A história do catarinense Lincoln Gonçalves Santos, 32 anos, é daquelas restauradoras da crença de que o mundo e as pessoas – principalmente elas – podem ser melhores. Condenado por latrocínio (roubo seguido de morte) em 2005 e confrontado com a realidade do sistema prisional brasileiro, ele decidiu mudar. Pediu uma chance para estudar e, dias atrás, não apenas concluiu o curso de Direito como apresentou seu TCC para a pessoa que tornou essa trajetória possível: a juíza que lhe concedeu liberdade condicional para ir às aulas.
O contato com o Direito foi transformador não apenas porque Lincoln agora possui um diploma de ensino superior, mas porque ajudou o rapaz a descobrir qual é o papel que ele deseja desempenhar na sociedade a partir de agora.
“Quero voltar para a faculdade como professor e desenvolver um projeto para tirar mais pessoas do sistema prisional e trazê-las para o ambiente onde eu também ganhei uma chance. Porque, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, o maior benefício não é para o detento, e sim para a sociedade. Cada pessoa que conseguir sair da prisão para estudar, torna o mundo um pouco melhor.”
Experiência pessoal inspirou TCC
Em seu trabalho de conclusão de curso, Lincoln abordou a realidade na qual esteve inserido durante tantos anos. Discutiu a precariedade do sistema prisional brasileiro e o descumprimento de documentos internacionais de proteção aos direitos humanos dos quais o Brasil é signatário.
“Quis mostrar os tratados internacionais que o Brasil assina em contraste com a situação real dos presídios. O sistema prisional é marcado pela violação de direitos humanos, por torturas, ofensas e superlotação, o que afeta a saúde física e mental do detento. É um sistema que muitas vezes trata o ser humano como bicho, e é como bicho que ele acaba saindo de lá.”
Direito a uma nova chance
Lincoln não tinha qualquer interesse particular pela advocacia até ser condenado. A rotina reclusa na Penitenciária Agrícola de Palhoça, na Grande Florianópolis, no entanto, mudou tudo. Ele passou a ler os livros disponíveis na biblioteca do presídio e aprendeu que tinha direito a estudar conforme a progressão da pena.
“Eu não tinha noção de nada e tentei me informar sobre meus direitos. Antes de ser preso, já tinha feito matrícula no curso de Relações Internacionais. Quando soube que tinha direito a estudar, esperei a pena progredir para o semi-aberto e pedi para fazer uma faculdade. Foi um desvio para um caminho novo, com mais oportunidades”, conta.
Durante o primeiro ano de faculdade, a rotina de Lincoln começava às 6h, quando saía da Penitenciária Agrícola de Palhoça em direção ao campus da Universidade do Vale do Itajaí (Univali); às 13h, retornava à unidade prisional. Depois, ele progrediu para o regime aberto e deixou a penitenciária. Para se manter durante a faculdade, trabalhou em um negócio da família e desde o 6.º período faz estágios na área jurídica. No momento, é estagiário em um escritório de advocacia.