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“O governo tem demonstrado pouca liderança na questão do aquecimento global e tem tolerado, para não dizer encorajado, o desmatamento da Amazônia” | Divulgação
“O governo tem demonstrado pouca liderança na questão do aquecimento global e tem tolerado, para não dizer encorajado, o desmatamento da Amazônia”| Foto: Divulgação

Perfil - Quem é Jim Garrison

O escritor e historiador norte-americano Jim Garrison fundou o State of The World Forum em 1995, ao lado do ex-presidente da extinta União Soviética, Mikhail Gorbachev. Hoje ele é presidente da entidade, cuja objetivo principal é criar uma rede de liderança global para resolver os principais problemas que afetam o planeta, entre eles o aquecimento global.

Nascido na China e criado em Taiwan, Garrison se formou em História Mundial pela Universidade de Santa Clara, nos Estados Unidos em 1973. É mestre em História da Religião pela Universidade Harvard (EUA) e PhD em Teologia Filosófica pela Universidade de Cambridge (Inglaterra). Tem mais de oito livros publicados, entre eles Civilização e a Transformação do Poder (2000) e A América como Império: Poder Velho ou Líder Global? (2004).

Mobilizar os líderes de todos os níveis da sociedade e em todas as partes do mundo para guiar a hu­­manidade para um futuro mais sustentável e, assim, salvar o planeta. Esse é a missão do State of the World Forum (Fórum do Estado do Mundo), criado em 1995 pelo es­­cri­­tor e historiador norte-americano Jim Garrison, que veio ao Brasil em agosto para lançar uma campanha mundial contra o aquecimento global. O objetivo do movimento é convencer governos e empresários a diminuir drasticamente as emissões de carbono até 2020, e não até 2050, como o proposto pelo Proto­colo de Cope­nha­gue. A campanha foi lançada em uma conferência realizada em Be­­lo Horizonte. O estado de Minas Ge­­­rais é considerado modelo por gerar 92% da sua eletricidade a partir de fontes limpas. O Fórum também lançou o movimento Brasil 2020 de Liderança Climática e, em Curitiba, o Youth 2020, uma iniciativa da Universidade da Ex­­periência para também envolver os jovens na luta contra o aquecimento global.

Em entrevista à Gazeta do Po­­vo, Garrison fala sobre a importância do Brasil como líder climático e as mudanças que precisam ser feitas com urgência para tornar o mundo mais sustentável.

Por que o Brasil foi escolhido pa­­ra lançar a campanha?

O país está desempenhando um papel único em nossa mobilização global. O índice de uso do etanol pela população brasileira é a maior do mundo. Mais de 50% da energia produzida pelo Brasil vem de fontes renováveis, em comparação a 12% produzida pela Euro­pa e 10% pelos Estados Unidos. O Brasil não é um país pequeno, obscuro nem de pouco impacto. É um dos maiores países do mundo e favorecido por recursos naturais muito ricos. A sua demografia é muito similar à da população mundial, está em paz com todos os seus vizinhos, seus bancos e sua economia e, apesar de ter sido afetado pela crise econômica mundial, está relativamente estável e forte. Além disso, a Amazônia pertence a ele.

Mas o país também tem cometido muitos erros...

É verdade. O governo tem demonstrado pouca liderança na questão do aquecimento global e tem tolerado, para não dizer encorajado, o desmatamento da Amazônia. Temos percebido, porém, que parcelas significativas da sociedade brasileira estão acordando para o problema, entre eles políticos, empresários e setores da sociedade civil, que entendem a urgência e estão dispostos a tomar uma iniciativa. Todas estas razões fazem do Brasil a nação ideal para tomar a frente em uma hora crítica como a que enfrentamos.

Como é que o Brasil pode deter o aquecimento global? Quais deveriam ser as nossas prioridades?

O Brasil pode liderar a luta contra o aquecimento global no mundo acabando com o des­­ma­­­tamento da Ama­­­­zô­­nia e cortando as suas emissões de gás carbônico (CO2) em 70%. Atualmente, o Brasil é o 5.º maior po­­lui­­dor de carbono do mundo por causa do desmatamento. Uma árvore tem a capacidade de isolar uma tonelada de CO2 durante um período de 40 anos, o que faz com que as árvores sejam fundamentais em qualquer tentativa de acabar com o aquecimento global. Quan­to mais árvores existirem, mais CO2 será absorvido e menos a temperatura do globo subirá. Muitos cientistas afirmam que a ação mais eficaz que podemos realizar a curto prazo é plan­­­­­tar árvores, milhões delas.

