Estaca colocada pela Infraero na Vila Nova Costeira delimita a área que será desapropriada no futuro| Foto: Fotos: Henry Milleo/ Gazeta do Povo

Comunidade tenta garantir direito ignorado

A Vila Nova Costeira é apenas uma das áreas que será afetada pela ampliação do aeroporto. Ainda não há uma definição da poligonal que será desapropriada, mas a área é grande e abrange milhares de famílias e indústrias. A situação desses moradores é mais frágil porque não possuem documentos de posse da propriedade, o que já configura uma violação ao direito à moradia.

"Todas as comunidades afetadas estão regularizadas, menos a Nova Costeira. Ainda tem indústrias e a área teve uma valorização imobiliária, o que encarece a desapropriação", explica o advogado Leandro Franklin Gorsdorf, coordenador do Núcleo de Prática Jurídica da Universidade Federal do Paraná, que presta assessoria para as famílias.

No caso da Nova Costeira, Gorsdorf explica que a principal reivindicação é a segurança da legalidade da posse, uma garantia tanto para quem sairá quanto para quem ficará na região. Para isso, as famílias estão tentando negociar com a prefeitura um pedido de posse por meio do Cuem, como é conhecido o instrumento para concessão de uso especial para fins de moradia, um tipo de usucapião de terra pública. A lógica é de que como o município não usou o terreno e permitiu a instalação da comunidade, que está no local há mais de 20 anos, eles têm a posse da terra. "O objetivo é garantir um título igual para todos terem o direito de negociar", explica.

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Direito

Desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a moradia adequada foi reconhecida como direito aceito e aplicável em todo o mundo. Isso quer dizer que todo cidadão deve ter a segurança da posse, disponibilidade de estrutura de serviços públicos e oportunidades de desenvolvimento, custo acessível para aquisição do imóvel, condições de habitabilidade e adequação cultural.

Dona Leduvina, 82 anos, mora há 18 na Nova Costeira:

Logo que mudou para a Vila Nova Costeira, em São José dos Pinhais (Grande Curitiba), no início dos anos de 1990, Roseli Reinaldi, 53 anos, lembra que o lugar era um barreiro só. Para chegar até o ponto de ônibus, era preciso levar um sapato reserva ou andar com sacolas nos pés. Depois de 20 anos, a vila é bem estruturada: casas de alvenaria, antipó e calçada com meio-fio.

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Tudo isso, conquistado com as mãos dos próprios moradores, está ameaçado. A ampliação do Aeroporto Internacional Afonso Pena, que terá uma terceira pista, vai exigir a desapropriação de muitas áreas no entorno. Sem a posse dos terrenos, os moradores da Nova Costeira não têm segurança de que receberão indenização ou serão realocados em outro bairro. Há dois anos, cerca de 300 famílias convivem com a incerteza sobre quando e se deverão deixar suas casas.

"Na época que a gente veio para cá, tínhamos saúde para começar tudo do zero. Agora não temos mais", diz Roseli. Ela assentou os tijolos para construir a própria casa, mas foi aposentada por invalidez depois de uma cirurgia na coluna que deixou sequelas.

Quando a Vila Nova Costeira começou a ser ocupada, há mais de 20 anos, o lugar era cheio de mato e barro. Os moradores receberam uma autorização precária da prefeitura para ocupar o terreno em outubro de 1992, com um prazo de três meses para construírem ao menos o alicerce das casas. Para lá foram mandadas algumas famílias que estavam na fila por uma casa popular, outras que foram retiradas de uma área de risco para a construção de um canal extravasor do Rio Ressaca e um terceiro grupo que invadiu parte do terreno.

A promessa era de que em cinco anos eles receberiam a posse do terreno. O documento nunca chegou, mas as contas de luz e água vêm todo mês, religiosamente. Mas não é toda correspondência que chega na Nova Costeira. "Antes o correio vinha, mas agora que trocaram o nome da rua é uma confusão", conta a zeladora Maria das Dores Soares de Mello Cardoso, 60 anos, uma das primeiras moradoras da vila.

Apagão postal

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As ruas, antes chamadas apenas por letras que vão do "A" ao "G", ganharam nomes pomposos, que são solenemente ignorados pelos moradores. O problema é que alguns desses nomes já batizam vias de outro bairro de São José dos Pinhais, o que causa esse apagão postal. O isolamento oficial a que são submetidos os moradores causa revolta. "Se dissessem que a gente teria de pagar, nós pagávamos. Mas deixaram a gente jogado aqui e agora dizem que não tem nada a ver com isso", argumenta Maria, que era funcionária da prefeitura quando recebeu a orientação de ir morar no local.

Com destino incerto, os moradores lamentam a possibilidade de mudança. "Penso que se a gente sair daqui vai desnortear tudo", diz Leduvina Maria Zanardi Mascarello, 82 anos, que mora no local há 18 anos.

Indefinição do projeto atrasa planejamento

Enquanto não se conclui o projeto de construção da terceira pista do Afonso Pena, que é responsabilidade da Infraero, todos os outros agentes envolvidos na obra estão de mãos atadas. Uma empresa, a IQS Engenharia, foi contratada para fazer esse estudo preliminar e deve entregá-lo em dezembro. Só após a conclusão dessa etapa será possível estimar o custo total da obra. Na sequência será lançado o edital dos projetos básicos e executivo, cuja contratação está condicionada à obtenção da licença ambiental e à publicação do decreto de desapropriação das áreas. A obras só começam depois de tudo isso.

A Secretaria da Infraes­­trutura e Logística do Paraná deve ficar responsável pelas desapropriações, enquanto a prefeitura de São José dos Pinhais vai indicar locais com estrutura apta para receber essas famílias que serão retiradas do local. Em nota, a secretaria informa que aguarda a formalização de um convênio que estabeleça as responsabilidades de cada ente público envolvido na ampliação e quer uma posição definitiva sobre a área que será desapropriada e a fonte de recursos que vai custear esse processo.

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Em 2011, o governo do estado emitiu um decreto que desapropriava uma área de 751,5 mil metros quadrados. O problema é que há indícios de que será necessário desocupar uma área maior e, nesse caso, o Estado terá de refazer todo o trabalho de análise do local. Além disso, as desapropriações devem custar mais, tanto quanto a obra em si.

O secretário de Urbanismo de São José dos Pinhais, Marcelo Ferraz Cesar, explica que o município já fez a projeção de cenários, mas precisa da confirmação do projeto para poder agir. "A gente tem uma expectativa junto à população, então é importante que se consolide logo para resolver os problemas habitacionais e de mobilidade", diz.