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Maria Aparecida lutou pela vida do filho, mas a falta de um órgão deixou vazio o quarto de Paulo | Hedeson Alves/Gazeta do Povo
Maria Aparecida lutou pela vida do filho, mas a falta de um órgão deixou vazio o quarto de Paulo| Foto: Hedeson Alves/Gazeta do Povo

Fatalidade

Falta de rim levou Paulo a 42 operações, sem resultado

Se as Organizações de Procura de Órgãos (OPOs) já existissem, talvez a história de Paulo Correia Moreira tivesse sido diferente. Com um problema crônico em um dos rins, ele foi adotado com 1 ano de idade por Maria Aparecida Correia Moreira, 59 anos. "Já pequeno ele começou apresentar problemas. Os médicos demoraram a descobrir que era um dos rins", explica Maria. Aos 3 anos, depois de ter mudado de Campo Mourão para Maringá, Paulo chegou a Curitiba em busca de um tratamento melhor.

Viveu mais 20 anos em meio a idas e vindas ao Hospital Pequeno Príncipe até conseguir um rim para transplante. "Nós não éramos compatíveis, então ele ficou todo esse tempo na fila. Infelizmente, o transplante não deu certo, houve rejeição. Seis dias depois da operação tiveram de retirar o rim que ele tinha recebido e ele voltou a fazer hemodiálise". Pouco tempo depois o outro rim foi afetado por uma infecção.

"Ele comia e bebia pouco. O que a hemodiálise não filtrava ia para o pulmão, gerando mais cirurgias. Ao todo, ele passou por 42 operações". Após cinco anos do retorno de Paulo à lista de espera ele não resistiu. Morreu em março deste ano, aos 28 anos.

Pioneirismo

Hospital do Trabalhador terá primeira OPO

A instituição que mais recebe pacientes de trauma em Curitiba terá a primeira Organização de Procura de Órgãos e Tecidos do Paraná (OPO). A coordenadora de Captação de Órgãos do Hospital do Trabalhador, Márcia Luiza Krajden, diz que a identificação de doadores pela instituição está cada vez melhor. "Desde o ano passado melhoramos bastante o diagnóstico de morte encefálica e posso dizer que não perdemos mais pacientes por falhas no processo", diz.

Com a aquisição de um tomógrafo para o exame de vascularização cerebral e a ajuda da neurologista Nazah Youssef no mapeamento de todo o processo dentro do hospital, foram treinados 75 médicos, enfermeiros e outros profissionais da equipe sobre o procedimento a ser tomado para o diagnóstico e manutenção do doador com morte encefálica. No próximo mês, mais 200 profissionais, incluindo os da UTI Infantil do hospital, devem passar pelo mesmo treinamento.

"O que aprendemos também é que todo o processo tem de ser compartimentado, ou seja, o médico, o enfermeiro, a assistente social, cada um tem o seu papel. O do médico acaba no diagnóstico e o da assistente começa na abordagem da família. Aprendemos que a abordagem do médico, na maioria das vezes, não dá certo", conta Márcia. Os números de 2009 e 2010 mostram a melhora do processo.

No ano passado, dos 425 óbitos registrados no HT, 92 tiveram morte encefálica e foram identificados como possíveis doadores. Desses, 82 resultaram em um diagnóstico positivo e na abordagem da família, 52 tiveram a doação negada e 30 dos possíveis doadores tiveram os órgãos encaminhados para transplante. Em 2010 (até abril) foram 138 óbitos, 35 prováveis doadores com morte encefálica, 32 abordagens com 19 negativas, que resultaram em 13 doadores efetivos.

  • Confira o histórico de transplantes desde 1996 no Paraná

A Secretaria de Estado da Saúde criará seis Organizações de Procura de Órgãos e Tecidos (OPOs) no Paraná: uma em Curitiba, outra na região metropolitana e quatro no interior do estado. O objetivo das OPOs é servir de ponte entre as comissões internas dos hospitais e a Central de Transplantes, ajudando na identificação de possíveis doadores, na abordagem das famílias e na manutenção desses doadores até o transplante. Dispari­dades entre essas etapas seriam responsáveis pela demora. No Paraná, 3.852 pessoas estão na lista de espera por um órgão, das quais 2.956 ativas, ou seja, aptas para o transplante.

