Uma criança ou adolescente foi estuprada a cada três dias no Paraná em 2013. Foram 125 casos. O dado faz parte de um levantamento feito pela Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) a pedido da reportagem da Gazeta do Povo. O total de vítimas no ano passado é mais que o dobro do registrado em 2010. Nos dois primeiros meses deste ano, 20 crianças e adolescentes foram estupradas no estado. Hoje, 18 de maio, é o Dia Nacional de Luta contra o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.
O avanço desses crimes aponta para incapacidade da sociedade, de uma forma geral, em colocar a infância como prioridade e garantir que seus direitos não sejam violados, como determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) há quase 24 anos. "Está havendo uma falha no sistema de garantia de direitos, na rede de proteção, que engloba escola, famílias, estado, município", alerta a presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da seção paranaense da OAB, Maria Christina dos Santos.
Essas falhas citadas pela advogada alcançam, principalmente, a articulação do poder público em capacitar a rede de proteção e mobilizar a sociedade civil para que seja parte cada vez mais ativa dela. "Tem de haver mais comunicação entre órgãos que implementam políticas públicas", comenta Maria Christina, que aposta no fortalecimento da rede como solução.
Para a advogada, uma cidade do porte de Curitiba tem um número insuficiente de conselhos tutelares. "Hoje temos nove conselhos na capital, quando o Conanda Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente estabelece que preferencialmente haja um para cada 100 mil habitantes. Como pode aumentar tanto o porcentual de estupro? É ausência do Estado", critica. Os conselhos têm a responsabilidade de indicar ao município quais são as demandas para criação de política pública. Atualmente, crianças e adolescentes vítimas são atendidas nos nove Centro de Referências Especializados de Assistência Social (Creas).
Para uma conselheira tutelar de Curitiba, que preferiu não se identificar, não há política pública suficiente nos municípios que atendam crianças e adolescentes carentes que necessitam de atividades do contraturno escolar, como o antigo Criança Quer Futuro.
Ao Deus dará
"Falta atendimento e os adolescentes acabam ficando ao Deus dará", afirma. Por isso, segundo ela, há casos em que são aliciados por traficantes e acabam alvos fáceis, com familiares ausentes. "Mas nos casos de agressão e estupro, a maior parte desses crimes é cometido por familiares. É preciso um trabalho de conscientização muito forte com famílias", explica, ressaltando que há crianças vítimas em todas as classes sociais.
Estado destinou R$ 14 milhões a conselhos tutelares
A Secretaria da Família e Desenvolvimento Social do Paraná (Seds) destinou, desde 2011, R$ 14 milhões para melhoria de estrutura, atendimento e capacitação dos conselheiros tutelares no estado. Hoje há cerca de 2 mil conselheiros tutelares no estado e pelo menos 10 mil profissionais que trabalham com garantias de direitos.
Em nota, a Pasta afirma que já foram investidos mais de R$ 105 milhões em três anos para ações dirigidas ao fortalecimento da rede de proteção à criança e ao adolescente. O estado conta com 696 unidades, entre Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e Centros de Referência Especializada de Assistência Social (Creas), para atender esse público. Além disso, há 23 Centros da Juventude, espaços destinados à convivência comunitária, que oferecem, em tempo integral, atividades de lazer, esportivas, culturais e qualificação profissional para adolescentes maiores de 14 anos.
Na capital, a Fundação de Ação Social (FAS) tem descentralizado o atendimento especializado às vítimas pelos Creas. De acordo com a FAS, em 2013, os Creas realizaram 291 atendimentos de casos de abuso sexual e 30 de exploração sexual. Neste ano, até março, já foram atendidos 30 casos de abuso e seis de exploração.