Dois meses antes de ser preso sob acusação de comandar uma rede de corrupção na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos de Curitiba, o delegado Luís Carlos de Oliveira tentou negociar com o alto escalão do governo estadual sua permanência à frente da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio.
Ele acionou o agora secretário estadual de Cerimonial e Relações Internacionais, Ezequias Moreira, que ficou conhecido pelo caso da "sogra fantasma" (leia mais nesta página). Em escuta telefônica autorizada pela Justiça, divulgada pela RPCTV, Oliveira pede que Ezequias fale com o "chefe" para continuar à frente da Divisão. A identidade do "chefe" não é revelada na gravação.
A conversa aconteceu em fevereiro deste ano. Em abril estourou a Operação Vortex, que mostrava policiais suspeitos de cobrar propina para liberar o comércio de peças de carros roubados. Na época, três policiais foram presos. A investigação foi realizada pelo Grupo Especial de Atuação no Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
Denúncias
Quatro delegados e 16 policiais civis de Curitiba foram denunciados à Justiça na semana passada. As investigações indicaram que a quadrilha foi articulada por Oliveira. Ele nomeava para atuar na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos apenas delegados que aderissem ao esquema. Também foram denunciados os delegados Marco Antonio de Góes Alves, Anderson Ormeni Franco e Gérson Alves Machado.
O Gaeco apurou que o grupo se valia da estrutura desta seção para cobrar propinas mensais que variavam de R$ 250 a R$ 1 mil de comerciantes para não vistoriar as lojas ou para avisá-los previamente das fiscalizações. Os policiais ainda exigiam dinheiro para emitir alvarás de vistoria. A quadrilha também cobrava R$ 50 mil para não prender suspeitos.
Segundo os promotores, com parte do dinheiro arrecadado, Oliveira comprava dólares a fim de "dissimular a origem ilícita" dos valores. Na Operação Vortex, US$ 98 mil em espécie foram encontrados na casa do delegado. Além disso, o "caderno de contabilidade" do grupo indicaria que os policiais chegaram a levantar R$ 27,4 mil em menos de um mês.
Governo nega interferência de Ezequias
O governador Beto Richa foi procurado pela Gazeta do Povo, mas a assessoria de imprensa do Palácio Iguaçu informou que ele não comentaria o caso. Em entrevista concedida ontem à RPCTV, quando foi questionado se Ezequias Moreira havia tentado interceder para manter o delegado Luís Carlos de Oliveira no cargo, Richa disse: "Eu não me lembro, são 4 mil servidores. O importante é o seguinte: nosso governo não tem compromisso com o erro." Ezequias não foi encontrado para esclarecer se tentou intermediar a permanência do delegado na Divisão de Crimes Contra o Patrimônio.
O ex-delegado-chefe da Polícia Civil, Marcos Vinícius Michelotto, disse que não recebeu nenhum pedido de Ezequias para manter Oliveira no cargo. Sobre os motivos que levariam o delegado a acreditar, dois meses antes da operação em que foi preso, que deixaria o cargo, Michelotto avalia que Oliveira já estaria preocupado com a permanência em função da insatisfação do comando da polícia com os índices de criminalidade na Divisão de Crimes Contra o Patrimônio. O secretário estadual de Segurança Pública, Cid Vasques, também nega que tenha sido procurado por Ezequias. "Não recebi nenhum tipo de pedido ou alguma intervenção", afirma.
Defesa
O advogado Marco Antônio José Sadeck, que representa o delegado Luís Carlos de Oliveira, alega que não há nada que comprove a participação de Oliveira no esquema denunciado. Em relação ao pedido para que Ezequias intermediasse para que o delegado fosse mantido na Divisão de Crimes Contra o Patrimônio, o advogado disse que não sabe se o telefonema ocorreu. "Se houve, eu não consigo vislumbrar nada que tipifique algum crime. Isso, me parece, é algo que se atém à política regional". Por meio de sua secretária, Luís Carlos Oliveira informou que só vai se manifestar em juízo.