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Decisões do TSE no relatório americano da censura foram tomadas após as eleições de 2022

Das 35 decisões do TSE que foram divulgadas pelos parlamentares norte-americanos, 30 foram realizadas entre outubro de 2022 a janeiro de 2023. As outras cinco ordens restantes foram tomadas entre fevereiro e novembro de 2023. (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil | Edição: Gazeta do Povo)

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As decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para derrubar perfis, contas e publicações nas redes sociais tiveram o objetivo de prevenir ondas de críticas contra o sistema eleitoral e controlar os ânimos políticos após as eleições de 2022, segundo cientistas políticos ouvidos pela Gazeta do Povo. Todas as decisões do TSE, que constam no relatório divulgado pela Câmara dos Estados Unidos, foram tomadas a partir do dia 31 de outubro de 2022, data posterior ao segundo turno das eleições que elegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Das 35 decisões do TSE que foram divulgadas pelos parlamentares norte-americanos, 30 foram realizadas de 31 de outubro de 2022 a janeiro de 2023. O período foi marcado por uma intensa movimentação nas redes sociais, especialmente entre representantes da direita, que levantavam diversos questionamentos sobre o funcionamento do sistema eleitoral. As outras cinco ordens restantes foram tomadas entre fevereiro e novembro de 2023.

“Tenho forte desconfiança de que o objetivo da ‘juristocracia’ era este mesmo: prevenir uma onda de protestos não só contra o resultado da eleição, mas, sobretudo, contra a falta de transparência no processo de apuração dos votos, calando os influenciadores mais eloquentes e, portanto, ‘mais perigosos’”, avalia Paulo Kramer, doutor em Ciência Política.

Os deputados federais Carla Zambelli (PL-SP), Marcel Van Hattem (Novo-RS), Gustavo Gayer (PL-GO) – à época eleito, sem diplomação –, e o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foram alguns dos alvos diretos do órgão. Perfis de cidadãos comuns também foram suspensos por publicações de mensagens que criticavam a transparência das urnas, apontavam possíveis fraudes do sistema eleitoral ou defendiam intervenção militar. Algumas publicações suspensas possuíam outras abordagens e ofendiam os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ou propagavam notícias falsas como a de que uma TV americana teria anunciado que o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, estaria envolvido em fraude das eleições brasileiras.

“A eleição se estendeu para depois da votação. Vamos lembrar que houve um período de comoção grande entre os eleitores do ex-presidente Bolsonaro que se concentraram nos quartéis, com pedidos de intervenção, por exemplo. De fato, a autoridade eleitoral pode ter atuado na tentativa de fazer uma descompressão política desse movimento que teve apoio por uma parte dos eleitores de Bolsonaro”, afirma Leonardo Barreto, PhD em Ciência Política pela UnB.

Resultados da atuação do TSE estão mais claros agora, afirma cientista político

Para Barreto, só agora os resultados da atuação do TSE estão mais claros. “Eu entendo que mesmo as forças políticas que naquele momento deram suporte para a atuação do Alexandre Moraes, neste momento estão retirando esse suporte. Porque sabem que ontem esse arcabouço serviu para limitar uma parte do espectro político, mas lá na frente pode ser usada para limitar uma outra parte”, explica.

O cientista acrescenta que veículos de imprensa também têm mudado de posicionamento em relação às ordens do ministro do STF e presidente do TSE, Alexandre de Moraes. A Gazeta do Povo registrou essa movimentação ao analisar como a Folha de São Paulo e O Estado de S. Paulo publicaram editoriais mais contundentes que condenavam os ataques à liberdade de expressão promovidos por Moraes.

“Nenhuma democracia digna deste nome poderia interditar ou censurar o debate sobre o mecanismo eletrônico de votação popular, mesmo porque toda e qualquer política pública só pode ser aperfeiçoada graças às críticas que recebe”, reiterou Kramer.

Para ele, é “fundamental que a Justiça Eleitoral busque tornar o sistema mais transparente e acessível à compreensão de todos os cidadãos, de maneira a não deixar no ar qualquer dúvida sobre a lisura do processo”, ainda mais diante do ambiente político polarizado em que o Brasil se encontra hoje.

TSE se apoiou em resolução criada pelo próprio órgão para limitar liberdade de expressão

Faltando 10 dias para o segundo turno das eleições de 2022, o TSE criou uma resolução que dava ao próprio órgão o poder de polícia para a suspensão de perfis e conteúdos nas redes sociais ao considerar que provocam “desordem informacional”.

Por meio da resolução, o Tribunal não precisaria sequer ser provocado pelo Ministério Público ou por terceiros para agir na derrubada de contas ou publicações. Grande parte das decisões que constam no relatório da Câmara dos Estados Unidos se apoia em artigos dessa resolução para justificar a determinação.

“Do ponto de vista das liberdades e das garantias, o TSE passou a definir, por meio de uma resolução, pessoas que não poderiam falar mais sobre aquele ponto. E me parece que foi com o objetivo de defender a democracia que se criou limites à liberdade de expressão de uma parcela da sociedade”, conclui Barreto.

Decisões do TSE seguem o mesmo padrão: levantamento da ANEED e justificativa baseado em sites checadores

No geral, as ordens do TSE seguiam um mesmo padrão. A Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (ANEED) do próprio TSE apontava quais publicações deveriam ser retiradas e se apoiava em páginas de checadores de informações ou sites de notícias para justificar a suspensão dos conteúdos.

Uma das determinações derrubou conteúdos de 17 perfis diferentes, entre eles o Canal Hipócritas, e seguiu exatamente o padrão. “Trata-se de procedimento iniciado a partir de informação encaminhada pela Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação, que detectou, nesta data, a replicação de vídeos de uma live sensacionalista, realizada na data de 4 de novembro nas plataformas Twitch e Youtube, com a apresentação de acusações vagas e sem provas, que atingem a integridade e a normalidade do processo eleitoral, incentivando, com base em falsas afirmações de fraude, a recusa dos resultados e, eventualmente, uma ruptura institucional”, afirma o documento. Em seguida, apontam que os dados foram distorcidos. “Conforme matéria publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, baseia-se em um ‘dossiê apócrifo [...] repleto de informações falsas’”.

A ordem que derrubou um vídeo do deputado Marcel Van Hattem sequer consta o que, de fato, foi dito pelo parlamentar que justificaria a retirada do conteúdo. Nos atos divulgados, há apenas imagens de captura do vídeo e os links que não funcionam mais. Também com o parecer da ANEED, foi relatado apenas que as manifestações públicas do parlamentar “atingem a integridade e a normalidade do processo eleitoral, incentivando a realização e captação ilícita de sufrágio por coação e do crime de coação eleitoral”.

"Sem a transparência nas eleições, corremos o risco de fazer o país regredir quase um século, lembrando que uma das principais causas da Revolução de 1930 foi o crescente inconformismo da opinião pública com a falta de transparência, raiz de todas as fraudes cometidas pelos donos do poder da chamada 'República Velha'", reitera Kramer.

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