Desamparo
Guaranis se queixam da falta de trabalho e de oportunidades
As famílias que vivem na região de Guaíra dizem se sentir desamparadas. Muitos não conseguem trabalho, passam fome e não têm documentação ou apoio para exercer uma atividade produtiva. Na Aldeia Tekoha Karumbey, que fica às margens do Córrego Carambeí, na zona urbana de Guaíra, vivem 21 famílias sob o comando do cacique Ismael Rodrigues, 53 anos.
De crianças a idosos, a maioria dos indígenas ganha a vida catando papelão e latinha, e vive em um ambiente de favela, morando em barracos. A área não está regularizada, mas para os índios, a terra pertence a eles. "Nós mesmos somos o documento da terra", diz o cacique.
Em outra aldeia urbana, a Tekoha Porã, vive Claúdio Barros, 95 anos, considerado um dos moradores mais antigos de Guaíra. Trabalhou na Colonizadora Mate Laranjeira e hoje reivindica melhores condições de vida para a família. A área, segundo a Funai, foi doada por um pioneiro da cidade. No entanto, os herdeiros venderam o terreno e hoje os novos proprietários reivindicam a posse na Justiça. "Queremos a demarcação da terra para criar a criançada. Antes o mato era nosso", afirma a indígena Vitória Nunes, 73 anos.
Na zona rural de Guaíra, os índios estão sem atendimento à saúde e tem uma escola improvisada para ensinar às crianças a língua materna. "Estamos aguardando a demarcação de terras", diz o professor Rubin Waldow, que dá aulas em uma sala cujo chão é de terra batida.
Clima
Decisão do governo também aumenta tensão no Mato Grosso do Sul
Folhapress
A polêmica envolvendo a demarcação de terras indígenas trouxe de volta o clima de tensão também a Mato Grosso do Sul. Ao menos 56 propriedades estão invadidas por índios em todo o estado, segundo a Famasul, federação que representa os ruralistas. Três fazendas foram ocupadas nos últimos dias, segundo os ruralistas.
Jussimara Bacha, 59 anos, dona da fazenda Buriti, em Sidrolândia (a 73,3 quilômetros de Campo Grande), diz que é refém dos índios Terena desde a manhã de quarta-feira. "Não nos deixam sair e não deixam ninguém entrar", disse a fazendeira, por telefone. Ela afirma que também estão na fazenda o filho dela, dois funcionários e três crianças, filhas deles. Jussimara disse que há entre 80 e cem índios e que, até quarta-feira, eles estavam armados.
Em nota, a Funai negou que haja reféns. "Na Buriti, os indígenas estão do lado de fora da porteira, não entraram na sede e as pessoas não estão sendo feitas reféns. As informações são de que os indígenas não estão armados e não dispararam tiros, mas fogos de artifício."
Demarcação
Na semana passada, ao anunciar a paralisação das demarcações, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, criticou a Funai por supostas falhas no processo de definição de terras indígenas e disse que o governo prepara um novo modelo, em que outros órgãos serão consultados sobre as demarcações.
Brasília
Deputados federais pedem criação de CPI da Funai e do Incra
Um requerimento com 200 assinaturas para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foi protocolado na última quarta-feira, na Câmara dos Deputados. O objetivo é investigar a atuação da Funai e do Incra na demarcação de terras indígenas e de remanescentes de quilombos.
O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), disse ontem, à Agência Brasil, que a criação da CPI não é, neste momento, a melhor forma de buscar uma solução para a disputa por terras travada entre índios e produtores rurais. "A CPI é um último caso. Tem outros caminhos mais moderados para chegarmos a um entendimento", disse.
A decisão do governo federal de suspender a demarcação de terras indígenas no Paraná acirrou o conflito agrário nas cidades de Guaíra e Terra Roxa, no Oeste do estado. A região vive um clima de hostilidade entre produtores rurais e índios Guaranis, que reivindicam terras que consideram ser de seus ancestrais. Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), existem hoje oito áreas ocupadas em Guaíra e outras cinco em Terra Roxa. Duas áreas na primeira cidade já estavam sendo demarcadas, mas tiveram os processos paralisados por ordem da ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, até que outros órgãos federais, como a Embrapa, se manifestem sobre as demarcações.