Qual o impacto do desmatamento da Amazônia para o mundo?

Cerca de 20% da Amazônia já foi derrubada, o que é muito grave, pois é uma região muito vasta. Se fosse um país, seria o nono maior do mundo. A região produz 20% do suprimento de oxigênio do planeta. Por isso, muitos se referem à floresta como os "pulmões do mun­­do". A bacia da Amazônia tam­­bém conta com 20% da água doce do mundo. Imagens de satélite indicam que a velocidade do desmatamento na Amazônia tem aumentado. Em algumas áreas, aumentou 50% desde o ano passado. E, com 23 milhões de pessoas e 70 milhões de cabeças de gado habitando a região, o que representa um aumento de 600% nos últimos 60 anos, mais árvores estão sendo cortadas para dar lugar às fazendas. Este desmatamento tem transformado a Ama­­zônia em "ground zero" do aquecimento global. Se o problema progredir, a Amazônia, que antes tinha capacidade de absorver CO2, pode se transformar em um emissor do gás. O que, aliás, já acon­­teceu durante a seca de 2005. A Amazônia, ao invés de absorver 2 bilhões de toneladas de CO2, produziu 3 bilhões do gás. O que mais revolta é que o desmatamento da Amazônia é tão desnecessário quanto trágico porque o Brasil não precisa da floresta para desenvolver a sua agricultura. Conta com mais terra cultivável sem uso do que qualquer outra nação da Terra. Atualmente, cerca de 40% do solo do país próprio para plantio não está sendo cultivado.

O que já foi feito no Brasil e em outros países contra o aquecimento global?

O Brasil e a maioria dos demais países têm falado mais do que agido, motivo pela qual o Acordo de Quioto e as negociações em Cope­nhague não estão indo bem. O posicionamento de todos é de não tomar nenhuma providência, ao invés de se unir para de fato resolver o problema. A minha preocupação com Copenhague, entretanto, é o que aconteceria se o acor­­do fosse bem sucedido. Essen­­cial­men­­te, o protocolo determina uma redução de 80% de CO2 até 2050. No entanto, mesmo que os governos obedecessem esse prazo, as ações tomadas seriam irrelevantes. Um recente estudo realizado pe­­la Instituto Tecnológico de Mas­­sa­­chusetts (MIT) afirma que, mesmo se todos os governos cumprirem as suas promessas, ainda al­­cançaremos mais de 600 ppm de CO2, o que elevará a temperatura do planeta em 4ºC. Uma elevação desse nível seria desastrosa. Tería­­mos reduções dramáticas de disponibilidade de água em todo o mundo. As produções agrícolas declinariam radicalmente e o mundo enfrentaria uma carência de alimentos. Aproximadamente 20 a 50% de todas as espécies animais e vegetais seriam extintas. No Brasil, o aumento da temperatura global fará com que os furacões se tornem comuns na costa brasileira. O mar invadirá o litoral e o interior vai secar. Haveria uma perda de até 85% da floresta amazônica. O efeito disso no resto do país é difícil de mensurar, mas no mínimo, causaria a pior crise da história do país.

O que ainda precisa ser feito? Conseguiremos fazer tudo o que é necessário até o fim de 2020?

O primeiro passo é convencer os governantes e empresários a buscar caminhos viáveis para reduzir as emissões de carbono em 80% até 2020 e não até 2050. Cada comunidade, cidade, região e país terá diferentes desafios e obstáculos. A liderança climática terá muitos caminhos, muitas formas e muitos resultados. O Fórum, entretanto, sugere algumas medidas que podem servir como pontos de partida, entre elas: a redução da de­­pendência em combustíveis fósseis, a implementação de eficiência energética, a criação de tecnologias limpas, o desenvolvimento de energias renováveis, a limpeza de sistemas naturais, a criação de estilos de vida mais sustentáveis e o estabelecimento de uma cultura de crescimento sustentável.

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