Dar um rolê por aí, atividade corriqueira para jovens brasileiros há décadas, atingiu um novo status neste início de 2014, tão surpreendente que dificulta sua definição. Afinal, o que são os rolezinhos de adolescentes em shoppings centers?
Até dezembro, eram basicamente uma opção de lazer, e estavam se disseminando entre jovens da periferia. Mas, devido ao grande número de jovens envolvidos, o despreparo de forças policiais e a desconfiança de lojistas, o perfil do rolê foi modificado. Desde então, muitos jovens divulgaram na internet críticas à força policial e denunciaram casos de discriminação em shoppings. Cientistas sociais também veem preconceito contra o jovem da periferia, e ressaltam que os adolescentes buscam espaço como consumidores. Alguns tecem críticas à desordem dos jovens, e fazem acusações de roubos e arrastões. Há quem celebre o "protesto político" dos jovens, o que até causou preocupações na presidente Dilma Rousseff, que pediu para sua equipe monitorar a situação.
A motivação inicial, entretanto, sempre foi o lazer e o consumo. "No shopping dá para se divertir, encontrar outras pessoas. Não há espaço nos bairros periféricos para a socialização. Quando há, geralmente é ligado a uma igreja", diz o historiador Wagner Tauscheck, coordenador técnico do Museu da Periferia, no bairro Sítio Cercado, em Curitiba. "O movimento não é politizado em seu sentido clássico, mas por outro lado é político porque os jovens buscam formas de realizar sua vontade, que é a promessa da sociedade em se tornar alguém por meio do consumo."
Professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Alexandre Barbosa Pereira também diz que o movimento ganhou uma intenção política. "A ação desmedida da polícia e uma narrativa que criminalizava esses jovens, rotulando e estigmatizando tal evento como arrastão, foi o que potencializou esses encontros e deu visibilidade a eles. De forma muito parecida, aliás, com o que aconteceu nas manifestações de junho", diz ele, que pesquisou os hobbies dos jovens de periferia para sua tese de antropologia social.
O cientista social Pedro Bodê, professor da UFPR, ressalta que os rolês ocorrem em vários locais. "Deu problema no shopping por causa da repressão. Mas isso não se deve apenas ao despreparo dos policiais, que só sabem descer o cacete. Há uma demanda da sociedade para que ajam assim", avalia.
Os dois professores consideram que há uma discriminação em relação aos jovens da periferia. "Há vídeos circulando de jovens universitários em grande grupo fazendo a maior algazarra em um shopping de São Paulo e nem por isso foram reprimidos ou criminalizados", conta Pereira. Um comentário comum na internet por esses dias é justamente o seguinte: "rolezinho de rico é flash mob, de pobre é arrastão", em referência às aglomerações de jovens marcadas via internet para fazer alguma performance.
Shoppings negam qualquer tipo de discriminação
Os principais shoppings de Curitiba afirmaram à reportagem que não há nenhum tipo de preconceito por conta de classe social ou vestimenta. Mas ressaltam que há preocupação para manter o ambiente em ordem.
"Nossos seguranças são orientados para manter um ambiente em que todos possam usufruir de momentos agradáveis", diz a gerente de marketing do Palladium, Maria Aparecida de Oliveira. "Dentro da preocupação do Shopping Mueller com a segurança, os orientadores são instruídos a monitorar qualquer comportamento que venha a tirar a ordem do mal", afirmou Daniela Baruch, superintendente do shopping.
A BR Malls, que administra três shoppings em Curitiba, enviou uma nota conjunta para os shoppings Crystal, Curitiba e Estação "Os funcionários são orientados a zelar pelo bom andamento das operações dos shoppings e pela segurança de clientes, lojistas e colaboradores."
O shopping Pátio Batel, local onde está marcado um encontro de jovens neste domingo, informou o seguinte: "A equipe de segurança preza pelo bem-estar e segurança dos clientes, funcionários e lojistas, sem distinção. A abordagem acontece caso haja alguma aglomeração ou comportamento inadequado nas dependências do shopping".
Meio-termo
Na sexta-feira, o Ministério Público de São Paulo disse que está conversando com os organizadores dos rolezinhos e as administrações dos shoppings da capital paulista para encontrar um meio-termo para o movimento. A proposta é apurar a capacidade máxima dos centros comerciais, para determinar o limite de participantes e quando os shoppings podem fechar as portas, sem discriminação. Segundo os promotores, os shoppings têm direito, por questões de segurança, de fechar as portas quando há frequentadores além da capacidade.
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