalie os pedidos de Silveira o mais rápido possível.
“Decisões judiciais devem ser cumpridas, assim como a inviolabilidade da Casa do Povo deve ser preservada. Sagrada durante as sessões, ela tem também dimensão simbólica na ordem democrática. Ideal que o STF analisasse logo os pedidos do deputado Daniel Silveira e que a Justiça siga a partir desta decisão – mais ampla da nossa Corte Superior”, disse o presidente da Câmara. Lira, entretanto, não falou sobre levar o caso a plenário para apreciação dos deputados.
Na tarde desta quarta-feira, o presidente do STF, ministro Luiz Fux, marcou o julgamento da ação penal contra Daniel Silveira para o dia 20 de abril. Nesta sessão, os ministros irão decidir pela condenação ou absolvição do deputado em relação às acusações. A expectativa de Silveira é que o plenário da Câmara suspenda a ação penal antes da data do julgamento.
Defesa de Daniel Silveira protocola pedido de impeachment de Moraes
Nesta terça, o advogado Paulo César Rodrigues de Faria, responsável pela defesa de Daniel Silveira, protocolou um pedido de impeachment de Alexandre de Moraes no Senado. A defesa sustenta que o ministro é responsável por violações diversas a direitos e normas constitucionais no âmbito de inquéritos instaurados pelo próprio Supremo contra críticos dos ministros.
Sobre o caso específico de seu cliente, Faria, que assina o pedido, diz que “Moraes é suspeito para atuar no caso Daniel Silveira, uma vez que é vítima, juiz, inquisidor e quem manda prendê-lo (...) Resumindo: é vítima, acusador e juiz. Um escárnio, que viola o sistema penal acusatório vigente no Brasil”, declara.
Repercussão no Congresso
A nova investida do ministro gerou reações por parte de parlamentares da Câmara e do Senado. O senador Luiz do Carmo (MDB-GO) afirmou que discorda da forma como Daniel Silveira se manifestou em fevereiro de 2021 ao ameaçar ministros do STF, mas que é radicalmente contra a perseguição que o parlamentar está sofrendo. “Essa inconstitucionalidade tem que parar”, disse.
Já o senador Lasier Martins (Podemos-RS) declarou que, no caso em questão, “Alexandre de Moraes ultrapassa todos os limites da ilegalidade contra um deputado federal”. Outros senadores, como Jorginho Mello (PL-SC), fizeram coro às críticas ao ministro.
Deputados federais também têm se manifestado contra a alegada inconstitucionalidade nas decisões. Na terça-feira, o deputado Carlos Jordy (PL-RJ) afirmou, na tribuna da Câmara, que se trata de mais um episódio de uma “escalada de autoritarismo” promovida por ministros do STF.
“A instituição Supremo Tribunal Federal, que não deve ser confundida com seus ministros, e que deveria ser o guardião da Constituição, vem sendo utilizada para fazer ativismo político, ativismo judicial, solapando as nossas instituições”, disse Jordy.E pediu aos deputados que entrassem em obstrução das atividades parlamentares até que Lira paute o pedido de sustação da ação penal 1.044, que tramita no STF.
O deputado Coronel Tadeu (PL-SP) foi outro a pedir urgência na apreciação da casa quanto às medidas cautelares impostas a Silveira. “A imunidade parlamentar não será destruída por um simples motivo: Todos nós deputados juramos cumprir a CF. O art. 53 é mais claro que água de rocha e a ação penal do deputado Daniel Silveira precisa ser submetida ao supremo plenário da Câmara dos Deputados”, afirmou.