INFOGRÁFICO: Nos últimos quatro anos, índios Guarani voltaram para o Paraná
A população indígena na região aumentou quase dez vezes nos últimos quatro anos, passando de 140 indivíduos em 2008 para 1.342 atualmente, agrupados em 461 famílias. Muitos deles vieram do Mato Grosso do Sul, principalmente da cidade de Japorã. Os índios vivem em situação precária e sofrem discriminação da população local (leia mais nesta página).
Os produtores rurais contestam os números da Funai e dizem que há mais três áreas invadidas, de acordo com o Sindicato Rural e a Organização Nacional de Garantia ao Direito de Propriedade (ONG DIP), criada recentemente para defender os agricultores. Algumas pertencem a pequenos produtores, têm de um a três alqueires, e passam longe de ser latifúndios, como alega o grupo que defende os indígenas. Para os ruralistas, nem todos que estão nas aldeias são indígenas. "Alguns são índios, outros são paraguaios", diz a representante do Conselho Consultivo da ONG DIP, Luciane Possan Weber.
Eles alegam que há grupos comandando os indígenas, que não têm condições de se mobilizar e estariam chegando às cidades de ônibus e caminhões. Outra acusação é que o crescimento vertiginoso da população indígena na região nos últimos anos atende a interesses do que eles chamam de "ONGs do Mal". "Nós não temos nada contra os índios. Mas quanto mais miseráveis, mais eles são manipulados", diz Luciana.
Coordenador técnico da Funai em Guaíra, o indigenista Diogo de Oliveira afirma que os índios não ocupam áreas produtivas. "Os índios estão em áreas insignificantes da propriedade e não atrapalham a produção." Ele também nega que haja índios paraguaios na região. "Tem um fluxo grande de paraguaios, mas não dentro das aldeias. Nas aldeias há índios que nasceram aqui. Alguns deles têm parentes no Paraguai, mas não existe um fluxo de índios paraguaios direcionados a Guaíra", argumenta.
Indígenas são discriminados e intimidados, acusa Funai
O clima de tensão entre o setor ruralista e a comunidade indígena repercute em Guaíra. Boa parte da população se posiciona contra os funcionários da Funai, condição que prejudica os guaranis. Jovens indígenas que frequentam a escola são marginalizados e sofrem preconceito, segundo o indigenista Diogo de Oliveira, do escritório local da Funai. "Eles são taxados como invasores e bugrinhos", diz.
Outra preocupação é o crescente número de suicídios entre os jovens guaranis. Somente no ano passado foram seis casos. Na cidade, carros circulam com adesivos cuja frase expressa o rechaço à Funai: "Verdade, alimento e união, base de uma nação. Confisco não". O nome da Funai aparece com um grifo de exclusão.
Os funcionários da Funai dizem que uma série de inverdades foram criadas para colocar a população de Guaíra contra o órgão e tomar partido contra os índios. Entre as informações, infundadas segundo Oliveira, estão a desapropriação de áreas urbanas e propriedades rurais de toda Costa Oeste do Paraná, de Guaíra a Foz do Iguaçu. "Atacar os índios tornou-se um palanque político", diz.
Gestão de crise
A prefeitura de Guaíra criou, em janeiro deste ano, via decreto, um Gabinete de Gestão de Crise para tratar do problema. À frente do trabalho, o secretário de Planejamento, Josemar Ganho, afirma que o município já conversou com a comunidade indígena e representantes do setor rural. Segundo ele, a melhor solução para o problema é os governo federal, estadual e municipal adquirirem uma área no entorno de Guaíra e dar condições de moradia aos indígenas. "A expectativa dos índios é ter qualidade de vida e uma casa para morar. O sonho é igual ao nosso, a diferença é que eles preservam a cultura e a identidade deles." A área seria destinada apenas aos índios de Guaíra, ou seja, cerca de 960, já cadastrados pela prefeitura.
Manifestação de apoio
A Regional do Sul do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, divulgou nota em seu site para manifestar apoio aos povos Guarani e Caingangue do Paraná e denunciar o que chama de "intensa campanha contra os direitos territoriais dos índios promovida por políticos, produtores rurais e o governo do Paraná". Segundo a nota, alguns acampamentos surgiram na década de 1980, quando os índios foram expulsos de suas terras em razão da formação do lago da usina de Itaipu. O Cimi diz que o maior culpado pela tensão na região é o governo federal.
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