Um punhado de conchas em troca de um escravo africano. Um peixe por uma espiga de milho. Um pedaço de pano por um naco de tabaco. O escambo, prática em que mercadorias, animais e especiarias possuem valor de moeda, foi implantado pelos portugueses assim que chegaram ao Brasil, em 1500. Era o início da história do dinheiro no país.
A carta de Pero Vaz de Caminha, primeiro registro sobre a chegada da frota de Pedro Álvares Cabral em terras tupiniquins, chega a descrever a troca inaugural no Brasil: equipamentos do navegante por colar e cocar de indígenas. Os 3 milhões de índios que viviam no país, acostumados com a economia de subsistência, estranharam os costumes estrangeiros. Mas foram eles, explorados pelos colonizadores, que fizeram do pau-brasil a primeira moeda de troca oficial em nossa terra. Os indígenas retiravam e entregavam a madeira aos colonizadores em troca de miçangas, tecidos, facas e outros objetos.
Panos de algodão, açúcar e tabaco eram outras moedas comuns na nova colônia portuguesa. O gado bovino foi um dos mais utilizados no escambo. Pequenas conchas do mar, que funcionavam como moeda no Congo e Angola, foram usadas na compra de escravos, como visto no início da reportagem.
Metal
Paralelo às mercadorias, as moedas de metal circulavam no Brasil colonial. A primeira foi os réis, unidade monetária de Portugal nos séculos 15 e 16. Com a formação da União Ibérica (1580-1640), verificou-se um fluxo grande de moedas de prata espanholas (reales). As moedas de réis portugueses eram as mesmas usadas na metrópole, oriundas de diversos reinados e possuíam, às vezes, denominações próprias, como português, tostão e vintém.
Nesse período, a moeda brasileira se formava de modo aleatório, com outras espécies trazidas por colonizadores, invasores e piratas que comercializavam na costa brasileira. Um exemplo são as moedas holandesas. Cercados pelos portugueses no litoral de Pernambuco e não dispondo de dinheiro para pagar seus soldados, os holandeses realizaram entre 1645 e 1646 a primeira cunhagem de moedas em território nacional. Foram também as primeiras moedas a estamparem o nome do Brasil.
Devido à inexistência de uma política monetária específica na colônia, a quantidade de moedas em circulação era insuficiente. Por esse motivo, as mercadorias permaneciam tendo valor de dinheiro. Em 1614, por exemplo, o governador do Rio de Janeiro estabeleceu que o açúcar corresse como moeda legal, ordenando que os comerciantes o aceitassem obrigatoriamente como pagamento. "Os réis e o escambo funcionaram como moeda durante a colônia. Após a independência, em 1822, e da Proclamação da República, em 1889, os réis seguiram como moeda oficial até 1942. Ou seja, da chegada dos portugueses ao governo de Getúlio Vargas", explica o professor de economia da PUC-PR Másimo Della Justina.
Cruzeiro foi "marketing" de Vargas
O Brasil começava a sofrer os efeitos da Revolução Industrial de 1930 quando, em 1942, o presidente Getúlio Vargas determinou a primeira mudança do nome da moeda brasileira. O real, em vigor desde o período colonial, seria aposentado. Em seu lugar entrou o cruzeiro. Mil réis passaram a valer 1 cruzeiro, sendo o primeiro corte de três zeros na história monetária do país. É aí que surge também o centavo.
Segundo o professor e pesquisador Másimo Della Justina, a mudança da nomenclatura foi uma estratégia de marketing do Estado Novo. "Era para mostrar que o Brasil vivia uma nova era, com a industrialização de São Paulo e Minas Gerais, por exemplo", explica.
O cruzeiro vingou até 1967, quando o governo militar realizou um novo corte de três zeros na moeda para tentar evitar sua desvalorização.
Dessa forma, o cruzeiro novo substituiu o cruzeiro "antigo". Para adaptar as antigas cédulas que estavam em circulação, o governo mandou carimbá-las. Três anos depois, em 1970, os militares voltaram a alterar a nomenclatura da moeda brasileira, chamada novamente de "cruzeiro". "Nesse período, o Brasil enfrentou o chamado milagre econômico (1968-1973), com crescimento de 9% ao ano, mas também crises financeiras, como a volta da inflação", afirma o pesquisador.