| Foto: Divulgação/BMW

Justiça

Processo exigia devolução de terras a catarinenses

O estado de Santa Catarina exigia, em 250 folhas (acompanhas por 48 documentos e 2 mapas), que o Paraná devolvesse as terras que, segundo eles, estavam ocupadas irregularmente. O Paraná, é claro, contestou o pedido e exigiu que os catarinenses exibissem os títulos de domínio, porque a posse do Paraná era bastante antiga. Os paranaenses também sugeriram que o "utis possidetis", aplicado na Questão das Missões (1895), também fosse usado para resolver a disputa. O STF, porém, não acatou os argumentos e mandou um juiz cumprir a delimitação territorial contestada por SC.

"O magistrado, contudo, que chegou a ser condenado por não cumprimento da decisão a nove meses de suspensão do trabalho e a multa de 300 mil réis, demonstrou que o próprio STF não sabia como garantir a execução da sentença, porque não existia lei que explicasse como resolver a questão de limites entre estados", explica o estudioso no assunto Paulo Roberto Hapner.

Enquanto se discutiam questões judiciais, a guerra começou. O impasse, então, foi resolvido apenas em abril de 1916, com a intervenção do então presidente da República, Venceslau Brás, que exigiu que os dois estados assinassem um acordo. (PM)

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Tragédia

Combate do Irani marcou o início do conflito

Um dos episódios mais marcantes do Contestado, considerado por muitos o início da guerra, foi o chamado Combate do Irani, que ocorreu em 22 de outubro de 1912 e resultou em catástrofe tanto para o lado dos caboclos catarinenses (que perderam o monge José Maria) como para os paranaenses (pois o coronel João Gualberto também foi morto).

A história começou numa fazenda em Taquaruçu, que pertencia a Henrique Almeida. Esse homem recebeu em suas terras José Maria (um desertor do exército), que começou a fazer rezas na região e a trabalhar como curandeiro. Caiu nas graças de Almeida quando a mulher do fazendeiro ficou doente e José Maria conseguiu curá-la.

O problema é que os caboclos acreditavam que haveria uma nova monarquia, regida por um rei que representaria Deus. Não tardou para que a ideologia caísse nos ouvidos do então presidente, Hermes da Fonseca, que, com medo da volta da monarquia, enviou um exército de Desterro (Florianópolis). Do Paraná também foram encaminhadas tropas, que estavam sob o comando de João Gualberto. Os paranaenses chegaram antes, até porque fizeram o percurso de trem de Curitiba a União da Vitória e depois foram a pé e com alguns cavalos até Palmas.

A ordem era que João Gualberto e sua tropa, de 400 homens, esperassem. O coronel, então, enviou um bilhete a José Maria para que ele comparecesse ao acampamento. José Maria pediu ajuda ao chefe de polícia catarinense, que lhe deu três dias para abandonar a fazenda.

João Gualberto tinha ordem de prisão contra José Maria (desertor do exército) e apareceu (com 64 homens contra 200 caboclos) antes do que o monge imaginava. O combate foi inevitável. Gualberto conseguiu desferir um ou dois tiros de metralhadora, mas acabou capturado. O coronel foi esquartejado e hoje é considerado um herói do Paraná. (PM)

Um processo judicial arquivado no Supremo Tribunal Federal (STF), datado de 1900, com 2 mil folhas, e guardado em quatro caixas, é um dos documentos históricos mais importantes sobre as disputas territoriais que envolveram Paraná e Santa Catarina e que culminaram com a Guerra do Contestado (1912-1916). Ele é a prova de que o Paraná, logo depois de sua emancipação (1853), já se preocupava com as delimitações territoriais e tentou, por diversas vezes, impedir que Santa Catarina ficasse com toda a Região Oeste (veja mapas). Esse capítulo da história – que precede o conflito conhecido como Guerra Santa – muitas vezes acaba esquecido. Mas é a partir dele que é possível entender a origem de grande parte dos conflitos territoriais entre os dois estados.

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Como bem explica um pesquisador do assunto, o desembargador Paulo Roberto Hapner, que leu diversas vezes as 2 mil páginas do processo hoje arquivado no STF, o Paraná fazia divisa com o Rio Grande do Sul, se estendendo por todo o território que hoje é o oeste de Santa Catarina. Mas, ainda em 1820, quando o estado era província de São Paulo, a Vila de Lages foi desmembrada de São Paulo e anexada a SC. Foi o primeiro sinal de "invasão" catarinense em solo que se tornaria paranaense. Com essa mudança, os catarinenses passaram a entender que todo o sertão de Lages seria deles. "Sobre isso, primeiro discordou São Paulo e depois o Paraná, em 1853, com sua emancipação", explica Hapner.

No meio do caminho, houve também uma decisão sobre a disputa internacional conhecida como a Questão das Missões, que começou no período colonial entre Brasil e Argentina e foi decidida em 1895. "Foi mediante arbitramento dos Estados Unidos que se consagrou a tese do Barão do Rio Branco, do "uti possidetis", definindo os limites com a Argentina", afirma Hapner. O país vizinho estava de olho em uma região de cerca de 48 mil quilômetros quadrados, nos Campos de Palmas, mas perdeu porque o entendido foi de que os paranaenses já estavam antes naquelas terras.

Novos municípios

Também causou descontentamento ao Paraná quando foram criados os municípios de Curitibanos, em 1864, e Campos Novos, em 1869 (como distrito e, depois, em 1881, como município). Os limites catarinenses se expandiam. "Note que os atritos aumentavam também por conta da exportação da erva-mate, que era transportada pelos rios e estradas em litígio", lembra Hapner.

Só com a Proclamação da República é que advogados de ambos os estados entenderam que a pendenga territorial seria resolvida apenas por um laudo arbitral e esse só teria legitimidade se fosse homologado no STF. A questão é que Paraná e Santa Catarina, chegando já em 1896, ainda não haviam conseguido uma solução amigável. Por isso, em 1900, Santa Catarina entrou com um processo contra o Paraná no Supremo e, dele, resultaram três decisões. Em todas elas, a corte foi favorável aos catarinenses.

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TERRA DEVASTADA

Confira como o Paraná foi perdendo território para Santa Catarina desde quando conseguiu se emancipar de São Paulo, em 1853.

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