Há um ano e meio uma ONG brasileira e uma organização evangélica norte-americana causaram uma discussão internacional ao produzir um misto de documentário e drama para uma campanha contra o infanticídio nas tribos da Amazônia. O vídeo enfureceu a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) ao retratar a história de Hakani, menina da etnia Suruwaha, uma das tribos às margens do Rio Purus que ainda praticam o ritual. Hakani foi enterrada viva por não andar, devido ao hipertiroidismo. Salva pelo irmão, que, sozinho, cuidou dela por três anos na mata, ela acabou adotada por um casal de linguistas.
A Funai e a ABA ficaram incomodadas com a dramatização do documentário anunciado como "história verídica". Dirigido pelo cineasta americano David Cunningham, o filme foi rodado nos arredores de Porto Velho (RO), numa fazenda da instituição Jovens com um ideal (Jocum), que atua na evangelização dos índios. A organização religiosa também financiou o projeto. Participaram índios de várias etnias, que trabalharam como atores, mediante pagamento de cachê. Os produtores usaram um enorme bolo de chocolate para simular a cova onde a menina seria enterrada. Com versões em português e inglês, o filme pode ser assistido no site www.hakani.org.
A Funai foi à Justiça, sem sucesso, para retirar o vídeo do site YouTube por entender que o conteúdo denigre a imagem das mais de 220 etnias brasileiras, e por temer a generalização equivocada de uma tradição indígena. Responsável pela tutela dos índios, a entidade reconhece a prática do infanticídio, mas assegura que ela não acontece em todas as etnias. Segundo a Funai, a adoção de crianças doentes por outras famílias é uma das alternativas já em uso nas tribos que ainda adotam o infanticídio. (MK)