Reforma agrária
Violência não arrefeceu, diz especialista
O conflito no campo, apesar do baixo número de ocupações de fazendas, não arrefeceu, na opinião de especialistas. Para Fernando Prioste, assessor jurídico da organização Terra de Direitos, enquanto existirem pessoas acampadas em áreas à espera de reforma agrária, a tensão permanece. Prioste também argumenta que a disputa pela terra incorporou novos protagonistas, como os quilombolas, ribeirinhos, faxinalenses e indígenas.
A existência de milícias armadas no campo, a criminalização de movimentos sociais, com base em uma repressão forte, e o programa Bolsa Família teriam, na opinião do assessor jurídico, afastado pessoas da luta pela terra. "A pessoa se mantém na cidade e fica menos desafiada a lutar pelo direito de terra", avalia.
O presidente nacional da Comissão Pastoral da Terra, dom Ladislau Biernaski, bispo de São José dos Pinhais, reconhece que no Paraná a tensão diminuiu, mas diz que o conflito agrário ainda é intenso especialmente nas regiões Norte e Nordeste. "Continua muito preocupante", reforça. O coordenador da Comissão de Política Fundiária da Federação de Agricultura do Estado do Paraná, Tarcísio Barbosa de Souza, admite que o ano de 2011 está particularmente tranquilo. Ele avalia que a política de "tolerância zero" contra invasões de fazendas está tendo efeito e lamenta apenas a demora em cumprir as decisões judiciais de reintegração de posse ainda pendentes.
Fatores
Uma série de fatores está relacionada à diminuição do conflito no campo:
Compra de terra
Com a estratégia do governo federal, que priorizou a compra de fazendas para a reforma agrária, e a medida provisória que impede a desapropriação de áreas invadidas, tornou-se menos "interessante" ocupar áreas.
Economia
A situação econômica ajudou, com mais ofertas de empregos na cidade e os repasses mensais do programa Bolsa Família.
Assentados
A mudança no foco da luta agrária, que busca muito mais investimentos nos assentamentos já criados.
Menos gente
Há uma década, o número de famílias em acampamentos era de 15 mil. Atualmente, são 6 mil. Milhares de famílias conseguiram um lote de terra e a demanda reprimida diminuiu.
As invasões de terra estão em queda no Paraná e no Brasil. No primeiro semestre deste ano, somente uma propriedade rural foi ocupada no estado é o menor índice dos últimos nove anos. No quadro nacional, os meses de março, maio e junho de 2011 registraram o menor número de ocupações desde 1995, quando o acompanhamento dos casos começou a ser feito pela Ouvidoria Agrária Nacional. A estratégia de comprar fazendas ao invés de desapropriá-las; a priorização de recursos para assentamentos já existentes; e a diminuição no número de famílias em acampamentos estão entre os principais motivos da redução do conflito agrário.
A única ocupação do ano ocorreu no município de Alvorada do Sul, que fica no extremo norte do Paraná. Em março, 30 famílias que já haviam invadido a Fazenda Palheta em 2009 voltaram a entrar na área de manhã, mas saíram no mesmo dia. Integrantes da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (Contag), eles fizeram 25 reféns entre os funcionários e cinco militantes acabaram presos.
Atualmente, o Paraná tem 113 acampamentos e 72 fazendas ocupadas com pedidos de reintegração de posse destas, 59 estão em processo de negociação para compra da área pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
O superintendente do Incra no Paraná, Nilton Bezerra Guedes, destaca que a tensão no campo em 2002, quando também aconteceu apenas uma ocupação de terra no Paraná, era bem maior. Naquele ano, conta ele, o número de áreas invadidas e de famílias em acampamentos era, no mínimo, o dobro do existente hoje.
Nos últimos oito anos, o número de famílias que conseguiram um lote do Incra no estado caiu para menos da metade em relação aos oito anos anteriores 4,2 mil contra 10,5 mil, enquanto houve crescimento na quantidade de famílias assentadas no Brasil. Mesmo com a redução na destinação de áreas no Paraná, milhares de pessoas conseguiram terras no período.
Para Guedes, há a percepção tanto pelos integrantes de movimentos sociais como pelos fazendeiros de que os governos federal e estadual buscam a solução dos problemas por meio do entendimento entre as partes. "O diálogo está ligado à paz no campo", acredita. Neste ano, o governo do estado instituiu um cargo de assessor especial para assuntos fundiários, ocupado por Hamilton Serighelli. "Não tratamos quem briga pela terra como uma questão de polícia, mas também não aceitamos invasão nem agressão", resume o assessor.
Marco
Um marco na redução dos casos de invasões de terra foi a medida provisória editada pelo governo federal em 2001, proibindo a desapropriação de fazendas invadidas. "Ao invés de ocupar áreas, os movimentos sociais passaram a indicar ao Incra fazendas que deviam ser vistoriadas", conta o superintendente. Outro motivo que teria aliviado a tensão no campo é que a maioria dos acampados não está mais em beira de rodovias, mas em fazendas, esperando a negociação da área. Com mais espaço e infraestrutura do que teriam em barracos à margem da estrada, os sem-terra conseguem suportar a espera.
Hoje a luta não é só por terra, mas por estrada, escola e fomento agrícola nas áreas que já foram conquistadas. "Nas décadas de 80 e 90, quando quase não havia assentamentos, a luta era pela obtenção de fazendas. Mas, agora, cerca de 70% da pauta de reivindicações dos movimentos sociais é voltado para o desenvolvimento nos assentamentos", conta.
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