As OPOS devem ser instaladas em até três meses. "Estimo que os potenciais doadores sejam quase três vezes o que conseguimos captar hoje. E desses doadores captados, apenas metade se reverte em transplantes efetivos", exemplifica o se­­cre­­tário estadual de Saúde, Car­los Augusto Moreira Junior.

A distribuição das OPOs é baseada na proporção de uma unidade para cada 2 milhões de habitantes, estabelecida pelo Plano Nacional de Implantação de OPOs, lançado em outubro pelo Minis­tério da Saúde, por meio da Porta­ria 2.601. O plano tem base na experiência positiva do estado de São Paulo, onde hoje funcionam 10 organizações. "O Paraná, com uma população de mais 10 mi­­lhões, teria direito a cinco OPOs, mas nossos técnicos conseguiram negociar uma sexta unidade na região metropolitana de Curitiba", diz Moreira Junior.

Enquanto em Curitiba o escolhido é o Hospital do Trabalhador, por receber muitos pacientes de trauma e possíveis doadores, na região metropolitana o principal candidato é o Angelina Caron, pelo atendimento emergencial prestado e também pela excelência na área de transplantes. Nas cidades de Londrina, Cascavel, Maringá e Ponta Grossa foram definidos os hospitais universitários.

Como funciona

Cada OPO receberá R$ 20 mil para a implantação e, mais tarde, um custeio mensal de R$ 20 mil, oriundos do Fundo Nacional de Saúde. O dinheiro seria suficiente para bancar uma estrutura de uma sala e computadores para uma pequena equipe, formada no Paraná por dois administradores, três enfermeiras, um coordenador médico e, talvez, um psicólogo. "O interessante é que, ao menos, uma das enfermeiras seja intensivista para que possa auxiliar na manutenção dos doadores identificados nos hospitais, uma das nossas grandes dificuldades", ressalta o secretário.

A partir do segundo ano de funcionamento, as OPOs só receberão os recursos mediante o cumprimento de metas. "A equipe fará uma busca ativa nos hospitais, com pelo menos dois contatos por dia, para identificar os possíveis doadores, ajudando também no que for preciso para a confirmação do diagnóstico."

Na semana que vem, duas pessoas da Central de Transplantes do Paraná irão a São Paulo para saber como funciona a coordenação das OPOs. Só então o Paraná deve fechar sua proposta, com a definição de metas quantitativas e qualitativas para as organizações, e enviá-la ao Ministério da Saúde. Até agora apenas os estados do Rio Grande do Norte, Pernambuco e Acre mandaram proposta.

Desde maio de 2009, além das OPOs, o estado de São Paulo está investindo em coordenadores intra-hospitalares ligados a essas unidades nas principais instituições do estado. "Com isso triplicamos o número de doadores em três meses. São Paulo tem o hoje o maior número de doadores do Brasil: 700", diz o diretor técnico de Divisão de Saúde e coordenador da OPO da Santa Casa da capital paulista, Reginaldo Carlos Boni. Ele explica que a presença desses coordenadores nos principais hospitais estaduais ajuda a descentralizar mais ainda o trabalho de procura de órgãos, o que dinamiza todo o processo.

Não a particulares

Recentemente, junto com o início do Serviço de Transplante de Fígado, o Hospital São Vicente, administrado pela Fundação de Estudos das Doenças do Fígado (Funef), enviou um pedido à Secretaria de Estado da Saúde para ser a primeira OPO do Paraná. Embora pela Portaria do Ministério da Saúde não haja qualquer impedimento para a instalação de uma unidade em um hospital particular, a Sesa refuta a ideia e adianta que o pedido será negado. "Preferimos instalar (as OPOs) em hospitais públicos ou, ao menos, que possuam um relevante atendimento emergencial de pacientes de trauma e possíveis doadores, como o Angelina Caron", afirma Moreira Junior.

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