Enquanto em Curitiba a crise no fornecimento de remédios de alto custo dá os primeiros sinais de que está próxima de ser superada, no interior a situação ainda preocupa. Levantamento feito ontem pela reportagem da Gazeta do Povo constatou, na capital, a falta de apenas um medicamento destinado a doentes com esclerose múltipla, o Copaxone. Já nas farmácias especiais do interior (que são responsáveis pela distribuição dos remédios), a informação era de que o quadro melhorou, mas em pelo menos cinco faltavam medicamentos.
Em Irati, uma funcionária informou que cinco medicamentos para artrite reumatóide, incluídos na lista de excepcionais pelo Ministério da Saúde em dezembro, não estão disponíveis. Como são importados, o processo de licitação é mais complicado. Ontem chegou o carregamento de remédios para os cerca de 700 pacientes do programa de atenção excepcional.
Na regional de Telêmaco Borba, ainda faltam pelo menos seis remédios da lista de excepcionais. Estão na expectativa pacientes com a doença de Crohn, esquizofrenia, artrite, asma, fibrose cística e mal de Alzheimer. Em União da Vitória, a informação é de que faltam dez remédios, mas ontem só um paciente que foi à regional voltou para casa sem medicamento.
O artesão Arnoldo Victor conseguiu ontem insulina na farmácia especial da regional de Paranavaí. O medicamento é para a mãe do artesão, Maria do Carmo Victor, 74 anos. Ela é diabética, tem problemas cardíacos e sofre com a osteoporose. No dia 4 de julho, Victor foi à farmácia pública e trouxe para casa apenas cinco dos doze remédios que a mãe precisa. "Para os outros (remédios), me disseram que não tem data prevista", conta. A insulina que ela injeta diariamente, para controlar a diabete, foi comprada numa farmácia particular, por R$ 32 (quantidade suficiente para um mês).
Por lei, os governos estaduais são obrigados a fornecer uma série de remédios de alto custo para pacientes que precisem de tratamento contínuo. O fornecimento não depende de qualquer critério de renda se ficar comprovada a doença, a pessoa tem direito. Hoje, são 105 os medicamentos de cessão obrigatória. As doenças atendidas incluem esclerose, câncer, Parkinson, mucoviscidose e problemas respiratórios, entre outras.
Temor
Apesar da melhora no quadro, as associações que representam os doentes ainda se mostram preocupadas. Em Curitiba, além do problema com o Copaxone, cujo estoque acabou na semana passada, a Associação Paranaense de Esclerose Múltipla já está monitorando os estoques de outros três medicamentos. Um deles é o Avonex, que faltou durante boa parte da crise. "Hoje, temos o Avonex. Mas ainda há dias em que não há estoque e os pacientes ficam sem", afirma Olga Neves, presidente da associação. Olga conta que o fornecedor de dois outros remédios já informou a associação de que está tendo dificuldades em conseguir empenhos do governo. "Ficamos preocupados porque sem o medicamento os pacientes ficam vulneráveis", afirma. A própria Olga, que também é portadora de esclerose, diz que sente na pele quando o remédio não está disponível.
Na Associação Paranaense de Assistência à Mucoviscidose, o estoque foi renovado nesta semana. Os medicamentos durariam até ontem, mas, um dia antes, o novo fornecimento foi entregue. Em outras associações, a preocupação ainda é com a quantidade de medicamentos entregue. É o caso da Associação Paranaense de Portadores de Parkinsonismo. Lá, todos os remédios estão disponíveis. Porém, como a quantidade de cada um ainda é pequena, a associação está se vendo obrigada a dar o medicamento de forma fracionada aos pacientes, que precisam voltar mais vezes para buscar o que precisam.
A Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) informou ontem, por meio de sua assessoria de imprensa, que o Copaxone já foi comprado e que a verba já foi empenhada pelo governo. Agora, só seria necessário esperar pela entrega do produto, nos próximos dias. Quanto ao Avonex, a secretaria afirma que a falta do produto se restringiu à regional de Curitiba, na semana passada, e que o problema já foi resolvido. Sobre os medicamentos que estariam em falta nas demais regionais, no horário em que foi tentado o contato, não havia mais ninguém para comentar o assunto.
Crise
A crise da falta de remédios no Paraná começou há cerca de quatro meses. O governo do estado já ofereceu algumas versões para os motivos do problema. Uma delas seria a necessidade de livrar o estado da chamada "indústria de liminares" montada por laboratórios e advogados para conseguir impor o uso de remédios que nem sempre seriam necessários. Para os remédios que são fornecidos sem a necessidade de decisão judicial, a explicação passaria por uma mudança no sistema de compras do governo, destinada a melhorar o fornecimento. No entanto, a Sesa ainda não informou em detalhes quais foram as mudanças realizadas e quais foram as razões que forçaram a essa decisão.
Na semana passada, uma ação judicial pediu a intervenção federal no governo estadual em razão da falta de investimentos em remédios. O processo foi protocolado na quinta-feira pela Associação Brasileira de Apoio e Defesa da Cidadania, do Contribuinte e do Consumidor (Abraccce), mas a Procuradoria-Geral do estado ainda não foi notificada para se defender.
O presidente da Abraccce, Waldur Trentini, afirma que vários pacientes que estavam esperando medicamentos foram atendidos nos últimos dias. Mas ele ainda disse que há uma falta considerável, principalmente dos remédios que foram assegurados por determinação judicial. "Sentimos uma movimentação do estado para minimizar o problema, que está caminhando para a normalidade", diz.